A dúvida Levy - MÍRIAM LEITÃO
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A dúvida Levy - MÍRIAM LEITÃO


O GLOBO - 17/10

A grande dúvida em relação ao ministro Joaquim Levy é por que ele permanece no governo Dilma. A saída parece natural desde que ficaram mais fortes os ataques internos contra ele. Aos muitos interlocutores que perguntaram por que ele fica em uma equipe que nunca demonstrou valorizar seu trabalho, Levy responde que acha que ainda tem contribuições a dar.

Em um ambiente assim, em que o ministro da Fazenda vira alvo da própria base governista, e em uma crise desta dimensão, qualquer reunião como a de ontem à tarde pode dar origem a uma onda de especulações sobre a saída do ministro. Ainda mais quando há tanto fundamento, como foi o caso ontem. A grande dúvida, na verdade, não é se o ministro Joaquim Levy sai do governo, mas quando ele sai.

Houve vários momentos de estresse nesse período em que ele está no governo. Levy nunca se importou muito com os integrantes do PT, empresários ligados ao governo, ou líderes sindicais que o criticaram ou pediram sua cabeça. Mas na última semana houve demonstrações públicas de hostilidade a ele, e ao programa que tem tentado executar no governo até agora, lideradas pelo ex-presidente Lula. Na convenção da CUT, o ex-presidente Lula fez um discurso atacando o ajuste fiscal e foi interrompido várias vezes pelo coro ?fora Levy?. Depois disso, Lula passou a trabalhar abertamente pela troca do ministro da Fazenda, culpando-o pelos desastres que foram plantados antes da sua chegada e fortalecidos pela base do governo.

Um momento de grande tensão em que o ministro quase deixou o governo foi o do envio do Orçamento deficitário para o Congresso. Ele só foi informado quando já era fato consumado. A decisão fora tomada numa reunião da qual não participou. Na época, quando um interlocutor perguntou por que não deixava o governo, ele disse que não era o tipo de pessoa que sai no pior momento e que previa que haveria muita turbulência a partir daquela decisão equivocada. De fato, as consequências foram o rebaixamento do Brasil, a disparada do dólar, o salto do custo cobrado do país e de suas empresas em empréstimos no exterior.

Numa conversa com um interlocutor frequente, Joaquim Levy disse que sabe que está na linha de tiro de cada vez mais gente, mas que tenta manter a calma e continuar trabalhando. Nos últimos meses, ele fez inclusive o que nunca em sua vida profissional teve a habilidade de fazer: a negociação política para conseguir apoio às medidas propostas para reequilibrar o Orçamento. E o fez porque no governo falta de tudo, inclusive, e principalmente, articulador político. Levy acha que com essa sua iniciativa de interlocução com o Congresso conseguiu em alguns momentos evitar o pior. O problema é que frequentemente a maior derrota vem das bases do governo, como a aprovação da permissão de recálculo da aposentadoria, que aprofunda o déficit da Previdência e que teve apoio maciço do PT.

O Brasil está vivendo uma recessão forte com uma inflação perto de 10% e nada disso se deve à tentativa de ajuste fiscal comandada pelo ministro Levy. A inflação foi reprimida nos últimos anos com manipulação de tarifas públicas. Os gastos públicos foram exacerbados nos últimos anos e, como ficou provado pelo TCU, foram manipulados e jogados para adiante nas famosas pedaladas fiscais.

A reunião de ontem, na parte em que participaram outros ministros, foi dedicada ao problema de como pagar os atrasados aos bancos públicos para eliminar qualquer risco de um processo semelhante ao do ano passado nas contas públicas. Como esse é um dos caminhos do impeachment, a presidente está preocupada em eliminar qualquer ruído com o Tribunal de Contas. O problema é que os atrasados são uma conta alta demais para ser quitada de uma vez. A engenharia financeira para pagar tudo o que se deve ao Banco do Brasil e BNDES, e mais a conta de tarifas não pagas à Caixa, é muito alta.

Não há quem seja insubstituível, mas o que pouca gente no governo se dá conta é que sem Joaquim Levy haverá um aumento forte da desconfiança em relação ao Brasil e será difícil encontrar outro que aceite ir para o cargo e ser atacado como inimigo pelo próprio partido do governo.




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