Líbia vista do Egipto
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Líbia vista do Egipto


Estou no Cairo, numa delegação do PE, a reunir com todos os que contam hoje aqui politicamente.
Durante a noite, vi as cadeias de televisão internacionais (incluindo a RTPi, talvez porque, dizem-me, o Manuel José treinador do Benfica local mora neste mesmo hotel) propagar a ideia de que o Secretário-geral da Liga Árabe teria criticado a intervenção militar na Líbia por ir além da imposição da "no fly zone".
Ora nada disso se passou. As declarações de Amr Moussa foram tomadas ao fim da manhã de ontem, à saída de uma reunião com a nossa delegação. O Secretário-geral, solicitado por jornalistas a comentar a primeira intervenção militar na Líbia, em cumprimento da decisão 1973 do Conselho de Segurança da ONU, limitou-se a enunciar os termos em que a Liga Árabe tinha apelado e apoiado a imposição de uma "no fly zone" sobre a Líbia: para proteger civis dos ataques das forças de Kadhafy - e não, obviamente, para os bombardear. E frisou também não ter relatos de que civis tivessem sido afectados (o que provavelmente fora lançado pelo perguntante).
Não obstante esta declaração ter sido transmitida na integralidade pela Al Jazeera, nas mais das vezes e nas outras cadeias passou apenas a primeira parte, mais o "spinning" de que a Liga Árabe estava a criticar a intervenção militar na Líbia.
Ora lá dentro, na reunião connosco, já Amr Moussa e todos nós sabíamos e comentámos os resultados da primeira noite de intervenção militar, e não houve crítica ou desconforto perante a intervenção. Pelo contrário, Amr Moussa deu-se até ao trabalho de sublinhar a importância e o passo inédito de a Liga Árabe ter suspendido o regime líbio por "maltreatment of the people" e de depois ter apelado à imposição da "no fly zone" pelo Conselho de Segurança.
Saímos da Liga Árabe para a Praça Tahrir por uma porta lateral, porque havia uma manifestação de uma centena de pessoas em frente da entrada principal. De protesto sobre a intervenção internacional na Líbia? Qual quê!!! Era de indignação perante a falta de acção da Liga Árabe face à repressão assassina do regime de Saleh sobre o povo em revolta no Yemen!
Cruzámos a Praça Tahrir a pé, calmamente, entre miúdos que brincavam, homens e mulheres que descansavam, liam jornais ou passeavam pelas bancas de venda de legumes, quinquilharia e bandeirinhas egípcias.
Cruzámo-la diversas vezes mais durante o dia.
Só nos deparámos com mais uma manifestação, numa rua perto, ao entrar no edifício do gabinete do Primeiro-ministro: em frente, estariam umas trezentas pessoas, vítimas de tortura pelo regime de Mubarak, que pediam justiça.
PM e MNE egípcios manifestaram esperança que a intervenção na Líbia acabasse rápido com o problema que estava a fazer afluir cada vez mais refugiados à fronteira, que devolvia a um Egipto já economicamente em dificuldades egípcios sem trabalho e sem recursos e que mantinha em perigo as vidas de mais de um milhão de egípcios encurralados na Líbia.
Desde manhã cedo, à tarde, e à noite, fomos tendo encontros com dezenas de representantes da sociedade civil e de activistas mobilizadores das manifestações da Praça Tahrir e de partidos políticos. Jovens, mulheres, intelectuais, artistas, sindicalistas, incluindo a direcção da Irmandade Muçulmana - não ouvimos ninguém criticar a intervenção na Líbia, e quase ninguém a referir sequer. Apenas uma mulher, representante da organização feminista transnacional Karama, nos disse: "Pela primeira vez, vi-me a desejar e vejo-me a apoiar uma intervenção militar estrangeira num país árabe. Queira Allah que não me venha a arrepender!"Esta foi a mais vocal expressão de dúvida que ouvi no Egipto sobre a intervenção militar internacional na Líbia (e eu subscrevo as preocupações subjacentes, inteiramente).
Contrasta bem com o que está ser propagado através dos media internacionais.
Estamos diante de uma flagrante manipulação mediática. Não só sou eu que a vejo: Jonhatahan Head, repórter da BBC ainda há pouco desmentia que houvesse comoção no Egipto sobre os ataques aos comandos de Khadafy. Porque vejo a manipulação, sinto-me na obrigação de a denunciar. Aqui fica a denúncia.




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