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Por Renata Mielli, no blog Janela sobre a palavra:
O debate sobre a distribuição das verbas publicitárias do governo federal gira em torno de algumas falsas polêmicas, entre elas a de que incluir critérios de promoção da diversidade e pluralidade informativas na alocação destes recursos seria contraditório ao princípio do uso eficiente destes recursos para que as mensagens do governo cheguem a um público amplo.
A Secom afirma que o critério de audiência dos veículos é o mais eficaz para promover os objetivos de comunicação do governo. Como explicitou em artigo recente o secretário executivo da Secom, Roberto Messias: “É necessário explicitar, quantas vezes forem necessárias, os critérios técnicos de mídia da SECOM. Se a publicidade de governo tem como objetivo primordial fazer chegar sua mensagem ao maior número possível de brasileiros e de brasileiras, a audiência de cada veículo tem que ser o balizador de negociação e de distribuição de investimentos. A programação de recursos deve ser proporcional ao tamanho e ao perfil da audiência de cada veículo”.
Ao que parece, o governo continua preso às amarras do mercado e à lógica monopolística que dita as regras da comunicação no Brasil. Não percebeu que a sociedade mudou seus hábitos de “consumo de mídia” a partir das novas tecnologias e que balizas estatísticas de audiência não são suficientes para se medir o sucesso do alcance de uma mensagem.
O peso da internet
É o que mostra, por exemplo, o estudo Brasil Conectado – Hábitos de Consumo de Mídia 2013. Apesar de o rádio e a TV serem as mídias mais consumidas se olhado o conjunto da população brasileira – já que ainda patinam as políticas de ampliação do acesso à internet – a pesquisa recentemente divulgada pelo comScore e o Interactive Advertising Bureau no país (IAB Brasil) mostra que a internet é considerada a mídia mais importante para 88% do público brasileiro, à frente da televisão, jornais e revistas. Entre os mais de 2 mil pesquisados, 40% passam ao menos duas horas conectados, contra apenas 27% dos que gastam o mesmo tempo assistindo TV.
Se olharmos a fatia de recursos que a Secom destina para a publicidade na internet a subrepresentação deste meio fica patente. Em 2012, foram aplicados míseros 5, 32% de todos os recursos de publicidade na internet. Antes, aparecem a TV, jornal, rádio e revistas.
Pesquisas de hábitos de consumo de mídia indicam que as principais fontes de informação das pessoas são, nesta ordem: TV, rádio, internet, jornal e revistas. Em alguns segmentos a internet já passou a frente da TV e rádio. Se ela já supera em muito os meios impressos e em alguns nichos até os meios eletrônicos, então como explicar que a internet esteja atrás destes todos no quesito receita de publicidade?
Concentração é mais eficiente que dispersão?
Além disso, por mais que seja óbvio entender que uma fatia maior dos recursos vá para a televisão, é eficiente imaginar que 62,63% de todo o recurso de publicidade se concentre neste meio? E que destes, 44% sejam destinados a uma única emissora de televisão?
Utilizando o conceito de eficiência perseguido pela Secom, não me parece que num país que possui mais de 5 mil municípios, do total de 1 bilhão e 800 milhões de reais gastos pelo governo em publicidade no ano de 2012, quase 500 milhões vá para a Rede Globo, cuja audiência medida está baseada em aparelhos ligados na grande São Paulo, Grande Rio de Janeiro, Grande Belo Horizonte, Grande Curitiba, Grande Porto Alegre, Grande Florianópolis, Campinas, Grande Vitória, Grande Goiânia, Grande Salvador, Grande Recife, Grande Fortaleza, Grande Belém e Distrito Federal, e que, segundo o próprio IBOPE, essa amostragem “não tem a intenção de representar um país heterogêneo como o Brasil”.
