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Igreja ataca a pedofilia - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE
CORREIO BRAZILIENSE - 19/01
Um dos maiores pesos sobre o pontificado de Bento XVI e dos principais desafios do papa Francisco, a questão da pedofilia começa a ser posta às claras pela Igreja Católica. Primeiro, o Vaticano, de forma inédita, enviou representantes à ONU para falarem oficialmente sobre os abusos cometidos por membros do clero, em audiência no Comitê das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança. Depois, no mesmo dia, o pontífice, em espécie de mea-culpa, aproveitou a homilia na residência de Santa Marta para declarar que os autores de abusos "não têm ligação com Deus". Sua Santidade preferiu não "mencionar isoladamente" os escândalos que envolvem a Santa Sé - também há denúncias de corrupção -, mas condenou a todos eles como uma "vergonha".
Ainda que seja pouco, pior era a prevalência de silêncio então obsequioso, não raro acompanhado de medidas de proteção a suspeitos, como a transferência de acusados para paróquias distantes das supostas ocorrências, retirando-os do olho do furacão. Tampouco seria suficiente deixar as investigações por conta da Justiça comum - atitude popularmente conhecida como "lavar as mãos", expressão inspirada pela atitude de Pilatos no relato bíblico do julgamento de Cristo. Agora, diferentemente da postura anterior, o Vaticano manifesta mais disposição de colaborar. É esse o entendimento explicitado pelo depoimento do observador da Santa Sé na ONU, o arcebispo italiano Silvano Tomasi, que reconheceu, no Comitê sobre os Direitos da Criança, o horror dos abusos sexuais.
Outro representante católico presente, o monsenhor Charles Scicluna, ex-promotor da Cúria para a análise de denúncias de crimes sexuais, admitiu a lentidão do Vaticano e defendeu não ser tarde para mudar. De fato, evoluções positivas são bem-vindas em qualquer tempo. Condenável seria continuar a protelar a tomada de decisões que representem claro enfrentamento do problema. Mais ainda quando a fé cristã vinha sendo vilipendiada por transgressores de batina abrigados pela instituição que se propõe a combater o mal e a iluminar as trevas. Aliás, é esse papel de lanterna da humanidade que o argentino Jorge Mario Bergoglio tem sinalizado estar disposto a exercer desde que passou a ocupar o trono de Pedro.
Pode-se argumentar que, ainda sob Bento XVI, a posse de pornografia infantil passou a ser considerada delito. Isso, em meados de 2010. Três anos depois, Francisco foi mais longe, ao assinar o decreto "Motu Proprio", agravando as penas por pedofilia. Agora, a Igreja presta satisfações à ONU e, por tabela, à comunidade internacional. Não poderia ser diferente. Para além de razões religiosas, morais e humanitárias, há impedimentos legais para que a Cúria romana oculte sacrilégios tratados como crimes pelos civis. Em especial na condição de signatária da Convenção sobre os Direitos da Criança. E a "vergonha" não é pequena: de 1960 a 1980, cerca de 600 denúncias anuais de abuso sexual foram levadas ao Vaticano.
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