A civilização Chachapoya e o culto aos mortos
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A civilização Chachapoya e o culto aos mortos


Nas férias a gente faz (graças a Deus) o que não consegue durante o ano. Ontem eu vi um programa da National Geographic que adorei. Foi a Série Enigmas da História, com duas partes. A segunda que me interessou mais. Falou (e mostrou) uma série de múmias, de mais de 600 anos, que foram encontradas nas remotas regiões montanhosas do Peru. 

Eles pertenciam a uma civilização chamada de Chachapoya, conhecida como povo do céu, que era desconhecida até a descoberta de uma antiga cidade no topo da montanha. As investigações arqueológicas poderiam revelar que este povo antigo acreditava que as múmias eram mortos-vivos. Os chachapoyas eram temidos pelos Incas e por outros povos e tratavam seus mortos de uma forma peculiar. Eu particularmente adoro história pré-colombiana. Não é uma área de pesquisa, está mais para um hobby, ler textos e assistir programas sobre o assunto.


História pré-colombiana é riquíssima, é a nossa história antiga. Temos pirâmides, múmias, cidades perdidas, lendas de tesouros maravilhosos. Se você para para pensar, é todo um mundo de mistérios que intriga pesquisadores e encanta as pessoas. Adoro!

Sempre rola um pouco de especulação, é claro, mas isso é mais do que natural, principalmente quando se estuda o passado. Muitas vezes é apenas especulações que temos para começar a pesquisar e montar hipóteses e teorias. Mas quanto mais misterioso, maior a curiosidade e mais desafiadora é a tarefa de tentar dar uma resposta a perguntas que estão aí nos desafiando há dezenas ou mesmo centenas de anos

Mas então, um conhecimento novo é um conhecimento que pode trazer novas experiências. Eu assisti ao programa e corri hoje para buscar informações sobre os chachapoya. Esse povo é, inclusive citado no primeiro filme de Indiana Jones, Caçadores da Arca Perdida. Lá no começo (lembra da cena da caverna) ele está atrás de uma relíquia Chachapoya.

Mapa usando por Indiana Jones no filme para encontra o templo chachapoya
Fonte: http://www.pinterest.com/pin/171840542005497626/


Lembram desta cena? 
Indiana Jones "roubando" um ídolo Chachapoya.
Fonte: http://www.indyintheclassroom.com/projects/archaeology/raiders.asp

Lógico, o que se fala desse povo no filme não pode ser levado muito a sério, assim como o mapa acima não representa exatamente a região habitada pelos Chachapoyas, também chamados de povo das nuvens e do céu, habitando, portanto, as regiões elevadas dos Andes. Vale lembrar, que em uma das cenas, o protagonista é perseguindo por remanescentes dos Chachapoyas, coisa meio difícil de acontecer, já que a civilização praticamente desapareceu.


Mapa mostra a região do nordeste andino peruano, habitada pelos chachapoyas.
Fonte: 
http://atwabrasil.com/wp-content/uploads/2010/12/1.jpg


Bom, o que eu aprendi sobre os Chachapoyas nessa manhã é que os Chachapoyas reinavam sobre grande parte da Amazônia Alta, na bacia do rio Marañon. Eles tinham uma cultura muito avançada, originada mais de 2.000 anos antes de serem derrotados pelos Incas.  Eram conhecidos como os ?guerreiros das nuvens?, pois, além de serem grandes combatentes viviam num ambiente onde as neblinas são frequentes, floresta da nevoas, como é característico da Amazônia Andina alta (1).

O nome Chachapoya foi dado pelos incas e até o momento é como a civilização é conhecida. A forma como eles se autodenominavam é desconhecida. Esse nome também batiza uma cidade uma cidade peruana (2).  Os Chachapoyas foram descritos pelo cronista espanhol Pedro Cieza de León:

Eles são os mais brancos e os mais lindos de todos os povos que eu já vi. Suas mulheres são tão bonitas que, por causa da sua beleza, tornam-se esposas dos incas e são levadas para o Templo do Sol. (3)


Já se encontraram muitos sítios arqueológicos Chachapoyas. Os mais conhecidos são a fortaleza (cidadela) de Kuélap, em Amazonas e a cidade do Gran Pajaten, dentro do Parque Nacional Abiseo, em San Martín. 

