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A qualidade na política - LETÍCIA SARDAS
O GLOBO - 02/10
Por definição, um partido político se organiza a partir de uma ideia de poder compartilhada por um grupo de cidadãos que, comungando uma determinada ideologia, se reúnem em torno de um projeto que acreditam ser o mais apropriado para gerir o Estado. Por ser subjetivo, logo sujeito à prova de uma realidade em que cada cidadão decide se dadas propostas ajustam-se à sua maneira de pensar/idealizar de que forma o poder constituído mais bem o representa, o ideário de uma agremiação política precisa estar afinado com demandas da sociedade. Em tese, essa é a dinâmica do fortalecimento de um partido: se ele se ajusta - em ações práticas, quando no exercício do poder, ou na verossimilhança de seu programa - às necessidades de representação do eleitorado, sobrevive e cresce; se não, fenece.
Esta explanação inicial é importante para que se entenda não só a importância da existência de partidos que alcancem todo o espectro ideológico da sociedade, mas principalmente a sua influência. Não à toa, ao nos legar a Carta de 88, que repôs o país no caminho da normalidade institucional, o constituinte teve o cuidado de assegurar o princípio do pluripartidarismo, cláusula pétrea da democracia, entre as garantias da representação política. Providência pertinente para conjurar de vez fantasmas como a tentação do partido único ou a criação artificial de legendas que atendessem os interesses dos inquilinos do poder em detrimento das demandas da sociedade.
A qualidade da representação política, a História ensina e países de democracia consolidada são a prova cabal, não se mede pela profusão quase sem limite de partidos políticos, mas pelo fortalecimento das legendas. Não se pode dizer que, num país em que se conta às dezenas o número de agremiações em busca do voto do eleitor, o arco social esteja bem contemplado; esta não é uma relação de causa e efeito. Em nações onde partidos têm compromissos programáticos com os setores a eles afins, a qualidade da representação não está ligada à quantidade de opções colocadas à boca da urna.
A política não recomenda extremos. Não se combate a assombração do partido único com seu suposto contrário - a criação indiscriminada de legendas. O meio-termo que se deve buscar não está, obviamente, em nenhum dos lados da equação, no totalitarismo unipartidário ou no liberalismo das legendas fundadas sem correspondência com os interesses das camadas sociais. Trazendo para a realidade que se pretende discutir: por si, a existência de 32 partidos no Brasil não confere mais qualidade à vida política do país, mergulhado em demandas sociais graves, entre as quais sobe à ponta o aperfeiçoamento da representação.
O que determina o aprimoramento da representação política é a existência de partidos solidamente estabelecidos em princípios que se confundam com as demandas da cidadania. Isso, a meu ver, é o que os grupos que se candidatam ao exercício do poder político devem buscar, em nome do fortalecimento da democracia e acima, bem acima, de interesses pessoais, cartoriais, corporativos ou outros que desservem ao país.
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