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Corrupção institucionalizada - MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 06/12
O que todos supúnhamos está ganhando contornos de verdade: o esquema de corrupção nas licitações de obras públicas está espalhado por vários setores no país, e não se restringe apenas à Petrobras.
Com conhecimento de causa, essa certeza já havia sido dada pelo ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, que iniciou o processo de delação premiada nas investigações do escândalo que ficou conhecido como petrolão.
Em recente sessão da CPI mista do Congresso, Costa afirmou que o mesmo esquema de corrupção que existe na estatal se repete em todos os outros contratos públicos do país, incluindo ferrovias, portos, aeroportos e demais obras.
O próprio juiz Sérgio Moro, do Paraná, responsável pelas investigações da Operação Lava-Jato, disse ontem que as evidências já recolhidas indicam que o esquema de fraude em licitação "vai muito além" da Petrobras. Ele classificou de "perturbadora" uma tabela apreendida em março com o doleiro Alberto Youssef, que continha uma lista de cerca de 750 obras públicas de infraestrutura.
Ali, constavam "a entidade pública contratante, a proposta, o valor e o cliente do referido operador, sendo este sempre uma empreiteira", mostrando pelo menos o interesse do doleiro em prospectar novos negócios ilegais no mesmo setor em que já operava.
O ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa confirmou para a CPI outro ponto que já se sabia pelas evidências: para ser indicado para diretoria de estatal, "em todos os governos, desde Sarney, Itamar, Fernando Henrique, Lula, Dilma", é preciso ter apoio político.
O interesse de políticos por indicações para "a diretoria que fura poço" ou para chefe da Receita Federal no aeroporto de Cumbica ou no Porto de Santos ou para diretor da Transpetro sempre existiu, e a ilação mais generalizada na opinião pública é que ninguém se interessa por um cargo desses à toa, para fazer que o Porto de Santos ou a alfândega funcionem melhor.
E dá também para imaginar que os governantes aceitavam que políticos importantes exercessem influência em áreas estratégicas, como diretorias de estatais, fazendo vista grossa para suas reais intenções. Eram esquemas políticos de corrupção pontuais, mesmo tradicionais e que prejudicavam o andamento dos serviços públicos, subvertendo os valores que deveriam orientá-los.
O desvio de licitações e a formação de cartéis sempre foram denunciados e vemos agora em São Paulo, graças a investigações de autoridades suíças, o desmembramento de um cartel que funcionava até recentemente nos governos do PSDB, desde Mario Covas.
Vários executivos de empresas estatais responsáveis pelos transportes públicos, sejam trens ou metrô, foram indiciados, inclusive os atuais presidente e o diretor de operações da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), Mário Bandeira e José Luiz Lavorente. Apesar de o esquema estar em vigor há muitos anos, não há até o momento nenhuma acusação de que o PSDB montou-o para financiar suas atividades políticas.
O assunto está sendo tratado como um esquema de corrupção tradicional, digamos assim, e o que se deve estranhar é que tenha funcionado durante tanto tempo sem que três governos tucanos notassem.
Ao contrário, no petrolão (e já houve a comprovação disso no mensalão) há indicações de que esses esquemas passaram a ser institucionalizados, e o que era área de influência deste ou daquele político ou grupo político passou a obedecer a um esquema mais organizado de financiamento dos partidos políticos.
O Ministério Público Federal já baseava sua investigação na chance de que parte do dinheiro cobrado por diretores da Petrobras para firmar contratos com empreiteiras investigadas pela Lava-Jato pudesse ter sido repassado a partidos políticos para financiar campanhas.
No documento que baseou as primeiras prisões de empreiteiros, o MPF afirmava que as investigações da PF apontam que as doações para campanhas são "mera estratégia de lavagem de capitais" e que o pagamento de propina teria sido utilizado pelas empreiteiras para "obtenção de vantagem indevida".
Esse esquema foi parcialmente confirmado pela delação premiada do executivo Mendonça Neto, da Toyo Setal, que revelou que verba desviada de uma obra da Petrobras fora transformada em doação legal para o PT, por orientação do ex-diretor da Petrobras Renato Duque, indicado pelo ex-ministro José Dirceu.
A corrupção institucionalizada é um degrau acima na escala da degradação do Estado brasileiro.
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