A cidade que mais visitada e de melhor acesso é Kuélap, situada sobre um morro isolado a 3.000 metros de altitude dominando o vale do rio Utcubamba. Kuélap foi construída provavelmente no século VIII para defender a região contra o império Wari, que se expandiu antes que o Inca. 

Assim como Macchu Picchu, a cidadela foi descoberta apenas recentemente, estando escondida em uma das áreas mais distantes da Amazônia. Ela se encontra na borda de um abismo que a tribo pode ter utilizado como um mirante para espionar inimigos


Vista panorâmica da cidade perdida de Kuélap
Fonte: http://atwabrasil.com/wp-content/uploads/2010/12/9.jpg

A cidade está bem conservada. Estende-se sobre cerca de 600 metros de comprimento e dispõe de três plataformas superpostas que suportam uns 400 recintos. Suas muralhas externas chegam a 20 m de altura e tem apenas três entradas muito estreitas para facilitar a defesa. Uma delas tem paredões que se elevam a 10 metros de cada lado (4). Uma verdadeira fortaleza.



Ruínas de Kuélap
Fonte: http://www.oeco.org.br/marc-dourojeanni/27071-chachapoyas-a-heranca-dos-guerreiros-das-nuvens

As casas são todas redondas, dotadas de silos, pedras para moenda de grãos e fogões. Muitas ostentam decorações feitas com o mesmo tipo de pedra com que foram construídas. Uma caraterística especial da cultura dos Chachapoyas são as máscaras funerárias e o costume de instalar os restos funerários em cavidades nas paredes quase verticais de montanhas.

Essas casinhas coloridas, construídas nas encostas das montanhas, eram mausoléus onde os mortos era sepultados.
Fonte: http://filosofiaimortal.blogspot.com.br/2012/02/os-chachapoyas-guerreiros-das-nuvens.html

Esse, justamente, foi o tema do documentário que eu assisti, um estudo sobre a morte e os rituais fúnebres dos Chachapoyas. Pelo que tudo indica  esse povo acreditava na imortalidade. Para eles se vivia na morte, por isso mantinham os corpos perto de si (muitos emparedados em casas), faziam sarcófagos requintados e mumificavam os corpos. 

Embora muitas culturas antigas tenham na morte um tabu, a forma como os mortos são tratados diz muito de como a sociedade se organiza e os valores que defende.

Um pressuposto teórico fundamental desse artigo assume que, para o ser humano, o ato de morrer, além de um fenômeno biológico natural, contém intrinsecamente uma dimensão simbólica, relacionada tanto à psicologia como às ciências sociais. Enquanto tal, a morte apresenta-se como um fenômeno impregnado de valores e significados dependentes do contexto sociocultural e histórico em que se manifesta (5 ).

Foram descobertos, até 2010, setenta e nove sepulturas humanas na fortaleza de Kuélap, entre 300 e 350 indivíduos enterrados, o que leva confirmar a importância da hierarquia religiosa de Chachapoyas antiga. Segundo o pesquisador Alfredo Narvaez, gerente de projeto restauração e conservação do local, a cidade era muito mais do que uma fortaleza, era um lugar sagrado, um centro religioso de grande importância (6).


Uma das coisas que eu achei mais interessante: essas estátuas são, na verdade, sarcófagos (tem um corpo aí dentro). Como se os mortos estivessem vigiando, protegendo os vivos.
Fonte: http://nadanoslibradeescorpio.blogspot.com.br/2012/10/cultura-chachapoyas-los-hombres-de-la.html

O escritor e arqueólogo Federico Kauffmann, em uma expedição realizada no ano de 1984, em uma gruta, sarcófagos verticais, construídos pelos Chachapoyas (7). Toda essa preocupação com os mortos, com a vida após a morte, fez com que eu me lembrasse dos antigos egípcios. Acho que não tem como não fazer uma comparação. Assim como o antigo povo africano, eles davam uma atenção especial aos mortos. 

