Por Maria Inês Nassif, no sítio Carta Maior:Encerrada com uma grande vitória, o cancelamento do aumento dos preços do transporte público na cidade de São Paulo, a mobilização iniciada pelo pequeno coletivo de jovens, com idade entre 20 e 25 anos, que se transformou num grande fenômeno de massas e se espraiou pelas outras capitais do país, termina com desafios maiores ainda. Apesar do grande apoio de partidos de esquerda – inclusive de setores dentro do próprio Partido dos Trabalhadores – e de movimentos sociais, o saldo da mobilização é do Movimento Passe Livre. O MPL continua o grande protagonista desta história e tem que dar respostas rápidas ao enorme contingente de jovens que colocou nas ruas (a maioria deles num primeiro ato político), para impedir a apropriação dessa energia contestadora que o movimento catalisou nas últimas semanas pela direita.
Esta convicção foi o saldo de reuniões que envolveram os integrantes do grupo desde que o movimento contra o aumento do preço do transporte público tomou a dimensão de movimento de massas, na última semana, com partidos de esquerda e movimentos sociais.
No final do dia de ontem (19), quando integrantes do MPL se reuniam com blogueiros, jornalistas que militam fora da órbita da grande mídia, o empresário de comunicação Joaquim Palhares (da Carta Maior) e Sérgio Amadeu, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) e o prefeito Fernando Haddad (PT) anunciaram a redução das tarifas de ônibus e metrô na capital. Quase que simultaneamente, o MPL tinha notícia da vitória do movimento também no Rio de Janeiro.
Na avaliação feita durante o encontro, o professor de História Lucas Oliveira, o Legume, definiu o MPL como um movimento social de esquerda, reafirmou as características apartidárias do movimento – que não se traduz em antipartidarismo, inclusive porque essa posição está em desacordo com a história do movimento, que sempre manteve ligações com partidos de esquerda.
A análise que integrantes do MPL e pessoas próximas ao movimento fizeram, nessa reunião, é que a massificação do movimento trouxe um contingente de jovens que não tinham história de participação política, à semelhança dos “cara-pintadas” do movimento pelo impeachment do presidente Fernando Collor, em 1991, e que não se sente representado por eles. Daí a reação à militância de partidos de esquerda que foram para as ruas e levaram suas bandeiras. Os jovens do movimento também constatam que atraíram a adesão de grupos mais violentos, que eram extremamente minoritários, mas cuja ação nas manifestações exigiria um trabalho de contenção que o MPL não estava aparelhado para fazer, até pelo exíguo número de integrantes. Registraram também a convicção de que atuaram, durante todo o movimento, agentes provocadores, provavelmente da polícia.
O que vem depois, todavia, é até mais complicado para o “coletivo” de São Paulo – que, segundo Oliveira, não tem uma articulação obrigatória com os movimentos que atuaram nas outras cidades do país nas últimas semanas. “Em algumas cidades nem existia Movimento Passe Livre”, contou.
Não existe uma articulação nacional do movimento; houve uma grande identificação dos jovens com o MPL, que não se transfere aos partidos de esquerda; e existe uma visível articulação de grupos de direita para tentar capitalizar o movimento, em especial nas redes sociais. Amadeu informou, durante o encontro, que na última semana os grupos anônimos de direita assumiram um enorme protagonismo nas redes sociais.
O MPL assume, como tarefa, manter a tarefa de “conversar” com esses jovens – e, embora seja deles cobrada a “politização” de suas bandeiras, existe uma convicção forte no grupo de que devem manter a agenda ligada ao transporte público e à questão da mobilidade urbana. Eles se articulam junto com o vereador Nabil Bonduki para apresentar um projeto instituindo o passe livre na cidade de São Paulo. Pensam também numa articulação nacional em torno da proposta de emenda constitucional de autoria da deputada Luiza Erundina, que define o transporte público como um direito de cidadania.
Leia, abaixo, a nota do Movimento Passe Livre, divulgada após a vitória em São Paulo:
“A cidade não esquecerá o que viveu nas últimas semanas. Aprendemos que só a luta dos de baixo pode derrotar os interesses impostos de cima. A intransigência dos governantes teve de ceder às ruas tomadas, às barricadas e à revolta da população.
Não foi o Movimento Passe Livre, nem nenhuma outra organização, que barrou o aumento. Foi o povo.
O povo constrói e faz a cidade funcionar a cada dia. Mas não tem direito de usufruir dela, porque o transporte custa caro. A derrubada do aumento é um passo importante para a retomada e a transformação dessa cidade pelos de baixo.
A caminhada do Movimento Passe Livre, que não começa nem termina hoje, continua rumo a um transporte público sem tarifa, onde as decisões são tomadas pelos usuários e não pelos políticos e pelos empresários. Se antes eles diziam que baixar a passagem era impossível, a revolta do povo provou que não é. Se agora eles dizem que a tarifa zero é impossível, nossa luta provará que eles estão errados.
Por uma vida sem catracas!
Movimento Passe Livre São Paulo”
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