O critério audiência é frágil não só pela sua amostragem restrita, mas pelo fato de que medir se um aparelho está ligado, não significa automaticamente que esteja ocorrendo uma “audiência”. Novamente, é preciso recorrer às pesquisas de comportamento e consumo de mídia, que indicam que a audiência da TV é difusa, concentrada em nichos de programação e sujeita a inúmeras interferências externas. Várias pesquisa mostram que cresce o número de pessoas que fazem o consumo simultâneo de mídias.
Segundo dados do Brasil Conectado 2013, 73% do público online no Brasil usa a internet em diferentes canais enquanto assiste TV. Entre os entrevistados que navegam pela internet com notebooks enquanto assistem TV, 56% realizam atividades não relacionadas aos programas que estão assistindo. Quando a navegação é feita por smartphone esse número cai para 48% e para 47% quando é feita via tablet.
A pesquisa Debate Digital 2013 – Emergência do consumidor digital multitarefas, realizada internacionalmente pela KPMG, aponta que entre os brasileiros “multitarefa” (que veem TV e interagem com outros dispositivos, simultaneamente), a atividade mais realizada (57% dos entrevistados) é ver TV e acessar a internet por meio de um PC ou laptop e por motivos que excetuam navegar nas redes sociais.
Portanto, o critério estatístico de audiência – aparelho de TV ligado em determinada emissora – não pressupõe que esteja ocorrendo uma audiência: pessoa(s) assistindo à emissora.
Não quero dizer, com essa análise, que a TV não tem papel de grande difusor de informação, ao contrário – reconheço que este ainda é o principal meio de comunicação de massa da sociedade. Contudo, seu peso deve ser mais bem relativizado com relação aos outros meios quando se trata de discutir o alcance de uma mensagem publicitária do governo e sua eficiência.
Diversidade e pluralidade podem ser, SIM, sinônimos de eficiência
Neste contexto, entra o debate da diversidade e pluralidade e do perfil dos meios e de seus veículos na promoção da mensagem do governo, que não vende camas, nem televisores e nem carros; mas políticas públicas e cidadania. Muitas vezes, mensagens como estas podem ter um alcance mais eficiente se veiculados em mídias comunitárias do que no meio de um break comercial junto com cigarros, brinquedos e cerveja.
Na internet, então, o alcance de mensagens direcionadas de acordo com o perfil de cada site/blog pode ter muito mais eficácia do que uma página de publicidade na revista líder de tiragem e, portanto, líder em captação de verbas publicitárias do governo.
E, neste caso em particular, é impossível tapar os olhos ao perfil majoritário dos leitores da revista Veja – publicação explicitamente de caráter conservador, cujo público principal é composto de pessoas não simpáticas às políticas desenvolvidas pelo atual governo. Vale ressaltar, para não dar margem à dupla interpretação, que não estou defendendo que a seleção do destino das verbas seja feita a partir de um critério político, no sentido de – este veículo recebe porque é simpático ou não ao governo. O meu ponto é discutir que, se o objetivo é buscar eficiência na publicidade das ações do governo, nem sempre o critério de quanto maior o veículo, então maiores os recursos a ele destinados, é o mais eficiente do ponto de vista do resultado da mensagem a ser transmitida.
Neste sentido, redistribuir as verbas de publicidade a partir de critérios transparentes e pré-estabelecidos para contemplar um maior número de veículos em todos os meios e promover um equilíbrio maior da porcentagem de recursos entre os vários meios é fundamental para fomentar a diversidade e a pluralidade dos meios de comunicação, efetivando a comunicação como um direito de todos e inclusive aumentar a eficiência dos gastos do governo com publicidade.
A maior dispersão dos recursos, em comunicação, não significa de maneira alguma pulverização no sentido negativo de perda de eficiência, ao contrário, ela representa maior possibilidade de alcance real dos conteúdos.
Talvez, quando o governo compreender que não há dicotomia entre promover diversidade e garantir eficiência, consigamos dar um passo no sentido de democratizar o acesso de mais meios e veículos às verbas de publicidade do governo, abrindo o caminho para construir uma política pública democrática para a distribuição das verbas publicitárias.
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