Não que a representação da morte feira pelos Chachapoyas seja bonita (pelo menos para o olhar contemporâneo). Suas múmias são bem conservadas mas assustadoras. Eu acho múmias artefatos culturais bonitos, a seu modo. Elas, geralmente, têm uma expressão serena. Se esteticamente não são belas, passam uma ideia de eternidade que não é espiritual mas sim, material.

Mas as múmias Chachapoyas são bem bizarras, assustadoras até. No documentário foram mostradas dezenas delas, em posições estranhas, que sugerem sofrimento, em contraste com a ideia que prevalece em muitas religiões da morte como alívio para o sofrimento. Isso contrasta com a forma como a morte e o morto são significativos para essa sociedade.

Múmia Chachapoya: assustadora, não é? Parece que a morte veio em  agonia.
Fonte: http://claudiotatu.blogspot.com.br/2012/12/os-guerreiros-das-nuvens.html

Para os Chachapoyas, os mortos eram tratados com os mesmos privilégios que mereciam os vivos, às vezes, até mais, dizem os pesquisadores. Eram abrigados em casas de até dois andares. Tudo para proteger os corpos e as múmias da chuva e principalmente dos inimigos (8) . Nos muros de fortalezas e nas paredes das casas os pesquisadores encontraram ossos de pessoas. O mistério é justamente saber quem eram essas pessoas. Muitas perguntas e pouquíssimas respostas. Um desafio para gerações e mais gerações de pesquisadores. 

Os Incas foram um povo conquistador que em 100 anos dominou quase toda a região da cordilheira dos Andes. Os chachapoyas eram um povo antigo e muito temido e era esse medo que mantinha muitos dos seus inimigos afastados. Quando os Incas, em sua expansão, perderam o medo, os Chachapoyas foram massacrados e tiveram que servir ao Império Inca. No século XVI, os Chachapoyas uniram-se aos espanhóis para lutar contra a dominação Inca. No final, acabaram morrendo por conta das doenças trazidas pelos espanhóis (o que também, causou a morte de uma grande parcela do povo Inca).

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(1) DOUROJEANNI, Marci. Chachapoyas, a herança dos guerreiros das nuvens (2013). Disponível em, http://www.oeco.org.br/marc-dourojeanni/27071-chachapoyas-a-heranca-dos-guerreiros-das-nuvens, acesso em 23/12/2013. 

(2) Os Chachapoyas - Guerreiros das nuvens. Disponível em, http://forum.jogos.uol.com.br/_t_1983439, acesso em 23/12/2013.

(3) Os Guerreiros das Nuvens. Dispónível em: http://claudiotatu.blogspot.com.br/2012/12/os-guerreiros-das-nuvens.html,  acesso em 23/12/2013. 

(4) DOUROJEANNI, Marci. Chachapoyas, a herança dos guerreiros das nuvens (2013). Disponível em, http://www.oeco.org.br/marc-dourojeanni/27071-chachapoyas-a-heranca-dos-guerreiros-das-nuvens, acesso em 23/12/2013. 

(5) COMBINATO, Denise Stefanoni, QUEIROZ, Marcos de Souza. Morte: uma visão psicossocial. Estudos de Psicologia 2006. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/epsic/v11n2/a10v11n2.pdf, acesso em 23/12/2013.

(6) Especialistas trabajan en mantenimiento de fortaleza de Kuélap. Disponível em: http://arqueologiamericana.blogspot.com.br/2010/04/especialistas-trabajan-en-mantenimiento.html, acesso em em 23/12/2013.

 (7) Cultura Chachapoya: los hombres de la niela. Disponível em: http://nadanoslibradeescorpio.blogspot.com.br/2012/10/cultura-chachapoyas-los-hombres-de-la.html,  acesso em 23/12/2013. 

(8) Cidade dos mortos é herança do povo chachapoya. Disponível em: http://g1.globo.com/bomdiabrasil/0,,MUL1169076-16020,00-CIDADE+DOS+MORTOS+E+HERANCA+DO+POVO+CHACHAPOYA.html, acesso em 23/12/2013.









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