"Empurrando com a barriga" - SAMUEL PESSÔA
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"Empurrando com a barriga" - SAMUEL PESSÔA


FOLHA DE SP - 13/10

Decisão do BC dos EUA dá fôlego adicional para o governo brasileiro não arrumar a casa


Na quarta-feira da semana passada, o Federal Reserve (Fed, banco central americano) divulgou a ata da mais recente reunião de seu comitê de política monetária, chamado de Fomc, em que decidiu adiar o início da redução do programa de compras de títulos de longo prazo.

Esse processo de redução do programa de compras de ativos ficou conhecido entre os especialistas pela palavra inglesa "tapering". O Fed compra títulos para elevar o seu preço, o que faz com que a rentabilidade até o resgate caia, reduzindo os juros de longo prazo.

O processo de normalização dos juros na economia americana terá duas etapas. Na primeira, o "tapering", o Fed reduzirá o ritmo de compra mensal de ativos de longo prazo, que hoje é de US$ 85 bilhões, até chegar a zero. Na segunda etapa, elevará a taxa de juros de curto prazo controlada pelo Fed, os "fed funds", de zero até 4% ao ano.

Toda a movimentação que houve do Fed desde maio, no sentido de iniciar a discussão sobre o "tapering", já promoveu ajuste nos juros longos americanos: subiram de 1,65% ao ano, em maio, para 2,65% agora.

O fato de que, na decisão de setembro, o Fed tenha surpreendido o mercado e não tenha iniciado o "tapering" arrefeceu um pouco a alta da taxa longa de juros --caíram de 2,85% a 2,65%. Essa redução contribuiu para reverter o processo de desvalorização do câmbio no Brasil.

A importância de acompanhar a política monetária americana é que a taxa de câmbio é um dos mecanismos que pode impor limites aos desajustes da atual política econômica brasileira. Uma desvalorização forçada e abrupta obrigaria a equipe econômica a "arrumar a casa". A estratégia do governo, entretanto, é empurrar com a barriga a atual situação --crescimento na casa de 2% ao ano, com inflação em torno de 6%, mas com desemprego baixo e renda real crescendo (mesmo que pouco)-- e deixar para depois da eleição o ajuste macroeconômico.

O sucesso da estratégia de empurrar com a barriga depende de o mundo ajudar. A decisão do Fed de setembro dá um fôlego adicional a esse caminho.

A ata do Fomc expõe com clareza os dilemas que o comitê tem enfrentado. Em cada parágrafo que assinala a melhora em algum indicador da economia, há uma qualificação na direção contrária.

Fica claro que pesaram na decisão os problemas fiscais enfrentados pelo presidente Obama na negociação com a bancada republicana da Câmara da elevação do limite de dívida do setor público. Também tiveram influência o fato de a redução da taxa de desemprego em 2013 ter sido majoritariamente fruto da elevação do desalento (o desemprego cai tanto quando alguém desiste de trabalhar, e sai da força de trabalho, como quando consegue um emprego) e o impacto da elevação do juro longo desde maio sobre o mercado de hipotecas.

A grande dificuldade de entender o movimento do Fed desde maio é que boa parte dos fatos mencionados acima já era conhecida desde aquele momento. Sendo assim, por que o Fed iniciou um movimento para preparar o mercado para o início do "tapering" em setembro?

Parece que uma soma de pequenos fatores explica a decisão. Primeiro os três fatos citados acima: problemas fiscais, cenário pouco animador do emprego e efeito da alta dos juros longos nas hipotecas.

Em segundo lugar, pode ter havido uma percepção por parte do Fomc de que o início do "tapering" pressionaria ainda mais os juros longos. Como apontado pelos membros do comitê que desejavam iniciar o processo, essa hipótese provavelmente foi equivocada, já que o mercado havia antecipado que o movimento iria iniciar em setembro (e os juros subiram antecipadamente, de acordo com essa expectativa, recuando um pouco depois).

O terceiro fator é um possível processo de convencimento por parte de membros do Fomc de que a política monetária ideal, quando os juros atingem o piso de zero, requer frouxidão monetária por mais tempo.

A indicação por Obama, na última quarta-feira, da vice-presidente do Fed, Janet Yellen, como nova presidente do Fed a partir de 2014, se confirmada pelo Senado, aumenta o peso dos membros do comitê que estão dispostos a correr risco de alguma aceleração inflacionária para aumentar a chance de recuperação mais rápida do mercado de trabalho.

E isso significará ainda mais fôlego para a estratégia de empurrar com a barriga no Brasil.




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