A credibilidade do governo americano está em xeque
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A credibilidade do governo americano está em xeque


Rodrigo Constantino, Valor Econômico (Palavra do Gestor)

O impasse político nos Estados Unidos tem dominado a agenda dos investidores. A crescente possibilidade de um calote temporário nos títulos do governo mais poderoso do mundo produz forte incerteza nos mercados. Qual seria seu efeito? Será que o sistema monetário travaria como ocorreu na crise do Lehman Brothers? Para onde correr?

A questão é complexa, e agravada pelo fato de haver eleição em 2012. Há um jogo político entre democratas e republicanos, o que aumenta o receio dos investidores. Apostas políticas arriscadas, dos dois lados, podem inviabilizar um acordo sensato.

O cenário base ainda é o de que haverá algum tipo de acordo aos 45 minutos do segundo tempo. Se, por um lado, o presidente Obama não quer ser lembrado como aquele que deu calote, a oposição teme ser responsabilizada pela postura de "quanto pior, melhor".

O foco do debate tem sido a possível perda do rating AAA. Ninguém sabe ao certo quais seriam os efeitos disso. Alguns acreditam que haveria pressão vendedora de instituições obrigadas a manter em carteira apenas títulos AAA, mas outros pensam que a aversão ao risco seria tão grande nos mercados que poderia ocorrer uma fuga para liquidez. E esta ainda se encontra nos EUA.

Paradoxalmente, o "downgrade" poderia fazer o "yield" cair. É difícil tomar partido aqui, pois estamos navegando em águas desconhecidas. O caso japonês aponta nessa direção, mas tudo pode acontecer. E uma eventual normalização das taxas de juros poderia representar um aumento dos gastos públicos de até US$ 500 bilhões com o serviço da dívida.

Apesar de muitos investidores falarem dos problemas que o rebaixamento pelas agências de risco pode acarretar, acredito que o maior problema ainda é estrutural. Os EUA podem ser rebaixados mesmo aprovando o aumento do "debt ceiling", uma vez que os fundamentos estão fragilizados. Aqui faço distinção entre duas abordagens totalmente diferentes: a de curto e a de longo prazo.

O mercado financeiro quase sempre adota a primeira delas. O "curto-prazismo" chega a ser uma doença. Como Santo Agostinho, o mercado quer austeridade, mas não agora. A impressão que fica é que todos torcem por qualquer acordo que empurre o problema para frente. Pode ser a proposta da "Gangue dos Seis" ou a do republicano Boehner: o relevante é evitar o calote no momento. Os ativos de risco sem dúvida iriam celebrar o evento com um interessante rali.

Mas nada estrutural teria mudado. Os debates giram em torno de cortes de gastos e aumento de impostos, mas os democratas se recusam a colocar na mesa as necessárias reformas dos "entitlements": Medicare, Medicaid e Social Security. Esses gastos saíram de 30% do total em 1970 para mais de 65% hoje, e nas próximas décadas a trajetória é explosiva, por conta da demografia.

O que está em jogo, portanto, é qual modelo de sociedade os americanos desejam. Há populistas na ala republicana do Tea Party, mas é inegável que o essencial de sua demanda faz sentido. Eles querem resgatar o modelo que transformou os Estados Unidos no colosso que é hoje. E esse modelo passa longe do idealizado pelos democratas, que se aproxima muito, por sua vez, do falido "welfare state" europeu.

O presidente Obama quer um cheque em branco. O Congresso passou a ter maioria republicana nas últimas eleições justamente para evitar isso. A meta daqueles eleitos com a ajuda do Tea Party é clara: impedir que os EUA se transformem num Portugal ou quiçá numa Grécia. Ajustar as contas públicas demandaria um sacrifício grande no primeiro momento, mas colocaria o país novamente no rumo do crescimento sustentável.

Obama tem pedido mais responsabilidade dos deputados, mas a maior irresponsabilidade é gastar trilhões a mais do que arrecada. E não há nada de responsável na solução "mágica" do presidente, que é aumentar os impostos e manter seus insustentáveis programas sociais. No longo prazo, esse modelo limitaria o dinamismo e o crescimento econômico.

Em 1980, a dívida pública estava perto de US$ 1 trilhão (30% do PIB), e o governo quer expandir uma dívida que já passa de US$ 14 trilhões (quase 100% do PIB). Qual o limite? O "sonho americano" não pode ser realizado por meio de mais dívida e inflação. Quanto antes o governo enfrentar essa dura realidade, melhor será para todos os credores de títulos americanos. Quem possui ativos em dólar deveria torcer por uma solução duradoura, não para simplesmente ganhar algum tempo extra. O mais importante para os investidores de longo prazo é a credibilidade do plano para resolver de vez a questão fiscal.

Rodrigo Constantino é sócio da Graphus Capital




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