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Falta de clareza - CELSO MING
O Estado de S.Paulo - 02/10
Difícil saber o que é pior: a forte deterioração das contas públicas ou a insistência do governo (e também do Banco Central) em negá-la, apesar das evidências em contrário?
Os números oficiais divulgados segunda-feira mostram um agosto desastroso. É o pior da série histórica, reconheceu o chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Tulio Maciel.
Apenas para comparar, em agosto do ano passado houve sobra (superávit primário) de R$ 3,0 bilhões. Neste ano, o rombo é de R$ 432 milhões. No acumulado dos oito primeiros meses, em 2012, o superávit foi de 3,56% do PIB; neste ano, o superávit é bem menor, de apenas 1,73% do PIB.
Não fossem receitas excepcionais com dividendos pagos por estatais, o rombo fiscal de agosto saltaria para acima de R$ 4,5 bilhões.
Esses cálculos não incluem as despesas com juros da dívida. Se incluídas, o déficit nominal de janeiro a agosto saltou para R$ 109,3 bilhões ou 49,1% acima do apresentado no mesmo período em 2012.
Quando fala em dívida, o governo prefere ater-se à dívida líquida, porque desconta as reservas que estão aplicadas em dólares. Com a alta da moeda americana no câmbio interno, o efeito em reais deixa a dívida líquida aparentemente mais baixa em relação ao PIB, em 33,8% (veja o gráfico). A dívida bruta continua muito elevada, em 59,1% do PIB, e ameaça a perda pelo Brasil do grau de investimento dos títulos públicos, o que encareceria a dívida.
Não é sincero o governo, especialmente as autoridades da Fazenda, quando afirma que não há nada de errado nas contas públicas. Como acontece com outras metas, as fiscais não são cumpridas. O governo promete uma coisa e entrega uma fração. Mas vá lá: a gente está tão acostumado com distorções desse tipo que acaba achando normal que o governo esconda coisas ou as pinte com cores luminosas.
Mas quando é o Banco Central, que tem um corpo técnico de respeito, que assume um discurso ininteligível para favorecer o governo, então, o que já não era lá confiável ganha ares suspeitos.
Depois de passar meses falando e escrevendo que as contas públicas estavam excessivamente expansionistas, o Banco Central deu de afirmar que "estão criadas as condições para que, num horizonte relevante para a política monetária, o balanço do setor público se desloque para a zona de neutralidade", ou seja, deixará de produzir inflação. Em nenhum momento ficou demonstrado como o Banco Central chegou a essa conclusão. As razões pelas quais vai empurrando esse novo "acredite se quiser" também não estão claras.
O resultado das contas públicas diz o contrário. A perspectiva de um ano eleitoral, com os trens da alegria que em geral vêm junto, também. E o diretor de Política Econômica do Banco Central, Carlos Hamilton Araújo, reconhece que "há muito trabalho a ser feito pela política monetária (política de juros)" para conter a inflação. Quer dizer, se a política monetária tem de forçar é porque não tem colaboração da política fiscal.
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