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As novas criações - MÍRIAM LEITÃO
O GLOBO - 07/02
Na economia, há ideias simples que servem para famílias, firmas e governos. Uma delas é que quem está com dívidas e déficit tem que demostrar compromisso com o pagamento das dívidas e redução do déficit. E há ideias que tentam contornar essa realidade. Do segundo grupo faz parte a proposta de ter metas fiscais flexíveis, que está saindo da mesa do ministro da Fazenda, Nelson Barbosa.
O ministro está formulando duas propostas. A de estabelecer limites de gastos e a de ter metas que podem ser ou podem não ser. A primeira parece boa, mas tem algumas complicações. O governo está indicando que quer incluí-la na Lei de Responsabilidade Fiscal. E aí mora o perigo. Hoje, a LRF é vista como uma camisa de força por todos os gestores públicos. Reabri-la pode ser perigoso em temporada de jabutis soltos no Congresso.
Nelson Barbosa sabe bem o que um jabuti e uma base parlamentar fragmentada e sem liderança podem fazer em um projeto com boas intenções. Foi dele a decisão de propor a MP 664. Ela iria reduzir o gasto da Previdência pelas bordas, diminuindo o benefício das viúvas e viúvos muito jovens. Economizaria pouco, mas seria a mudança de um princípio, segundo dizia o ministro. Acabou se transformando no maior vetor de aumento dos gastos da Previdência, ao derrubar o fator previdenciário. Melhor seria se tivesse feito a proposta óbvia: a de reforma da Previdência, da qual agora se fala.
Em época de dificuldades fiscais nos estados e no governo federal, qualquer ideia que for ao Congresso tem que ser blindada contra os projetos que ficam nas gavetas e que são pendurados no que está tramitando. Se ele tem segurança de que não haverá jabutis a bordo do seu projeto de limites dos gastos dentro da lei fiscal, deve ir em frente. Antes, contudo, tem que se certificar se dá para fazer, diante da rigidez orçamentária do Brasil. Já a ideia de metas flexíveis ? que poderão ser descumpridas caso haja queda de receita ? essa será muito bem-vinda pelos governos, já que significa ter uma desculpa oficial e automática para não cumprir a meta.
O problema é que o compromisso firme com uma meta fixa é a forma de reduzir temores dos credores e desconfiança de investidores. E eles não são os estrangeiros de sobrecasaca. A dívida pública é sustentada por milhões de brasileiros que aplicam as suas economias em produtos financeiros lastreados por títulos do Tesouro.
O ministro tem, no passado, registro de apoio a muitas ideias criativas. Estavam erradas. Em março de 2010, publicou um artigo neste jornal dizendo assim: ?Esta resposta bem sucedida deve-se sobretudo ao novo tripé que orienta a política econômica dos últimos anos: crescimento econômico, inclusão social e redução da vulnerabilidade a choques internacionais.? Era o auge da nova matriz macroeconômica que trouxe o país ao mais longo período recessivo da história. A nova matriz tentou substituir o tripé tradicional que garantiu ao Brasil a estabilidade monetária: superávit primário, câmbio flutuante e metas de inflação. A nova tese era que pelo crescimento tudo poderia ser feito, inclusive a agressiva política de desonerações e isenções para setores, que provocou rombos enormes nas contas públicas. Esses rombos, a antiga equipe econômica tentou esconder com as pedaladas.
O princípio incluído na Lei de Responsabilidade Fiscal é simples: bancos públicos não podem financiar o Tesouro. As pedaladas tentaram contornar isso criando fórmulas complexas, alquimias, contabilidade criativa. Tudo foi desmascarado pelo TCU, e o governo foi obrigado a pagar as pedaladas. Agora, economistas se debruçam sobre as operações para tentar entender o mecanismo financeiro usado para pagar as pedaladas. A suspeita é que tenha sido feita uma triangulação para contornar a proibição de que o Banco Central financie o pagamento, pelo Tesouro, de despesas correntes. Em nota, o BC negou.
O Brasil está numa situação fiscal de extrema delicadeza. A dívida bruta e o déficit nominal tiveram aumentos explosivos nos últimos anos. O resultado primário que era positivo virou um déficit de 2% do PIB. O que se espera do ministro da Fazenda é que ele tenha uma fórmula crível de enfrentar esse problema. De preferência, uma ideia universalmente aceita.
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