Por Najla Passos, no site Carta Maior:Mesmo com o atraso de mais de um ano, a primeira reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES) do segundo mandato do governo Dilma Rousseff, realizada nesta quinta (28), no Palácio do Planalto, causou impacto positivo. Pelo menos entre os presentes.
Os 92 empresários, trabalhadores, representantes de movimentos sociais, intelectuais e lideranças de setores diversos que compõem o popular “Conselhão” elogiaram a disposição do governo em voltar a buscar canais de diálogo com a sociedade. “Não há tema interditado para o debate”, garantiu a presidenta.
De acordo com ela, passada a fase mais difícil do ajuste fiscal, o país precisa retomar o diálogo paciente e tolerante. “A conjuntura política, por sua vez, cobra de nós serenidade, disposição para o diálogo e busca de convergências mínimas, sem o que ninguém pode conseguir construir o consenso. Mas é importante também frisar e sublinhar que de ninguém será exigido que abdique ou abra mão de suas convicções, pois são elas que tornam fundamental e básica a diversidade de opiniões que é a riqueza desse conselho”, afirmou.
Dilma Rousseff conclamou os conselheiros que enfrentem especialmente dois assuntos espinhosos, mas que, segundo ela, são imprescindíveis para a retomada do crescimento do país: a volta da CPMF e a reforma da previdência. De acordo com ela, a CPMF é, na avaliação do governo, a melhor medida de curto prazo a ser tomada para reequilibrar as contas públicas, neste momento que ela definiu como excepcional. “Se houver alternativa tão eficiente quanto a CPMF para ampliar, no curto prazo, a receita fiscal, eu e meus ministros estamos absolutamente disponíveis ao diálogo”, desafiou.
Já em relação à reforma da previdência, Dilma foi enfática quanto a sua importância. “Não somos mais o país de jovens que podia se permitir adiar indefinidamente a solução de seus desequilíbrios previdenciários”, justificou. Ela assegurou, entretanto, que é premissa para o debate resguardar direitos já adquiridos e buscar os melhores termos possíveis para as expectativas de direitos. “O grande benefício é a sinalização de que o futuro será estável, de que o futuro terá regras claras e sustentáveis”, argumentou.
Ela também conclamou a todos para que ajudem o país a vencer o desafio de erradicar o mosquito aedes aegypti que, além da costumeira dengue, agora transmite o perigoso zika vírus, causador da microcefalia, que já afeta milhares de brasileirinhos. “Nós precisamos imediatamente combater a microcefalia, protegendo nossas mães, protegendo nossas crianças do mosquito transmissor do zika vírus. Precisamos eliminar o mosquito por todos os meios”, defendeu.
Até R$ 83 bilhões em crédito
Mas o que o setor econômico – que é maioria no órgão - realmente comemorou foi o anúncio de que o governo vai liberar novas linhas de crédito que podem garantir até R$ 83 bilhões a mais na economia. As medidas englobam crédito para infraestrutura (R$ 22 bilhões), setor rural (R$ 10 bilhões), habitação (R$ 10 bilhões), capital de giro para pequenas e médias empresas (R$ 5 bilhões), para a exportação (R$ 4 bilhões) e abertura de refinanciamento para as parcelas do Programa de Sustentação do Investimento (PSI) e do Programa de Financiamento de Máquinas e Equipamentos (Finame) (R$ 15 bilhões), entre outros .
A grande novidade apresentada é a possibilidade dos trabalhadores do setor privado usarem parte significativa do FGTS (um total de R$ 17 bilhões) como garantia em operações de crédito, o que diminuiria o risco e, consequentemente, os juros cobrados. Pela proposta do governo, os trabalhadores poderão dar como caução os 40% da multa rescisória em caso de demissão e mais 10% do valor total depositado no fundo. A ideia é que as parcelas dos empréstimos sejam descontadas em folha, como já ocorre hoje com os empréstimos consignados ofertados aos servidores públicos.
No geral, as linhas de financiamento devem começar a ser disponibilizadas pelos bancos públicos – BNDES, caixa e Banco do Brasil - nos próximos dias, segundo informações de Barbosa. A única que depende de mudança na legislação – e, portanto, aprovação do Congresso Nacional – é justamente a que possibilita a utilização do FGTS como garantia em operações de crédito. Portanto, dependerá também da correlação de forças entre executivo e legislativo, nesses tempos de crise política aguda.
“Nós precisamos normalizar oferta de crédito no país. No ano passado, houve queda real em todas as linhas”, reconheceu o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa. Segundo ele, as medidas anunciadas envolvem várias iniciativas que não irão gerar custos adicionais para o contribuinte brasileiro, porque utilizará apenas recursos já disponíveis. “Vamos usar melhor a liquidez que já existe, gerir melhor os recursos públicos”, explicou.
Pressionado pelos jornalistas na entrevista coletiva que sucedeu o evento, Barbosa garantiu que os novos créditos não irão pressionar a inflação que, segundo ele, decorre do choque de oferta que já está sendo combatido pelo Banco Central. “São recursos [das novas linhas de crédito] que já estão no sistema financeiro, nos bancos públicos. Não são recursos novos que serão injetados no sistema”, reforçou.
O novo “Conselhão”
Criado em 2003, no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o Conselhão reúne representantes da sociedade civil, com o objetivo de assessorar a presidência da república na criação, implementação e avaliação de políticas públicas e reformas estruturais. Apesar do protagonismo conquistado na década passada, foi bem menos utilizado pela presidenta Dilma. Sua última reunião ocorreu há 1,5 ano.
Os 92 membros que tomaram posse nesta quinta são novatos em 70% dos casos. No total, são 47 empresários de setores diversos, como o presidente do Bradesco, Luiz Trabuco, Luiza Trajano, da Maganize Luíza, José Roberto Ermínio de Moraes, do Grupo Votorantin, entre outros. E, também, 45 representantes dos trabalhadores, movimentos sociais, universidades e setores diversos da sociedade civil. Entre estes últimos estão, por exemplo, o ator Wagner Moura e o escritor Fernando Moraes.
Segundo o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, a proposta do governo é que o Conselhão se reúna pelo menos quatro vezes este ano para dar conta da ampla e polêmica pauta apresentada nesta quinta. A próxima reunião está prevista para ocorrer em abril.
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