MEUS CONFLITOS COM O CHOCOLATE
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MEUS CONFLITOS COM O CHOCOLATE


Admito que meu relacionamento com o chocolate tem mudado através dos tempos. Eu sempre fui viciada, chocólatra mesmo, mas minha relação com meu único vício ficou muito tumultuada em 2006. Ou seria 2005? Não sei, só sei que vários fatos desagradáveis aconteceram ao mesmo tempo. Primeiro que o meu fígado pediu água. Após um final de semana mais excessivo, ele disse que assim não iria continuar a me aguentar. É péssimo quando isso ocorre. Eu nunca fui hospitalizada nem nada do gênero, mas passo mal. Fico com ânsia, dor de cabeça, dor de estômago, tudo junto. Às vezes até minha visão fica turva. Essa é a minha overdose e a minha ressaca. E eu amo chocolate, mas odeio passar mal. Bem próximo dessa overdose que durou mais do que devia (quase uma semana! Geralmente passa em dois dias), eu quebrei um dente comendo chocolate. Décadas e mais décadas comendo chocolate e de repente eu faço croc e o meu dente faz crec, ou vice-versa. E, pra registrar de vez o meu inferno astral chocolatal, eu... eu... ai, é horrível demais pra contar. Não é seu horário de almoço, é? Bom, digamos que fui abrir uma barra de chocolate e vi um pozinho. Decidi investigar antes de dar a primeira mordida, e o que encontro? Uma minhoquinha. Um verme amarelo, dentro da barra! Aquilo foi tão nojento, ó deuses maias! Ah sim, definitivamente foi em 2005. Agora lembro porque sei que contei pra uma turma de inglês e alguns aluninhos adolescentes super fofinhos ficaram brincando comigo o semestre todo. Sabe, contando piadas do tipo “O que é pior que encontrar uma minhoca no seu chocolate? Encontrar meia minhoca no seu chocolate! Hahahahaha!”. Eu jogava livros em cima deles, mas eles não paravam. Verminho no chocolate dos outros é refresco.
O pior é que essa situação do chocolate vivo aconteceu duas vezes no mesmo semestre. Foi um sinal. A primeira foi um chocolate com amendoim da Garoto que comprei num supermercado perto de casa. Não recomendo comprar chocolate em mercados pequenos, bares ou padarias. As barras têm pouca saída, ficam na prateleira durante meses, e o chocolate pode tomar vida. Também devo reconhecer que geralmente a culpa disso é do amendoim, não do chocolate. As três vezes na minha vida que essa coisa terrível aconteceu foram todas com chocolate com pedaços de amendoim. Uma foi quando eu era bem nova, e trabalhava como secretária do meu pai. O nível de chocolate no meu sangue ficou baixo e eu mandei meu amado pai largar qualquer coisa sem importância que estava fazendo e sair pra comprar uma barra de chocolate. O escri dele era na Av. Pamplona, quase esquina com a Paulista, e o mais próximo era um boteco. Ele voltou esbaforido com uma barra, na época em que as barras ainda tinham 200 gramas. Eu fui abri-la e havia um bichinho! Meu amado pai quase chorou comigo. Nesta ocasião de 2005 foi parecido: chocolate com pouca circulação, amendoim... Reclamei no supermercado, exigindo meu dinheiro de volta, e eles, desconfiados, pediram pra ver o chocolate. Até parece que vou guardar chocolate bichado! Eles que façam criação de verminhos em chocolate!
Num período próximo de 2005 eu comprei chocolate, também com amendoim, mas num supermercado grande, o Big. A marca era Big, mas é só olhar no rótulo e você vê que é da Neugebauer. E os mesmos sintomas: pozinho e minhoquinha (felizmente, antes do chocolate chegar perto da minha boca). Escrevi uma carta a Neugebauer (acho até que enviei fotos), e eles pediram desculpas, falaram do rígido controle de qualidade, e juraram que o problema estava no armazanamento do chocolate, não na produção. Ou seja, a culpa era do Big, e os tabletes foram recolhidos. De toda forma, a fábrica me enviou uma caixa com umas cinco barras de chocolate, que foram devidamente devoradas, após cuidadosa análise. Nós viciados não conhecemos o fundo do poço. Eu lembro da cena de Farrapo Humano, quando o Ray Milland, desesperado, tenta vender seu instrumento de trabalho, sua máquina de escrever, pra poder comprar álcool. Não é à toa que o maridão me chama de “meu farrapinho”.
Mas quero fazer aqui a defesa do chocolate como instituição. Num cálculo conservador, cheguei à conclusão que, durante a minha vida, devo ter comido umas 3,300 barras. Vamos considerar que comecei a comer chocolate aos 8 anos (acho que foi antes de eu começar a engatinhar, mas pra efeitos estatísticos, vamos dizer 8), numa média de cem barras por ano. Houve épocas em que comia chocolate todos os dias (tempos felizes) e épocas em que só comia chocolate nos finais de semana (fins de semana felizes). Mas vamos chutar cem barras por ano, durante 33 anos (meu 42o ano de vida está apenas começando), e dá umas 3,300. Pouco, se você for pensar bem. Dessas 3,300, só três tinham bicho dentro. Qual a porcentagem? 0,1%. É isso, né? Ou chocolate em excesso prejudica as funções matemáticas?
Agora pense num pimentão. Pelas minhas contas, de cada vinte pimentões que corto, um tem verminhos dentro. Todo mundo com quem eu falo diz que não é assim, que eu tô de marcação com o pimentão, e que eles nunca encontraram bichinho dentro de pimentão. Não é minha culpa que eles não sejam observadores. Que los hay, los hay. Então a incidência, cientificamente falando, de bichinhos no pimentão é de 5%. Contra 0,1% dos bichinhos no chocolate. Conclusão lógica? Chocolate é um alimento muito mais saudável que pimentão! (e não vou nem falar de outros vegetais, verduras e frutas que quase sempre vêm com o bônus-surpresa do bichinho. Nessas horas eu penso em vestir uma camiseta do tipo “I love agrotóxicos”).
Depois desses tristes incidentes com o chocolate, eu jurei abstinência. E fiquei uns seis meses sem colocar uma só gota de chocolate na boca. Eu me imaginava indo a reuniões de Chocolátras Anônimos e dizendo: “Olá, meu nome é Lola, e faz cinco meses, três semanas, dois dias e sete horas que não como chocolate”. E todo mundo respondendo, solidário: “Olá, Lola”. Quando voltei a comer chocolate (porque vi que, sem chocolate, minha vida era nublada e sujeita a chuvas e trovoadas), foi bem pouquinho, uma barra por semana. Até ir pros States e toda minha alimentação balanceada ir pras cucuias (lá tinha saco de M&Ms de um 1 quilo por 8 dólares!). O maridão jura que várias fábricas de chocolate do Sul faliram durante a minha ausência.




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