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O Dia D
A propósito da justíssima comemoração dos 60 anos do Dia D, importa reter alguns dados históricos que impedem uma versão simplista da Guerra de 1939-45, como se ela tivesse sido essencialmente uma luta protagonizada pelos Estados Unidos em nome da liberdade e da democracia contra o despotismo nazi:
a) A Alemanha nazi, apesar do seu evidente totalitarismo e da opressão racista, só foi combatida quando ela atacou e ocupou outros países, querendo depois subjugar o mundo em aliança com a Itália fascista e com o Japão imperialista;
b) Os Estados Unidos começaram por adoptar pressurosamente uma posição de neutralidade em 1939, no início da guerra europeia, e só entraram no conflito depois do ataque japonês a Pearl Harbor em Dezembro de 1941 e depois de a Alemanha lhes ter declarado guerra nessa mesma altura (11 de Dezembro);
c) Sem isso, e apesar da solidariedade de Roosevelt, provavelmente os Estados Unidos teriam deixado a Grã-Bretanha e a URSS sozinhos contra a Alemanha nazi, sem se envolverem militarmente, embora apoiando maciçamente o esforço de guerra britânico e soviético;
d) A par da tardia intervenção norte-americana e da sua contribuição decisiva em várias frentes para a vitória final, importa não esquecer a solitária resistência britânica à Blitzkrieg durante dois anos, quando tudo parecia perdido, bem como a dramática resistência da União Soviética, conseguindo a inversão do curso da guerra na batalha de Estalinegrado, no Inverno de 1942-43, e o lançamento da contra-ofensiva vitoriosa na frente Leste, muito antes da abertura de frente ocidental;
e) A resistência nacional dos países ocupados foi sobretudo motivada pela ideia de libertação nacional em relação à ocupação alemã, protagonizada pelas forças democráticas internas (e em especial a esquerda); isso foi claro inclusive no caso italiano, em que a luta interna só se tornou relevante depois da queda de Mussolini em Roma (1943), quando os alemães, de aliados se tornaram em ocupantes no norte do País;
f) A II Guerra Mundial foi acima de tudo uma guerra contra a agressão e o expansionismo alemão e nipónico, ainda que a barbárie dos dois regimes tornasse a ocupação mais intolerável e permitisse a feliz associação entre a luta patriótica contra o domínio e opressão estrangeira e a luta pela liberdade e pela democracia contra o nazismo;
g) Infelizmente, entre os países em relação aos quais a vitória aliada não se traduziu na instauração da democracia ficaram alguns países europeus com regimes autoritários filofascistas, que porém se mantiveram fora do conflito, como Portugal e Espanha, onde a democracia só viria a ser alcançada três décadas depois. Esses ficaram à margem do Dia D.
Aditamento
João Tunes faz algumas observações críticas a este post, que merecem um comentário:
a) Sem dúvida que o infame pacto Molotov-Ribbentrop nas vésperas da invasão da Polónia, em Agosto de 1939 -- que incluía cláusulas secretas de partilha dos Estados Bálticos (incluindo a Finlândia) e da Polónia, e que só foi rompido com a súbita agressão e ocupação da URSS pela Alemanha na primavera de 1941 -- foi mais funesto do que a primitiva neutralidade dos Estados Unidos. Mas na economia do meu post eu não queria fazer uma história da guerra, mas sim focar somente o papel dos Estados Unidos, principal protagonista do Dia D, que foi o tema de partida do meu texto. De resto, na mesma linha de cedências e contemporizações com Hitler, deveria ser referida desde logo a complacência de Munique de 1938 do Reino Unido e da França.
b) O facto de na resistência francesa e italiana os comunistas alinhados com o Komintern terem tido um papel de relevo não desvaloriza o papel daquelas na libertação do nazismo.
c) Mencionar o importante papel da antiga União Soviética e dos comunistas dos países ocupados na derrota do nazismo não equivale a um "visão filo-soviética" (julguei que estava livre de tal imputação...). Os crimes de Estáline e a falência da URSS não apagam o heroísmo e os sacrifícios de 1941-45.
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