MOTEL FULEIRO É COM A GENTE
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MOTEL FULEIRO É COM A GENTE


Outro motivo pra eu me identificar com a Sandra, a mulher que desapareceu durante cinco dias após se encontrar com um estranho no metrô paulista, é na sua descrição do motel. Como ela disse, eles dormiram “como marido e mulher” (o que, no meu caso, significa o maridão roncando, segurando o controle remoto da TV com toda sua força, e eu sem poder me mexer porque tem dois gatos em cima de mim. Gatos da espécie felina, bem explicado) num quarto de motel fuleiro. Ah, já passei por essa!
Eu tinha uns 22 aninhos e estava trabalhando pro Ibope, fazendo pesquisa de mercado. Não lembro o produto que estava testando (desodorante? Perfume? Lâmina de barbear?), mas agora, pensando bem, constatei mais uma semelhança entre Sandra e eu (além de ter o metrô da estação Sé como cenário desagradável, ou de frequentar motéis fuleiros): ela mora perto de Congonhas. E eu tava lá, num bairro perto do aeroporto também, entrevistando o pessoal. Bom, não me lembro o nome do carinha que entrevistei nem suas feições nem nada. Só que ele era bonito e chato. E de direita. E que ele tinha um forte sotaque paulistano. Pois é, isso eu lembro bem: de como fiquei impressionada por ele ser paulistano da gema. Porque, sinceramente, nos 16 anos que morei em SP, posso contar nos dedos quantas pessoas nascidas na capital eu conheci. Enfim, rolou uma paquera, e a gente marcou pra que eu passasse lá novamente depois de terminar o meu trabalho. E aí a gente foi prum motel lá perto (acho que ele morava com os pais ou algo assim). Andando, o que já é estranho. Não sei, mas sempre associo motel com carro. Aquele foi meu primeiro motel, já que desde os 15, 16 anos, eu levava meus namorados e casinhos pra minha casa mesmo. Felizmente, meus pais eram liberais, e entendiam que 1) seus filhos adolescentes transavam (graças aos céus, não entre si); 2) era mais seguro que os filhos adolescentes transassem no quarto do que em carros, motéis, ou sei lá onde mais adolescentes transam (juro, me falta bagagem cultural pra saber disso. Contem pra mim. Fiquei curiosa).
Minha impressão do meu primeiro motel foi a pior possível. Não lembro da decoração no quarto (que é sempre um suprassumo kitsch), mas desconfio que isso de cama redonda é pra motel de luxo. Aquele não tinha disso não. Nem hidro nem nada. Forçando a memória, lembro que o box do banheiro tava cheio de mosquitinhos pousados lá. Mas sem dúvida o meu maior berro naquela noite foi quando vi uma baratona no criado mudo.
O resto não lembro. Não lembro se foi bom (quer dizer, tem como ser bom? Num quarto com no mínimo uma barata?!). Mas eu devia ser acima de tudo uma forte, porque passei a noite lá, com o paulistano da gema. E, de manhãzinha, peguei o ônibus e fui pra casa. Devo ter chegado em casa lá pelas seis ou sete da manhã, e quem é a primeira alma que encontro? Meu pai, tadinho. Lívido. Desesperado. Preocupadíssimo porque passei a noite fora sem avisar. Em quinze minutos ele ia chamar a polícia pra registrar meu desaparecimento. E iria também para hospitais e necrotérios, ver se alguém tinha notícias minhas. Pobrezinho. Eu me senti imediatamente culpada, lógico. Naquela época (1990?) não existia celular nem, aparentemente, orelhões em Congonhas. Prometi pro meu amado pai nunca mais sumir sem avisar. (E crianças, se vocês me estão lendo, não façam essa maldade com seus pais).
Só muitos, muitos anos depois é que fui pisar num motel de novo. Em Joinville. Com o maridão. Influenciada por amigas na escola onde trabalhava que diziam que motel era muito bom pra sair da rotina. Bom, meu coração pão-duro sofre em pagar uma diária de motel quando podemos fazer a mesma atividade em casa, mas sim, já fomos a motéis pra comemorar ocasiões especiais (nenhuma comemoração por eu ter passado no concurso em Fortaleza. Ainda!).
Olha, tudo que sei é que nunca mais tive que passar a noite com uma barata.




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