Por Altamiro BorgesQuem ainda acompanha a mídia “privada”, nos dois sentidos da palavra, deve estar se perguntando: Onde anda o governador Beto Richa? Ele simplesmente sumiu do noticiário dos jornais, revistas e emissoras de rádio e tevê. Será que renunciou? Foi cassado? Exilou-se na Suíça, um país que garante tantos segredos? Morreu? Afinal, o que ocorreu com o grão-tucano, após o massacre dos professores e dos inúmeros escândalos de corrupção? Não dá para dizer que o seu sumiço decorra da ausência de “jornalistas investigativos” em Curitiba. A midiática Operação Lava-Jato, que tem como território a “República do Paraná”, concentra uma tropa de repórteres da imprensa denuncista e sensacionalista.
Também não dá para dizer que falta pauta para a cobertura jornalística das andanças do governador do PSDB. Depois do famoso massacre dos professores, em 29 de abril – que resultou em mais de 200 feridos –, outros escândalos afetaram a imagem do playboy tucano. No mais recente, o coronel da Polícia Militar, Chehade Elias Geha, revelou na semana passada que foi afastado do comando da tropa exatamente porque advertiu o governador sobre o “flagrante abuso de autoridade” na repressão à greve dos docentes. Beto Richa sempre jurou que não autorizou a violência e até exonerou o seu secretário de Segurança, o fascista Fernando Francischini (SD). Agora, porém, caiu a sua máscara.
No final de junho, o Ministério Público inclusive ajuizou uma ação civil contra o governador do PSDB por improbidade administrativa. Ele foi considerado um dos culpados pelo “massacre" dos grevistas. O MP também responsabilizou o ex-secretário Fernando Francischini, o ex-comandante da PM, César Vinícius Kogut e o ex-subcomandante Nerino Mariano. Todos sofreram punições, menos o cacique tucano. Um grupo de juristas até pediu a abertura de processo de impeachment contra Beto Richa, mas a solicitação foi sumariamente arquivada pela servil direção da Assembleia Legislativa, totalmente controlada pelo PSDB e seus satélites governistas.
O “suposto primo” do governador tucanoNa esteira do “massacre” dos docentes, velhas e novas denúncias finalmente chegaram ao noticiário local e nacional. O caso mais cabeludo é o da corrupção na Receita Estadual do Paraná. Ela envolve diretamente o “empresário” Luiz Abi Antoun, primo de Beto Richa – que a mídia amiga insiste em chamar de “suposto primo”. Em meados de junho, após ficar foragido por alguns dias, ele inclusive se entregou ao Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), em Londrina. Sua detenção foi decretada com base na Operação Publicano, que investiga o milionário esquema de corrupção e fraude fiscal e expediu 68 mandatos de prisão. Mas ele não ficou muito tempo na cadeia.
Segundo as investigações do Gaeco, o esquema envolveria auditores fiscais e poderosos empresários do Paraná e consistia em burlar as normas da Receita para abater ou anular dívidas. Luiz Abi Antoun – primo e ex-assessor parlamentar de Beto Richa – é suspeito de ser o principal integrante desta organização criminosa. “É evidente que ele atua não apenas com ascendência sobre os maiores escalões da receita, mas também com toda a sua influência política no governo estadual”, afirma um dos trechos da sua ordem de prisão. Já o promotor Renato de Lima Castro foi enfático na acusação: “É uma super organização criminosa na Receita que extrapola os limites do município de Londrina”.
O relatório do Gaeco inclusive trouxe fotos de Beto Richa ao lado do influente primo e de Márcio de Albuquerque Lima, companheiro de corridas do governador e ex-inspetor geral de fiscalização da Receita, outro chefão da máfia. Ainda segundo as investigações, o esquema da fraude fiscal, que abocanhou R$ 4,3 milhões em propina dos empresários, abasteceu a campanha pela reeleição de Beto Richa, em 2014. Diante da gravidade da denúncia, o grão-tucano e seu partido – metido a vestal da ética – têm feito de tudo para abafar o caso. No final de junho, Beto Richa solicitou a suspensão das investigações na Receita, mas o pedido foi rejeitado pelo ministro João Otávio Noronha, do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Propinas e exploração sexual de menoresCaso a investigação das fraudes fiscais tivesse maior repercussão na mídia privada, a situação do governador seria ainda mais dramática. Um dos delatores do esquema, o fotógrafo Marcelo Caramori – que já foi assessor de Beto Richa e até tatuou no antebraço direito sua devoção ao tucano (“100% Beto Richa”) –, foi preso em Londrina acusado de integrar uma rede de exploração sexual infantil. Tchello, como é chamado na cidade, já prestou sete depoimentos e fez acordo de “delação premiada”. Num dos testemunhos, ele confirmou a “enorme influência” de Luiz Abi Antoun no desvio de grana da Receita. Ele também garantiu que o “suposto primo” é o principal arrecadador de recursos para as campanhas do PSDB.
Outro integrante da rede criminosa, Luiz Antônio de Souza, foi preso em flagrante num motel com uma menina de 15 anos. Ex-auditor fiscal, ele confirmou a existência da segunda quadrilha, a da máfia da Receita, e afirmou que o esquema abasteceu a campanha à reeleição de Beto Richa, em 2014, com ao menos R$ 2 milhões. Ele apresentou ao Ministério Público notas que comprovariam o uso destes recursos. O PSDB nega que Luiz Antônio de Souza tenha tido participação na captação de recursos para as campanhas da sigla. Neste verdadeiro mar de lama, no final de maio ainda apareceu uma terceira grave denúncia, que envolve diretamente a primeira-dama do Estado, Fernanda Richa.
Segundo o Ministério Público, auditores fiscais do Paraná teriam metas anuais para doar a uma ONG ligada à mulher do governador Beto Richa. A campanha de arrecadação teria sido deflagrada em 2011 e coletou R$ 3,7 milhões nos últimos três anos. A Folha tucana até revelou o esquema: “Os valores estão na mira do Ministério Público. Uma denúncia anônima sustenta que Fernanda Richa exigiu doações ao Provopar e à campanha do marido em troca da promoção de auditores, em 2014. Reportagem da Folha mostrou que auditores doaram quase R$ 1 milhão ao tucano e a seus aliados em 2014”, descreveu o jornal, que depois simplesmente não abordou mais a inflamável denúncia.
Diante destas suspeitas apimentadas – que envolvem propinas milionárias, caixa-2 de campanha, exploração sexual infantil e pessoas íntimas do governador do PSDB –, volto à pergunta: Cadê o Beto Richa? Por que a mídia, regada com fartos recursos em publicidade, retirou o grão-tucano do noticiário? Ele sumiu dos comentários ácidos do “Jornal Nacional” da TV Globo, nunca foi brindado com as capas fantasmagóricas da “Veja” e nem frequenta as páginas diárias dos jornalões. Muito estranho. Dá até para desconfiar da imparcialidade e da neutralidade da mídia privada.
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