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Por Rodrigo Vianna, no blog Escrevinhador:Poucos carros, ruas vazias. Um cenário estranho em uma Caracas sempre tomada por gigantescos congestionamentos. No dia seguinte à morte de Hugo Chávez, escolas não funcionaram. Repartições públicas e lojas também fecharam as portas. Era quase possível escutar o silêncio nas ruas centrais.
Movimento havia na região do Forte Tiúna - onde fica o comando das Forças Armadas da Venezuela. O corpo de Chávez foi levado até ali por uma multidão entristecida. Mas não desesperada. Os chavistas pareciam preparados para a partida do líder. Um mar de camisas vermelhas cercava o carro fúnebre. A pé, seguia o herdeiro político de Chávez, Nicolás Maduro – ex-sindicalista, foi motorista de ônibus em Caracas antes de se transformar num dos mais habilidosos assessores de Chávez. Chanceler da Venezuela, rodou o mundo, e parece ter aprendido muito. Virou vice e sucessor do líder bolivariano.
A oposição, claro, mantem certa moderação nesse momento difícil. Houve alguns rojões, comemorações discretas nos bairros mais ricos – antichavistas. O mesmo ocorreu em Miami (Brizola dizia que no Brasil a esquerda não faria expurgos se chegasse ao poder porque “a burguesia brasileira não caberia em Miami”; a burguesia da Venezuela, pelo visto, é bem menor, e ocupou muitos espaços por lá…).
Capriles, líder da oposição, deve concorrer com Maduro na eleição que ocorre em menos de um mês. Maduro (chavista) é favorito. Capriles vai jogar para o futuro. Ele é novo, aposta que Maduro não conseguirá resolver problemas como a falta de (alguns) produtos nos supermercados e a violência urbana crescente. São problemas concretos, inegáveis. Não se trata de “propaganda” imperialista. Mas, claro, a imprensa conservadora exagera nas tintas.
Detalhe: a violência urbana cresce, também, no Estado de Miranda – administrado por Capriles (o que retira parte dos argumentos que ele poderia usar na campanha). Outro detalhe: faltam produtos nos mercados da classe média, isso é fato, mas o governo mantém uma impressionante rede de abastecimento estatal – a rede Mercal – que permite ao povão comprar comida a preços baratos, sem depender de atravessadores e especuladores.
No Chile, em 73, Allende caiu quando a direita parou caminhões e provocou desabastecimento. A Venezuela chavista conhece essa história. Allende caiu, também, porque as Forças Armadas chilenas eram dominadas por uma oficialidade de extrema-direita. Chávez fez diferente: cultivou e purgou o Exercito!
Na Venezuela, o ministro da Defesa foi pra TV ontem e disse: “vamos enfrentar os fascistas, nas urnas”. A expressão, em espanhol, foi um pouco mais dura e direta: ”darle en la madre a los fascistas”. Um recado de que os militares estão com Maduro. Estão com o chavismo.
No Brasil, muita gente tem dificuldade para entender isso: aqui na Venezuela, o chavismo tem um braço armado e outro civil. Os dois andam juntos. Soldados vão pras manifestações, fardados mas sem armas na mão, como qualquer cidadão. Esse binômio Forças Armadas + povo organizado é que permitiu a Chávez debelar o golpe de 2002 – quando Estados Unidos insuflaram a elite “miameira” a derrubar o presidente. O povo foi pras ruas e, com apoio das Forças Armadas, debelou o golpe.
Esse mesmo binômio se mostrou ontem nas ruas de Caracas. É a quarta vez que venho a Caracas, sempre na função de repórter. E a capacidade de mobilização do chavismo sempre me impressiona. O povão agora forma uma fila imensa, em frente ao Forte Tiúna, pra ver o corpo de Chávez. Evo Morales, Cristina Kirchner, Pepe Mujica passaram por lá. Lula e Dilma devem chegar entre quinta e sexta-feira.
Chávez é um novo Bolívar, dizem alguns. Exagero? Não creio. E há uma diferença: Bolívar morreu sem ver consolidado o sonho de uma América ibérica unida contra o Império do Norte. Chávez conseguiu mais, ajudando a costurar essa unidade: UNASUL, CELAC e o enterro da ALCA devem-se, também, à coragem e à determinação de Hugo Chávez. Trata-se de uma mudança impressionante, num subcontinente que, 15 anos trás, tirava os sapatos para os EUA.
Essa é também obra de Hugo Chávez. Por isso ele é detestado pelos norte-americanos. E respeitado por líderes como Correa, Lula, Mujica, Kirchner. Aliás, vejam aqui o vídeo de Lula sobre Chávez.
A oposição venezuelana espera o corpo baixar à sepultura, para retomar as campanhas de desestabilização. A oposição acredita que a morte de Chávez levará ao enfraquecimento do chavismo. Pelo que vejo nas ruas, tenho dúvidas. Há dificuldades imensas – num país em que o petróleo é dádiva mas é também fraqueza, a impedir o florescimento de uma indústria forte. Isso Chávez não conseguiu reverter. A Venezuela importa quase tudo, com os dólares que obtém da venda do óleo.
A fragilidade econômica existe. Mas o chavismo parece enraizado, de forma profunda. Há milhões de pessoas dispostas a defender esse modelo político em que, pela primeira vez, o dinheiro do Petróleo não ajudou só a bancar carros baratos e viagens da classe média para Miami. Não. A Venezuela de Chávez usou o dinheiro do Petróleo para reduzir a desigualdade e zerar o analfabetismo.
Essa é a força do chavismo. Concreta, palpável e imensa – como a multidão que segue a gritar em torno do Forte onde acontece o velório: “eu sou Chávez, todos somos Chávez”.
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