Por Eduardo Guimarães, no Blog da Cidadania:Desde a semana passada até o presente momento eclodiu uma crise política que ainda é pequena, mas que pode crescer. Ou não, caso o governo Dilma recue da investigação de boato sobre o Bolsa Família que gerou pânico em 12 Estados e em localidades do Rio de Janeiro.
Entre os dias 18 e 20 de maio, foi espalhado que o Bolsa Família seria extinto. Assim, centenas de milhares de pessoas acorreram, desesperadas, a agências da Caixa Econômica Federal para tentar sacar o que seria a última parcela do benefício.
Lá chegando, as vítimas conseguiram sacar o benefício e, algumas, até uma parcela a mais do que esperavam. Isso teria ocorrido porque a Caixa estaria promovendo alteração do cadastro de informações de todos os programas sociais que o banco administra.
Em coletiva de imprensa, Jorge Hereda, presidente da instituição, informou que seu sistema tinha acima de dez anos de vigência e, assim, precisava ser atualizado. Havia mais de 200 milhões de cadastros e, após a triagem, foram identificadas cerca de 1 milhão de famílias que teriam dois ou mais cadastros.
A Caixa, anteriormente, divulgou que antecipara pagamentos para o dia 19 de forma que os alarmados pelo boato não entrassem em pânico, mas, agora, desmentiu a informação, afirmando que os recursos já estavam disponíveis no dia 18.
Em resumo, o banco errou ao dizer que liberou o dinheiro para acalmar os alarmados pelo boato, que acorreram às suas agências no dia 19, sábado, data em que a informação falsa produziu os efeitos que se viu.
Esse erro motivou convite da oposição ao presidente da Caixa para ir ao Congresso dar explicações. Parlamentares do PSDB e do DEM insinuam que tal erro causou o pânico, não uma orquestração do boato.
A tese da oposição e da mídia é a de que, ao encontrar dinheiro depositado antes nas contas, as pessoas entraram em pânico. A antecipação seria sinônimo de que o programa iria acabar e, assim, uma vítima começou a dizer a tese à outra e todas se deixaram convencer por ela.
Todavia, a tese não explica porque só Pará, Piauí, Paraíba, Bahia, Pernambuco, Ceará, Maranhão, Alagoas, Sergipe, Rio Grande do Norte, Amazonas, Tocantins e regiões localizadas do Rio de Janeiro foram atingidos se o Bolsa Família está presente no país inteiro.
O dinheiro que estava liberado nesses Estados, estava também naqueles em que não houve corrida às agências da Caixa. Por que nos Estados do Sul, do Sudeste e do Centro Oeste não houve a mesma corrida se a disponibilização do dinheiro ocorreu em todos os Estados?
Mais: como as vítimas do boato saberiam que o dinheiro foi disponibilizado antes do dia de costume? Para irem ao banco verificar se o dinheiro estava lá, seria preciso que tivessem motivo.
A tese da oposição e da mídia é a de que alguns encontrarem dinheiro antes da hora em suas contas fez com que começassem a espalhar que o benefício seria extinto (?).
Volta-se, assim, ao ponto de partida: a teoria, de novo, não explica por que no resto do país, apesar de ter ocorrido a mesma liberação antecipada do dinheiro que houve no Norte e no Nordeste, não ocorreu pânico.
Por enquanto, a mídia não assumiu a acusação que alguns de seus colunistas vêm fazendo ao governo de que este teria montado a farsa do boato a fim de demonstrar a importância do programa e acusar a oposição.
A tese de jornalistas como Ricardo Noblat ou Reinaldo Azevedo, entre outros, não é pouca coisa: a própria Dilma Rousseff, seus ministros e até o presidente do PT, Rui Falcão, estariam mancomunados nessa farsa.
Na oposição ainda não há uma acusação desabrida ao governo de ser o autor da farsa, mas oposicionistas endossam a tese de forma avulsa.
A ministra da Secretaria de Direitos Humanos, Maria do Rosário, que no primeiro momento desse caso insinuou que haveria envolvimento da oposição, encolheu-se. O ministro da Justiça despolitizou completamente o caso e o PT vem assistindo impassível às insinuações.
Contudo, notícia divulgada no fim de semana açulou os ânimos da oposição e da mídia: empresa de telemarketing do Rio estaria envolvida na disseminação de boatos.
Imediatamente, as acusações da oposição e da mídia, que vinham esmaecendo, recobraram vigor e foram parar no Jornal Nacional de ontem, além de nos blogs e portais.
A notícia sobre a empresa de telemarketing reforça a tese da orquestração que o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, tem dito ser uma das hipóteses com as quais a Polícia Federal está trabalhando.
A tese da orquestração não é aceita pela mídia caso parta do governo, só vale quando a oposição a usa. E, assim mesmo, o que parece mais interessante a essa mídia é a tese de o boato ter surgido espontaneamente, por culpa da antecipação dos pagamentos pela Caixa.
No fim, o que se pretende é que fique o dito pelo não dito. O governo se convence de que, se insistir na investigação, a mídia e a oposição conseguirão inverter os fatos e, assim, desiste de ir até o fim.
O histórico do governo Dilma sugere capitulação, apesar de estarem surgindo cada vez mais informações curiosas sobre o caso, como a da empresa de telemarketing do Rio.
No fim do ano passado, o jornal O Globo pediu ao Ministério do Desenvolvimento Social que fornecesse a lista de beneficiários do Bolsa Família atendidos desde a criação do programa, em outubro de 2003.
Apesar de os dados figurarem no portal da transparência, lá não era possível saber quem entrou no programa quando foi criado e permanece nele até hoje. O governo acabou enviando esses dados ao jornal em março, fornecendo-lhe mais de 500 mil nomes.
Suspeita-se de que esse interesse do jornal pelo Bolsa Família teria relação com o boato sobre o fim do programa e de que seus autores ficaram sabendo da mudança nos cadastros da Caixa e se aproveitaram dela para desfechar o golpe.
No PT e no governo Dilma há quem defenda deixar o dito pelo não dito. Levar o caso adiante seria dar à mídia e à oposição o argumento de que o governo promove práticas ditatoriais contra os adversários.
Segundo esses setores do PT e do governo Dilma, a PF – que esse governo supostamente comanda – não irá apurar nada porque seria toda demo-tucana, apesar de ser o mesmo governo quem nomeia e demite do primeiro ao último homem da corporação.
A lógica, ao fim e ao cabo desta análise, sugere que a capitulação do governo nesse caso ensejará uma onda de ocorrências do mesmo tipo daqui até o processo eleitoral do ano que vem a fim de vender ao eleitorado que “o PT e Dilma” querem acabar com o Bolsa Família.
O “problema” é que essa investigação pode – apenas pode, mas pode – esbarrar em gente muito poderosa ligada à oposição e à mídia. Levá-la adiante seria um fato inédito desde 2003 até hoje, quando os governos Lula e Dilma capitularam em todos os enfrentamentos.
Menos no eleitoral, claro.
A grande pergunta que se faz, portanto, é se o governo Dilma e o PT, que estão cada vez mais encolhidos diante da gritaria da oposição e da mídia, mudarão de conduta de forma tão radical e, por fim, enfrentarão adversários que querem vencê-los por meio de golpes.
Se o fizerem e as suspeitas crescentes se confirmarem, haveria uma hecatombe política. O envolvimento de grandes partidos de oposição e até de algum grande grupo de comunicação, seria o maior escândalo político do século XXI no Brasil, acima do mensalão.
Façam suas apostas.
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