Carlos Nelson Coutinho e a dialética
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Carlos Nelson Coutinho e a dialética


Por Maria Luisa Mendonça, no jornal Brasil de Fato:

“É exatamente por se limitar à apreensão imediata da realidade, em vez de elaborar as categorias a partir de sua essência econômica, que o pensamento da decadência serve ideologicamente aos interesses da burguesia. Pois, ao assim proceder, aceita a positividade capitalista, sujeitando-se aos limites espontaneamente impostos pela economia de mercado, que fetichiza as relações humanas” - Carlos Nelson Coutinho em O Estruturalismo e a Miséria da Razão.
O pensamento crítico fica mais pobre com a morte de Carlos Nelson Coutinho, que nos deixa seu legado na compreensão do materialismo dialético e na importância de rejeitar a influência positivista no marxismo. Para além de simples exercício teórico, o entendimento do método dialético é essencial na crítica ao modo de produção capitalista e nas lutas por transformação.

A obra de Coutinho reconhece a influência da dialética hegeliana em Marx e explica que o modo de produção capitalista só pode ser entendido a partir da negação de sua própria identidade, portanto, a partir da contradição e não da oposição. Porém, para Hegel, há um momento de resolução da contradição a partir de uma hipótese idealista. Para Marx, o conceito de capital não se efetiva e só se manifesta na forma de fetiche, definido como caráter “fantasmagórico” da mercadoria. Portanto, a razão do capital é irracional e suas contradições são internas e insuperáveis, ou seja, só seriam resolvidas com a própria superação do capitalismo.

O capital deve ser compreendido a partir de sua lógica interna e não a partir de uma visão historicista tampouco positivista. A análise da forma-mercadoria se dá a partir de seu conteúdo aparentemente abstrato – o valor. A teoria do valor está baseada na relação capital-trabalho, mesmo que o trabalho se expresse a partir de sua identidade negativa – o não-trabalho. Para Marx, o trabalho humano é uma abstração concreta (“dispêndio de cérebro, nervos, músculos, sentidos, etc.”), que se realiza como medida de produção de valor nas mercadorias. Por sua vez, o valor das mercadorias se expressa não a partir do que realmente é – tempo de trabalho abstrato – mas a partir da negação de suas categorias no processo produtivo. A forma-mercadoria funciona como modo de apresentação fetichista do capital, a partir de uma irracionalidade que aparece como racional.

O materialismo histórico não é um método mecanicista, como alguns autores estruturalistas e positivistas passaram a defender. Coutinho resgata o conceito de práxis como inseparável da teoria e vê sujeito e objeto em uma relação simultânea dialética. A consciência seria formada a partir de determinadas relações de produção, nas quais as pessoas se constituem simultaneamente como sujeito e objeto. Esse entendimento se opõe tanto à noção empirista, que vê a sociedade apenas como expectadora do processo histórico, quanto o utopismo que imagina o sujeito como condutor da história.

“Essa fetichização simultânea do sujeito e do objeto, paralela à ruptura dos laços imediatos entre indivíduos e comunidade, é a mais evidente consequência social da divisão capitalista do trabalho”, explica Coutinho, que nos presenteou com os elementos necessários na tarefa de decretar a vitória da dialética.




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