Ideologia e os interesses do mercado imobiliário - LUIZ FERNANDO JANOT
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Ideologia e os interesses do mercado imobiliário - LUIZ FERNANDO JANOT


O GLOBO - 31/08
Na primeira metade do século XX, o mundo ocidental caminhava de braços dados com o racionalismo científico, impondo suas verdades absolutas.
Diante desse contexto, o dramaturgo italiano Luigi Pirandello escreveu uma extraordinária peça teatral - "Assim é se lhe parece" - com a intenção de relativizar qualquer postura dogmática que cerceasse a livre expressão do pensamento.

Infelizmente, essa e outras iniciativas semelhantes sucumbiram diante do obscurantismo político dos Estados totalitários.

De lá para cá muita coisa mudou. O restabelecimento da democracia trouxe consigo a rejeição a qualquer espécie de absolutismo. Nem mesmo os princípios do urbanismo modernista escaparam desse processo revisionista. A reflexão crítica sobre esses paradigmas possibilitou a formulação de novas teorias e modelos de desenvolvimento urbano. Todavia, se aplicados indiscriminadamente em qualquer cidade, certamente, irão reproduzir equívocos semelhantes ao criticados anteriormente.

Para se perceber o quanto é inadequado um modelo urbano único, basta observar nas cidades espalhadas pelo mundo a grande diversidade social, econômica, cultural e política, especialmente na China, na Índia e, sobretudo, no continente africano. Há que se admitir que a construção de uma cidade democrática não é fácil em sociedades autocráticas ou individualistas.

Entre as recentes teorias do urbanismo contemporâneo a que mais tem se destacado é a que propõe a formação de cidades mais densas, mais compactas e, consequentemente, mais sustentáveis.

Isto é, uma cidade que concentre um número significativo e diversificado de usos e atividades em territórios delimitados. No Brasil, o emprego desse modelo vem sofrendo pressões contrárias de alguns grupos empresariais que preferem expandir seus negócios imobiliários em áreas dotadas de grandes terrenos disponíveis e a preços mais vantajosos, independentemente da existência ou não de infraestrutura urbana no local.

O Rio, por exemplo, segue esse modelo ao expandir o seu tecido urbano ao sabor da ideologia política e dos interesses do mercado imobiliário.

A tendência de estabelecer, no futuro, uma nova centralidade urbana na Barra da Tijuca, ao que tudo indica, parece irreversível. A concentração de grandes investimentos públicos e obras da iniciativa privada nessa região confirmam tal pressuposto. É para lá que convergem praticamente todos os novos sistemas de transporte coletivo - BRT e expansão do Metrô - implantados ou projetados para a cidade. A reurbanização total da Avenida das Américas é uma parte indissociável desse processo.

O modelo urbano baseado no trinômio "condomínio fechado/shopping center/automóvel particular", característico da Barra da Tijuca e seus arredores, vem recebendo a aceitação de uma parcela significativa da população. Afinal, quem não trocaria os espaços públicos degradados, o triste cenário de casas abandonadas e o comércio decadente pelos espaços organizados, seguros e cheios de atrativos dos condomínios residenciais fechados e dos shopping centers? É próprio da natureza humana que cada indivíduo busque para si o que há de melhor. Quanto maior diversidade houver, melhor será a opção de escolha.

Em suma, as cidades contemporâneas não comportam modelos hegemônicos de urbanização.

Especialmente o Rio, onde predominam os espaços urbanos diversificados. Respeitando essa característica da cidade, não há como relegar ao abandono importantes bairros cariocas.

Principalmente aqueles servidos por trem ou por metrô. Chegou a hora de se concentrar investimentos públicos nessas localidades para promover a requalificação urbana, atrair novos investidores e elevar a autoestima dos seus moradores.

É inadmissível que uma cidade culturalmente diversificada como o Rio conviva com um modelo único de ocupação e desenvolvimento urbano.




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