Cúpula de Fortaleza - MIRIAM LEITÃO
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Cúpula de Fortaleza - MIRIAM LEITÃO


O GLOBO - 13/07

A semana diplomática começa com agenda cheia e presença de líderes poderosos no Brasil. A cúpula de Fortaleza vai tentar dar ao Brics consistência que transforme o grupo em algo mais do que uma junção de letrinhas. São países sem convergências naturais, "uma tribo que só tem cacique", como diz o embaixador Marcos Azambuja, mas que pode vir a ser uma instância relevante.

Em uma entrevista concedida no Rio, jornalistas perguntaram ao embaixador José Alfredo Graça Lima o que, afinal de contas, é o Brics. Ele respondeu que é mais fácil dizer o que não é. De fato, não é uma união aduaneira, ou zona de comércio, nem mesmo um grupo criado por identidades culturais ou proximidades geográficas. Analistas oscilam entre considerar que é apenas um acrônimo inventado por um economista ou o início de uma nova estrutura de poder multipolar.

A economista Lia Valls, do Centro Brasileiro de Economia da FGV, lembra que entre os pontos em comum está o fato de que todos os cinco - China, Índia, Brasil, Rússia e África do Sul - querem maior flexibilização nas organizações financeiras internacionais.

Na reunião de Fortaleza, os países querem dar passos concretos na criação de um banco de desenvolvimento que financie obras de infraestrutura, chamado Novo Banco de Desenvolvimento, e um fundo contingente de reservas para socorrer os países que venham a ter dificuldades no balanço de pagamentos.

Se alguém lembrar das funções do Banco Mundial e do FMI não será mera coincidência. Eles estão começando a criar o que o embaixador Graça Lima chamou de "organizações espelho". Lia Valls acha que eles não querem competir com essas entidades. Nem faria sentido. Segundo Graça Lima, eles não estão "confrontando" mas apenas "suplementando" as entidades tradicionais. Estão também, acho, dando um passo a mais nas reclamações que fazem da viciada estrutura de poder nas instituições criadas no pós-guerra.

A China, por exemplo, gostaria de ter a presidência do Banco Mundial, mas o caduco acordo entre os países que criou as instituições estabelece que Estados Unidos e Europa sempre vão dirigir as duas organizações.

O embaixador Marcos Azambuja, do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), disse que o Brics está ganhando substância porque o G-7 se negou a ser ampliado, o G-20 é grande demais, e as estruturas antigas, muito resistentes às mudanças. "O Brics é uma agenda de oportunidade. A construção de uma afinidade que não é espontânea, mas que eles foram forjando à medida que foram caminhando. Surgiu um espaço para o Brics porque as instituições e arranjos existentes não eram suficientes."

Seja como for, alguma coisa acontece quando se juntam numa reunião líderes como Xi Jiping, o presidente da China que assumiu o poder em 2012, com um mandato de dez anos, o novo primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, que acaba de ser eleito, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, e os presidentes do Brasil e da África do Sul, Dilma Rousseff e Jacob Zuma. A presença de Putin cria um constrangimento. Ele está no meio de uma ofensiva territorial. Anexou a Crimeia e invade território e espaço aéreo da Ucrânia. Putin gostaria que o grupo fizesse críticas às sanções que está enfrentando. E o Brasil tenta não recusar nem aceitar esse pedido, como é típico da diplomacia brasileira.

O embaixador acha que não haverá aqui nenhum endosso implícito às decisões de Putin, mas que a Rússia pós-soviética encolheu demais:

- A astúcia é que Putin age sobre a Ucrânia, que é independente, mas é também muito russa. O Ocidente não conseguiu ainda dar uma resposta. Ele não pode é ir além disso.

A grande novidade do encontro será a presença de Narendra Modi. Ele foi por 13 anos governante do estado de Gujarat, que teve taxas de crescimento muito mais fortes do que as do resto da Índia. Foi eleito derrotando o governo, com o lema do combate à corrupção. Seu partido ultranacionalista hinduísta é visto com temores pelas minorias religiosas indianas, principalmente os muçulmanos, vítimas de tumultos antimuçulmanos no estado que foi governado por ele e que deixou, em 2002, dois mil mortos. Sua exposição internacional é pequena e por isso sua vinda ao Brasil é aguardada até com curiosidade.




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