Por Victor Tineo, no jornal Brasil de Fato:O número de assassinatos no campo em 2015 foram os maiores desde 2004, apontam os registros do banco de dados do Centro de Documentação Dom Tomás Balduino. Segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT), a maior parte destas mortes são de posseiros e lideranças camponesas.
Ao todo, foram registradas 46 mortes e 79 ameaças. Dessas ameaças, quatro pessoas foram executadas, sendo elas dois posseiros, uma líder camponesa e um conselheiro do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade.
Rubens Siqueira, da coordenação nacional da CPT, avalia que grande parte dos assassinatos estão ligados à expansão do agronegócio nas regiões. “Com a expansão do agronegócio, essa áreas passam a ser mais valorizadas. Negociantes, que são grileiros mesmo, pressionam os posseiros. Queimam casas, aterrorizam, matam, para poder negociar essa terra com empresários que tenham interesse no local”, diz.
Rubens reflete que as regiões onde há maior presença do agronegócio e da mineração são aquelas com o maior número de ocorrências. “A gente vê que dois elementos chamam atenção, a violência contra as lideranças, para impedir e desorganizar movimentos em defesa dos direitos, e a perseguição aos próprios posseiros. O interesse desses empresários, negociantes e grileiros atacam quem está na terra", disse.
A criação do programa Terra Legal em 2009, para regulamentar terras na Amazônia, pode ser um dos problemas, pois regulariza um perímetro possível de ser ocupado, mas não interfere na sua divisão e a deixa para o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), alega Rubens.
A CPT avalia que “a omissão do Estado é gritante”, conforme divulgado na nota pública. Rubens afirma que os três níveis do estado, judiciário, executivo e legislativo, estão corrompidos na lógica do agronegócio. “Em julgamentos de reintegração de posse há indícios que os juízes são parciais para o lado do agronegócio”.
ParáAs regiões do sul e sudeste do Pará são de conflitos permanentes. É também a região com o maior rebanho Bovino do Brasil. O advogado da CPT no Pará, José Afonso Batista, avalia que há uma ofensiva do setor agronegócio e da mineração. A mineradora Vale abriu quatro novos projetos de extração de minério.
“A expansão desses territórios de exploração mineral ou de agropecurária extensiva incide em regiões indígenas, em terras de posseiros e áreas de assentados, o que acaba gerando muitos conflitos”.
Com as promoções de plantas de exploração da Vale e de outras mineradoras, pessoas que se mudaram para a região e não conseguem emprego utilizam a ocupação como recurso. Acontece que essas áreas também são de interesse das mineradoras, agronegócio e dos grileiros, conforme explica Afonso.
“Há propriedades do estado e união onde essas pessoas ocupam. Mas essa região é também de interesse do agronegócio e da mineração, e aí ocorrem os conflitos pela terra”.
A fraca participação do estado é um dos problemas da região, denuncia o advogado. O programa Terra Legal favoreceu os grandes empresários, o que levou a prisão de parte da direção do programa em Marabá numa operação da PF há dois meses.
O programa tirou do Incra a competência para arrecadar as terras públicas. A região de São Félix do Xangu e Anapu não possuem advogados da união e, por isso, o processo de retomada das terras públicas para utilização da reforma agrária fica comprometido, informa a CPT.
JagunçosEntre os perimetros de São Félix do Xingu e Anapu, denúncias da existência de jagunços e pistoleiros são frequentes, mas para além disso, Afonso denuncia que há empresários da pistolagem. “Quando algum fazendeiro ou grileiro precisa fazer uma ação violenta em suas áreas contrata uma espécie de escritório da região. Os 'escritórios' fazem a contratação de pistoleiros para limpar a área ou expulsar os posseiros e até mesmo assasinar os trabalhadores da região”, alerta.
A CPT exige maior presença do estado para chegar ao fim das violências no campo. “Uma presença efetiva do Estado é necessária para dar segurança e garantia de vida não só aos ameaçados individualmente, mas às comunidades às quais pertencem, pois as ameaças às lideranças e aos que as apoiam têm como objetivo direto minar as comunidades na sua capacidade de resistência e enfrentamento. É inconcebível que o campo, a terra e o território de tantas comunidades e povos, espaço de vida, cultura e produção, em pleno século XXI, continuem sendo expropriados e palco de uma barbárie histórica e assassina”, diz a nota.
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