Egito em clima de guerra civil
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Egito em clima de guerra civil


Fonte: O GLOBO

Rodrigo Constantino

Deu no GLOBO: Dezenas de mortos em confrontos entre partidários de Mursi e soldados no Cairo

As Forças Armadas egípcias confrontaram com violência partidários do presidente deposto Mohamed Mursi que protestavam no Cairo. Segundo o Ministério da Saúde, os confrontos na madrugada deste sábado deixaram 38 mortos, todos civis, mas a Irmandade Muçulmana, aliada de Mursi, afirma que o número de vítimas é superior a 200, além de mais de 4 mil feridos.

De acordo com Gehad al-Haddad, porta-voz da Irmandade, os confrontos foram iniciados antes da primeira oração do dia, por volta das 4h (23h de sexta-feira no horário de Brasília). Milhares de islâmicos que faziam vigília em uma mesquita no bairro de Medina Náser tentaram bloquear a ponte Seis de Outubro, uma das principais do Cairo e que atravessa o Rio Nilo, o que levou a uma reação da polícia.

— Eles não estão atirando para ferir, estão atirando para matar — disse al-Haddad.

Não há ainda versão oficial detalhada de eventos, mas as autoridades dizem que eles usaram apenas gás lacrimogêneo para dispersar os manifestantes. No entanto, fontes do hospital confirmaram que a maioria das vítimas morreu de ferimentos de bala. De acordo com várias testemunhas, a batalha era claramente desigual, a polícia com armas de fogo, enquanto a maioria dos manifestantes estavam armados apenas com paus e pedras.

Os líderes da Irmandade Muçulmana acreditam que a verdadeira intenção da polícia foi expulsar à força partidários de Mursi que estavam acampados em torno da mesquita de al-Audawiya Rabá, o principal foco de protestos.

Poucas horas antes do massacre, o ministro do Interior, Mohamed Ibrahim, disse que ao jornal estatal “Al Ahram” que o governo "vai acabar em breve de forma legal" com os protestos de islamitas, referindo-se especificamente às manifestações que ocorrem perto da mesquita. Ibrahim justificou a medida tendo em vista as reclamações e denúncias feitas por moradores e disse que o Ministério Público iria emitir uma ordem de desocupação, o que ainda não aconteceu.

Médicos de um hospital de campanha afirmaram à rede de televisão al-Jazeera que 75 pessoas foram mortas perto da mesquita.

O derramamento de sangue acontece um dia depois de apoiadores e opositores de Mursi terem participado de comícios rivais em todo o país, com centenas de milhares de pessoas nas ruas.


Não podemos ignorar que Mursi contou com amplo apoio popular no começo, e com os aplausos do governo americano também. Mas este parecia não querer enxergar que o conceito de "democracia" para os seguidores de Mursi era bem diferente do nosso conceito de democracia ocidental. Para a Irmandade Muçulmana, ela não passava de um instrumento para impor a sharia - a lei islâmica - a todos. 

Quando isso começou a ficar mais claro, boa parte da população do Egito tomou as ruas pedindo sua cabeça. Mas ainda há enorme parcela que deseja justamente isso. Daí o confronto inevitável. O Egito, como a Turquia e outros países da região, está em plena disputa para ver se há alguma chance de um governo democrático e eleito que seja mais secular, ou se somente regimes autoritários são capazes de segurar o ímpeto do fanatismo religioso, como tem sido nas últimas décadas.

Muitos "progressistas" acharam que era possível e até sonharam com uma grande revolução democrática nesses países, celebrando a "Primavera Árabe" como celebram a Revolução Francesa. Esqueceram como esta terminou: com sangue e terror, levando a uma ditadura. Talvez seja cedo demais para achar que os próprios povos islâmicos querem algo que se assemelhe aos modelos ocidentais de tolerância religiosa. 

Recomendo a leitura da resenha que diz do livro Spring Fever, de Andrew McCarthy. A "democracia islâmica" no Oriente Médio pode ser apenas uma ilusão ocidental, fruto de um desejo muito grande de crer que os anseios populares por lá são semelhantes aos dos próprios indivíduos que vivem na civilização ocidental. Não são!




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