Globo, ditadura e a autodefesa

Em editorial, o jornalão da família Marinho, O Globo, trouxe uma peça exemplar do reacionarismo brasileiro e do comportamento do conglomerado Globo de comunicação ante a iminência de nossa verdade histórica sobre o golpe de 64 e a ditadura, a cada dia mais patente. História que eles não apenas conhecem, como a escreveram, ao lado da reação, do conservadorismo nacional e dos militares.

Neste editorial, O Globo afirma considerar um “desatino” a revogação da Lei de Anistia (é, dessa com caráter recíproco!) e a punição dos militares, e que isso poderia causar problemas políticos. Em sua visão, “é mesmo importante descobrir o paradeiro de corpos e identificar responsáveis – sem fins judiciais”.

O Globo afirma, ainda, que a Comissão Nacional da Verdade (CNV), para ser isenta, deveria investigar os crimes dos dois lados – o velho bordão da direita, como se não fossem eles os responsáveis pela usurpação da vida democrática do país. De quebra, O Globo pede cautela no tratamento da questão: “os comandantes devem atuar para conter arroubos, porque eles não contribuem para manter a serenidade necessária no tratamento do assunto”.

“E também não cabe qualquer pedido de desculpas dos militares, pois já é evidente o reconhecimento de erros pelo Estado. O passado tem de ser conhecido para que não se repita no futuro. Mas sem revanchismos, como prevê a anistia”, conclui o editorial.

“Globo expressa medo”

Em entrevista ao nosso blog, Altamiro Borges, coordenador do Centro de Mídia Alternativa Barão de Itararé, analisou o editorial de O Globo. Como vocês sabem, Miro acompanha, como ninguém, os debates na mídia. Recentemente, aliás, ele escreveu um interessante artigo questionando: “Comissão da Verdade convocará a Globo?” (leia aqui a íntegra).

Para Miro, neste editorial, “(o conglomerado) Globo não está só defendendo os militares que torturaram e assassinaram os militantes durante a ditadura militar. Está, na verdade, se autodefendendo”. Ele lembra que todo o sistema Globo foi um dos apoiadores e defensores do regime militar. Em sua visão, por este editorial, fica claro que a Globo “está com medo” das investigações.

“Nós temos que investigar e fazer conhecer a todos a nossa verdade histórica. E isso doa a quem doer, inclusive a Globo”, aponta Miro. Ele também ressalta que até hoje “ninguém se convenceu” com aquele editorial dela fazendo uma autocrítica ao golpe. ”Aquele editorial não foi uma autocrítica, foi uma tentativa de justificar o golpe”.

“E agora ela vem dizer que a Comissão não investigue os casos? Vamos dar anistia aos torturadores e assassinos do regime militar?” questiona Miro. Ele também rechaça a teoria dos dois lados, lembrando que quem participou da luta contra a resistência à ditadura militar “já pagou tudo”.

“Aqueles que foram presos e exilados pagaram e muito. Tiveram de ficar exilados de pátria, de suas famílias, sobreviveram à ações antidemocráticas sob um regime de terror. Quem participou da luta da resistência já pagou tudo. Muitos com a própria vida pagaram pelo seu ato de bravura, pelo seu patriotismo, pelo seu ato democrático. Agora, quem não pagou até hoje foram os milicos e a Globo. A Globo está devendo. Esse editorial expressa o medo dela”, conclui.