Por Renato Rabelo, em seu blog:A crise chegava ao impasse político. Estava em xeque a própria governabilidade. Antes, no mês de agosto, de vaticinados agouros, até que a presidenta conseguiu certa trégua, inesperada, mas passageira. O mês de setembro já começou em labaredas, cuja senha utilizada pelas oposições e porta vozes do dito mercado, extremando a crise, foi o rebaixamento do Brasil, segundo decisão da agência americana de risco Standard & Poor’s.
O golpismo chegou açuladamente a formalizar um “roteiro do impeachment” na Câmara dos Deputados, à revelia do fato e sem base jurídica. E numa tentativa ostensiva de detonar o governo e complicar a crise econômica, a oposição em aliança com oportunistas de vários matizes, no Congresso, se encaminhava para derrubar os vetos da presidenta Dilma Rousseff, que neste ato de resistência impedia a vigência das “pautas bombas”.
É nesse auge de tormenta política que a presidenta Dilma na vivência de incessante instabilidade e ameaça crescente, empreende maior esforço de diálogo e debate, levando-a a assumir a recomposição e reorganização de seu governo, na busca de abrir caminho diante de pesada cerração.
A presidenta, desde meados de setembro, foi à luta a fim de conseguir uma maioria parlamentar, decisiva para a governança neste momento. Desse modo procurou recompor e ajustar seu governo que estava defasado diante do contexto da relação de forças políticas, que compunha a própria base do governo, nas condições dadas pelas eleições de 2014, nas quais, cresceram as tendências conservadoras, sobretudo na Câmara dos Deputados.
O “presidencialismo de coalizão” é mais complicado e adverso em tal situação para formação de um governo dirigido pela esquerda. E quando tem sido declinante a confiança da população na presidenta.
Mudar a correlação de forças, resultante de um pleito recente, expressando uma realidade política mais profunda e enraizada, não se muda pela simplesse encontra no centro do poder ação da vontade política, ou mesmo através de ações maiores, massivas, em tempo breve. Mais ainda, na circunstância de esgotamento de um ciclo e tentativa de transitar para novo ciclo de desenvolvimento nacional, num contexto de grande e prolongada crise econômica mundial impactando o país.
Que por sinal, nesse curso de crise, num primeiro momento dá vazão às tendências conservadoras, de direita e de ultradireita, como vem acontecendo na Europa e nos Estados Unidos. E em nosso país, situação que corresponde à esquerda a responsabilidade para sair da crise, porquanto se encontra no centro do poder desde 2003. Em contrapartida o conservadorismo e o reacionarismo extremado se reaglutinam assim, servindo-se dessa situação, para sua volta ao centro do poder.
É óbvio que a busca do êxito nos acordos para nova recomposição do governo tinha que passar principalmente, pela participação do maior líder do partido da presidenta – Luis Inácio Lula da Silva – e do maior partido aliado, o PMDB, seu presidente e suas lideranças. Nas condições dadas não há outra via para restabelecer a coalizão governamental. A presidenta já ganhou a primeira batalha no Congresso para sustentação dos vetos.
O mês de outubro já começa com o abrandamento da crise. A presidenta Dilma assumiu a iniciativa política, alcançando seu principal objetivo: sustentar a governabilidade e possibilitar a estabilidade política. As forças da oposição interessadas tão somente na desconstrução do governo, diante dos primeiros sinais que demonstravam ser a iniciativa presidencial bem sucedida, já afirmavam que Dilma procurava arrastar Lula e o PMDB para o seu meio, no qual estava enredada.
E agora pelas indicações de que o empreendimento aglutinador pode dar certo, a oposição refaz o discurso: diz, a presidenta se manterá sob a “regência do PMDB e tutela lulista”. E o ideólogo mor da oposição, FHC, numa tirada de puro cinismo, afirma que a presidenta “entregou sua alma ao diabo”, para “salvar seu mandato”. FHC “esquece” sua conhecida trajetória, que é quem, realmente, vendeu sua alma aos interesses alienígenas.
Este momento de distensão da crise se completa, por outro lado, pelo continuo desmascaramento da oposição golpista: exibe uma fachada moralista, mas na sua essência é tudo pelo golpe visando sua volta ao governo da República.
Mesmo porque a maioria dos condutores na operação golpista está comprometida, de uma forma outra, nas investigações da Policia Federal e do Ministério Público, em curso, tudo sendo visto com inteira complacência pela mídia dominante, sendo o caso mais saliente, do pretendido aliado de quem eles esperam mais, continuamente citado nas investigações dentro e fora do país, o presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha. Revelando assim qual o verdadeiro “fundamento” do ansiado impeachment – uma saída política à direita, sem base jurídica, que justificasse “institucionalmente” a derrubada da presidenta.
Pois é certo começar pela estabilidade política. Este é o objetivo imediato, para superar o impasse e sustar a ameaça golpista permanente. Por isso é também a premissa para a estabilidade na economia, e transição de novo ciclo político, econômico e social, compreendido pela estratégia de retomada do projeto de desenvolvimento nacional, democrático e soberano, garantidor do progresso do social, na etapa atual.
Nesse sentido, esse é o caminho que se impõe para recomposição e reforço do liame com ampla base social que respalde o governo.
Em tal situação de crise geral e de acirramento político, dá-se um embate, por um lado, onde as forças conservadoras e antidemocráticas detêm importantes parcelas de poder de Estado e procuram manter uma linha ofensiva e agressiva pela blindagem de seus privilégios.
Por outro, para virar a disputa para o lado do avanço democrático e defesa de maiores conquistas sociais, depende de crescente organização dos trabalhadores e camadas populares por seus direitos, não bastando somente isso, mas indo além, na elevação da consciência política por um Estado realmente democrático e avanço da nação por maior conquista civilizacional.
A alternativa que possa concretizar esse propósito deve resultar pelo diálogo constante e o debate, que passa pela mobilização popular e impulso à presidenta da República.
Tem esse sentido a organização da Frente Brasil Popular (FBP). É uma importante iniciativa que congrega partidos, organizações sindicais e sociais, lideranças de vários setores, intelectuais, que comungam de afinidades de esquerda e progressista. É justo que essa Frente debata e apresente alternativas para a crise, ou busque “mudança da política econômica”. O que não podemos confundir é o que é emergencial, e merece ação imediata para barrar a avalanche golpista em curso. As divergências não devem estar no primeiro plano agora. Derrubar a presidenta somente ganha as forças conservadoras e toda direita, seria um grande retrocesso para o avanço civilizacional do país.
No entanto a questão de uma alternativa viável, um projeto para um novo ciclo de desenvolvimento nacional, diante do patamar alcançado pelo país, envolve um conjunto de questões que demandam reformas estruturais democráticas e justa estratégia de crescimento econômico para o Brasil de hoje, domínio dessa realidade própria.
Deve constar de uma saída financeira e econômica soberana em relação ao domínio da oligarquia financeira global, voltada para os interesses do povo e da nação. Por isso, exige duro e, provavelmente, prolongado embate político e econômico, não cabendo assim, por mais bem intencionada que seja guinada rápida e voluntarista, ou pretensas soluções definitivas para alcance do êxito.
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