Por Daniel Dantas, no blog De olho no discurso:Ao acordar agora pela manhã me surpreendi com o nome Organizações Globo entre os Trending Topics Brazil. Fui olhar e... bingo. Rodrigo Vianna e a blogosfera progressista incomodam. Mais que isso: o cuidado da emissora indica que o escrevinhador estava bem informado.
Explico: Rodrigo publicou na sexta-feira à noite a informação, amplamente repercutida em toda a blogosfera, que havia uma determinação editorial de bater em Celso Amorim, nomeado ministro da Defesa. No dia seguinte, a Globo se vê obrigada em divulgar um documento que reúne os princípios editoriais de seus veículos de comunicação.
Houve reportagem no Jornal Nacional e em seus sites de notícias sobre o assunto, descrevendo normas e condutas que o grupo deve seguir com relação ao seu conteúdo jornalístico, como isenção, correção e agilidade.
É no mínimo curioso, para não falar em ridículo, a Globo falar em princípios como isenção, correção e agilidade. Ao ler isso, só posso me lembrar de 2006, na noite da sexta-feira, 29 de setembro, véspera da eleição em primeiro turno e, dia do acidente do Gol. Estava no Rio de Janeiro, em um curso, já havia quase três meses. Nos últimos quinze dias, praticamente, o tema que dominava a campanha entre o presidente Lula e o governador Geraldo Alckmin (PSDB) era o dôssie com informações contra José Serra e outros tucanos que, supostamente, os envolviam com os irmãos Verdoin e o escândalo dos sanguessugas.
O dossiê vai sempre ficar no âmbito do supostamente, uma vez que ninguém se dispôs a investigar sua veracidade após a prisão dos petistas que estavam prontos a comprá-lo em um hotel de São Paulo. O presidente Lula os batizou de aloprados.
Acontece que o tema passou a monopolizar a eleição nos dias seguintes e houve uma pressão enorme para que a Polícia Federal divulgasse fotos do dinheiro - de impacto visual e eleitoral indubitável. Até que no dia 29, no início da tarde, o delegado Bruno, que havia feito a prisão em flagrante dos envolvidos, desvio um CD com fotos do dinheiro para a imprensa.
O avião da Gol desapareceu dos radares no fim daquela tarde. Era por volta das 18h quando as primeiras notícias sobre o avião desaparecido surgiram na imprensa. Lembro que voltei do curso para o hotel onde me hospedava, no centro do Rio. O Jornal Nacional daquele dia foi totalmente dedicado às fotos do dinheiro - afinal no domingo era a eleição e, tudo indicava, ainda era possível impedir uma vitória de Lula no primeiro turno. Logo após o jornal, no primeiro break da novela, entra um plantão do Jornal da Globo, com William Wack, informando o acidente da Gol.
Na semana seguinte, tive aula com profissionais de grandes veículos nacionais. Entre eles, uma editora do Jornal das Dez, da GloboNews. Eu mesmo perguntei como era a relação com a matriz no que se referia a furos: Era possível à Globo News furar a Globo? Ela deixou claro que não. E, espontaneamente, lembrou o acidente na última sexta-feira. Segundo ela, por volta das 19 h a Globo News já tinha tudo pronto para falar sobre o acidente. Mas havia uma ordem da direção para que nada fosse divulgado até que a Globo noticiasse.
Confesso que na hora ninguém fez uma leitura política do fato. Até que a Carta Capital mostrou como a Globo e Ali Kamel haviam manipulado o caso das fotos em detrimento à queda do avião - porque tinha seus interesses eleitorais, nada isentos ou corretos. E se fosse verdade a versão de Kamel, nenhum pouco ágeis. Afinal, segundo o diretor, a notícia do acidente somente chegou à Globo com o Jornal Nacional no ar. Fazia duas horas que a emissora filha já tinha material pronto para dar a notícia. Se levou duas horas para que a notícia passasse da Globo News para a TV Globo, a se tomar em consideração a versão oficial, a Rede Globo prova ser nenhum pouco ágil.
Mas não é o caso. Havia uma manipulação política dos fatos do dia para beneficiar a candidatura que apoiavam - Alckmin - em detrimento da candidatura do presidente Lula. Do mesmo modo que fizeram em 1989. De modo semelhante a agora, quando a direção editorial da tevê deu ordens de bater em Celso Amorim, conforme denunciou Rodrigo Vianna.
O episódio destaca que o que falamos na Internet pode provocar impactos e problemas para o mainstream da mídia. A Globo reagiu a uma informação publicada em blog por um ex-repórter seu que saiu por não se conformar com a forma parcial de cobertura da eleição de 2006. Essa informação circulou com bastante intensidade nos blogs e redes sociais. A tevê reagiu onde podia provocar mais impacto: até o Jornal Nacional foi convocado para lhe fazer a defesa. E o tema entrou no TTBr.
Mas, como lembra Luiz Carlos Azenha, que também conheceu por dentro as manipulações da Vênus Platinada, em 1989 a emissora também tinha seus príncipios para melhor se exerça a democracia:
A TV Globo também fez uma declaração de princípios, em 1989.
Foi na noite em que o Jornal Nacional transmitiu o resumo do debate eleitoral entre Fernando Collor e Lula, editado de tal forma a destacar as melhores falas de Collor e as piores de Lula.
Collor e Lula disputavam a presidência da República. Collor, com apoio da Globo, venceu a eleição.
Seguiu-se ao resumo do debate uma pesquisa do Vox Populi, então ligado a Collor, mostrando como Collor era “o melhor preparado”.
Então, Alexandre Garcia apareceu no vídeo para dizer:
“Nosso trabalho, como profissionais da televisão, foi e continuará sendo o que fez a televisão nesses dois debates. Manter aberto esse canal de duas mãos entre o eleito e os eleitores, para que melhor se exerça a democracia”.
Foi no mesmo ano em que a ex-namorada de Lula, Miriam Cordeiro, apareceu primeiro no Jornal Nacional e depois na propaganda de Collor dizendo que o ex-metalúrgico Lula tinha pedido a ela que abortasse e feito declarações racistas. Miriam recebeu dinheiro para fazer tais declarações.
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