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Mantega tem "trunfos" para garantir superávit - CLAUDIA SAFATLE
VALOR ECONÔMICO - 21/02
Meta fiscal é neutra para o controle da inflação
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, guardou cartas na manga para cumprir a meta de superávit fiscal anunciada ontem, de 1,9% do Produto Interno Bruto (PIB), mesmo se tiver que arcar com uma conta salgada de energia ou, ainda, se tiver que ajudar no cumprimento do superávit previsto para os Estados e municípios.
Se vier a conta de energia, vamos fazer um esforço adicional e resolver isso , assegurou ele a esta coluna. O governo conta com receitas de aumento de impostos que Mantega não explicitou. Fontes oficiais indicaram pelo menos duas propostas que já estão na Casa Civil e podem render mais de R$ 2,5 bilhões este ano: a equiparação da tributação das importações ao que paga o produto nacional para compensar a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que julgou inconstitucional a inclusão de ICMS e PIS-Cofins na base de cálculo dessas contribuições sobre a importação; e a extensão da taxação que hoje é feita só nas fábricas também para as empresas distribuidoras de cosmésticos.
Mantega adiantou que negocia com o Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat) para que este aprove mudanças, neste ano eleitoral, das regras de concessão do seguro-desemprego e do abono salarial. Ambos os gastos tiveram crescimento acelerado e chegaram a R$ 46,56 bilhões em 2013. Segundo ele, o Codefat pode impor algumas restrições com efeitos nas contas deste ano.
Para uma expectativa de arrecadar R$ 12 bilhões com os leilões de concessão da telefonia celular 4G, o decreto de contingenciamento só contou com R$ 7,5 bilhões. Sobraram, portanto, R$ 4,5 bilhões, citou ele.
Temos trunfos. Temos como garantir a meta e vamos persegui-la tenazmente, no corpo a corpo , assegurou o ministro. Se for preciso, ele poderá reabrir o Refis, embora tenha dito que não conta com essa hipótese no momento. Técnicos indicaram que essa iniciativa poderia agregar uns R$ 5 bilhões às receitas deste ano.
Fomos conservadores nas estimativas de receitas , assinalou ele. Houve moderação também na previsão de superávit dos Estados e municípios - 0,35% do PIB - e o ministro espera que eles cumpram essa meta, porque as torneiras do endividamento para governadores e prefeitos está fechada desde o fim de 2013, disse. A redução das despesas obrigatórias será possível, porque, segundo Mantega, foram estimadas desonerações e subsídios na proposta original do Orçamento que não se materializaram.
Nas discussões dos últimos dias na junta orçamentária, contou ele, chegou-se a considerar a adoção da meta de 2,1% do PIB de superávit primário. Mas seria uma carnificina , comentou. Optou-se por uma decisão mais realista, mais pés no chão, que fosse crível para os agentes econômicos. As primeiras reações do mercado ao anúncio foram positivas. Os juros recuaram - devolvendo um pedaço do prêmio de risco -, a bolsa reagiu e a taxa de câmbio valorizou-se. Até então os analistas contavam com um superávit primário de 1,4% do PIB para este anjo, segundo a pesquisa Focus.
Foi, assim, um passo importante para tentar reverter o mau humor e o desânimo dos investidores nacionais e estrangeiros com o Brasil. O mercado aprovou, mas vai conferir mês a mês se a execução das contas públicas está de acordo com os compromissos assumidos pelo governo.
Segundo as projeções oficiais a meta fiscal deve garantir a estabilização da dívida bruta como proporção do PIB (de 57,2% em 2013 para 57,1% este ano) e da dívida líquida (de 33,8% para 33,6%).
A expectativa do governo é que a resposta aos temores dos agentes econômicos, dada ontem com o anuncio da meta, seja suficiente para evitar o rebaixamento do grau de investimento do país pelas agências de rating, sobretudo pela Standard & Poor s.
Mantega foi comedido na resposta sobre o rebaixamento do país: Não sei se [a meta fiscal] afasta esse risco. Nós estamos fazendo o que podemos fazer.
Além de deixar pendente a conta de energia decorrente do uso das usinas térmicas, cujas estimativas variam de R$ 12 bilhões a R$ 18 bilhões, o programa fiscal exposto no contingenciamento de R$ 44 bilhões considerou como premissa um crescimento de 2,5% do PIB este ano. A desaceleração da atividade está se mostrando rápida e a expectativa de técnicos do governo é que haverá uma convergência do mercado para uma expansão de 1,5% do PIB este ano. Começam a aparecer, inclusive, estimativas de taxas mais modestas de crescimento, abaixo de 1%.
Uma eventual perda de arrecadação decorrente da desaceleração econômica poderia ser compensada por uma inflação maior do que os 5,3% projetados no decreto de contingenciamento resultando em um PIB nominal mais realista.
Tudo resolvido não está e nem se espera uma onda de otimismo daqui por diante. Evitamos tomar um gol relâmpago , comentou uma alta fonte. Levar um gol contra nos primeiros segundos do jogo se caracterizaria por uma fuga de capitais, forte desvalorização cambial e mais pressão inflacionária em uma economia que está em franca desaceleração. Era isso que estava aparecendo nos painéis de controle da economia do país.
A meta de superávit primário para este ano é neutra do ponto de vista da demanda. Ela não vai prejudicar, mas também não vai dar grande ajuda ao controle da inflação, segundo avaliação da área econômica do governo. Confirma, assim, o que o Banco Central havia colocado na ata do Comitê de Política Monetária (Copom) de setembro, quando, pela primeira vez, mencionou que a política fiscal poderia vir a ingressar na zona de neutralidade e foi muito criticado.
Fontes oficiais lembraram, também, que a inflação está se comportando tal como previsto no último relatório trimestral de inflação, de dezembro. Ou seja, o IPCA tende a ficar comportado nos dois primeiros trimestres, mas sobe a partir do terceiro trimestre, podendo chegar próximo ao teto da meta, de 6,5%.
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