A mídia e a falsa crise da Previdência
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A mídia e a falsa crise da Previdência


Por Mário Augusto Jakobskind, na revista Caros Amigos:

Há pelo menos duas décadas, quase diariamente, sucessivos governos federais e a mídia comercial têm denunciado uma suposta crise na Previdência Social. Os propulsores dessa tese advertem também que se nada for feito a Previdência vai quebrar. Jornais conservadores não fazem por menos e divulgam editoriais defendendo de todas as formas possíveis uma reforma que basicamente prejudicaria os assalariados.

Pois bem, a economista Denise Gentil, baseada em argumentos insofismáveis, acaba de apresentar tese de doutorado mostrando que a falência da Previdência Social tão alardeada é mentirosa e não resiste à análise mais aprofundada.

Falso déficit

Denise Gentil prova por A mais B a existência de uma gigantesca farsa contábil transformando em déficit o superávit do sistema previdenciário, que atingiu a cifra de R$ 1,2 bilhões em 2006. No aprofundado trabalho acadêmico da professora do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), fica demonstrada a cascata governamental com total apoio da mídia conservadora.

Omite-se o fato de que o superávit da Seguridade Social, abrangendo a Saúde, a Assistência Social e a Previdência, foi de R$ 72,2 bilhões. E o que aconteceu então? Segundo Denise Gentil, boa parte desse excedente vem sendo desviado para cobrir outras despesas, especialmente de ordem financeira. Mas tal fato é omitido e os brasileiros recebem a mentira repetida inúmeras vezes com o objetivo de que vire uma verdade, seguindo velha técnica do chefe da propaganda do III Reich nazista, Joseph Goebbels.

A tese de doutorado, intitulada A falsa crise da Seguridade Social no Brasil: uma análise financeira do período de 1990 a 2005, deveria ser apresentada como contraponto pela própria mídia conservadora, mas, claro, se ela fosse realmente imparcial como propaga. Mas não é, e por isso os leitores, ouvintes e telespectadores não têm acesso a esse tipo de reflexão.

Mas na edição do Jornal da UFRJ do último dia 11 de janeiro, a economista explica em detalhes a sua tese que contraria a “verdade” que vem sendo propagada há pelo menos duas décadas. Numa longa entrevista concedida à Coryntho Baldez, Denise Gentil assinala, entre outras coisas, que “a ideia de falência dos sistemas previdenciários públicos e os ataques às instituições do Estado de Bem Estar Social tornaram-se dominantes em meados dos anos 1970 e foram reforçadas com a crise econômica dos anos 1980 em que o pensamento liberal-conservador ganhou terreno no meio político e no meio acadêmico”.

Em sequência, ela afirma que “a questão central para as sociedades ocidentais deixou de ser o desenvolvimento econômico e a distribuição da renda, proporcionados pela intervenção do Estado, para se converter no combate à inflação e na defesa da ampla soberania dos mercados e dos interesses individuais sobre os interesses coletivos. Um sistema de seguridade social que fosse universal, solidário e baseado em princípios redistributivistas conflitava com essa nova visão de mundo (...). O principal argumento para modificar a arquitetura dos sistemas estatais de proteção social, construídos num período de crescimento do pós-guerra, foi o dos custos crescentes dos sistemas previdenciários, os quais decorreriam, principalmente, de uma dramática trajetória demográfica de envelhecimento da população (...). A partir de então, um problema que é puramente de origem sócio econômica foi reduzido a um mero problema demográfico, diante do qual não há solução possível a não ser o corte de direitos, redução do valor dos benefícios e elevação de impostos. Essas ideias foram amplamente difundidas para a periferia do capitalismo e reformas privatizantes foram implantadas em vários países da América Latina”.

Fernando Henrique Cardoso que o diga, bem como seus seguidores nos mais diversos campos, entre eles Armínio Fraga, consultor amplo e irrestrito do Senador Aécio Neves e muito ligado ao ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy.

Denise Gentil, em essência, defende a ideia segundo a qual o déficit previdenciário não está correto, porque não se baseia nos preceitos da Constituição Federal de 1988, que estabelece o arcabouço jurídico do sistema de Seguridade Social. “O cálculo do resultado previdenciário leva em consideração apenas a receita de contribuição ao Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) que incide sobre a folha de pagamento, diminuindo dessa receita o valor dos benefícios pagos aos trabalhadores. O resultado dá em déficit. Essa, no entanto, é uma equação simplificadora da questão. Há outras fontes de receita da Previdência que não são computadas nesse cálculo, como a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS), a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), a CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira) e a receita de concursos de prognósticos. Isso está expressamente garantido no artigo 195 da Constituição e acintosamente não é levado em consideração”.

Foco de corrupção silenciado

Já que este espaço está dedicado a colocar em cheque um falso argumento que vem sendo apresentado para iludir os brasileiros, vale a pena também mencionar artigo do economista José Carlos de Assis mostrando o silêncio total e absoluto da mídia conservadora em relação a um grave foco de corrupção de responsabilidade do Banco Central. Segundo ele, no ano passado foram desviados para o setor financeiro algo em torno de R$ 89,6 bilhões, quantia 40 vezes maior do que as fraudes cometidas por bandidos na Petrobras.

Esse desvio passou deliberadamente e ninguém reclamou. Até porque, claro, se o tema for aprofundado vai atingir também muitos setores que se apresentam diante da opinião pública como moralistas de plantão.

No Banco Central, ainda segundo Assis, rouba-se à vontade e longe de qualquer tipo de fiscalização da cidadania. E, ainda por cima, tudo sob a cobertura de “operações monetárias especiais só dominadas por ‘especialistas’”. Em seu desabafo muito bem fundamentado, Assis assinala ainda que “generoso com os bandidos do setor financeiro, o Banco Central é excessivamente parcimonioso com os agentes produtivos da economia. Sobre estes recaem as taxas extorsivas de juros que em outras partes do mundo, se efetivadas, resultariam em cadeia”. Por estas e ainda muitas outras, para se combater para valer a corrupção, não basta apenas espetáculos de pirotecnia como a Operação Lava Jato e outras do gênero. É preciso seguir informando questões como as denunciadas pelo economista José Carlos de Assis e a tese de Denise Gentile.

Lei dos meios de comunicação

E para finalizar, em matéria de silêncio da mídia conservadora, vale informar que na Argentina uma juíza federal de San Martin e um juiz federal de Buenos Aires deixaram sem efeito os decretos do presidente argentino Maurício Macri relacionados com a revogação da lei dos meios de comunicação.

Os jornalões e telejornalões deram grande destaque ao que havia determinado Macri, mas ignoraram totalmente as decisões dos juízes mencionados que revogaram o decreto que interessava ao grupo Clarín. Podem imaginar o motivo do silêncio desinformativo?




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