O essencial está fora - JANIO DE FREITAS
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O essencial está fora - JANIO DE FREITAS


FOLHA DE SP - 04/07

Sem o fim do arrastão, das doações empresariais e do fundo partidário não haverá reforma política


Se for para elevar o padrão político em geral, a moralidade do Congresso e combater a corrupção, três medidas são indispensáveis. Sem elas, pode haver remendo em um outro ponto, mas não haverá reforma política. Mas nenhum dos três está nas discussões.

FIM DO ARRASTÃO - É preciso que só se tornem deputados os que recebam votos para tanto. A legitimidade da Câmara depende dessa obviedade eleitoral. O sistema vigente faz a alta quantidade de votos de um candidato completar a votação insuficiente de outros, e torná-los deputados. É, portanto, um arrastão às avessas, em favor de quem perdeu.

Já houve deputada com 200 votos, entre os puxados pelo exótico recordista Enéas. A cada legislatura, a Câmara recebe um contingente desses deputados não eleitos. A deformação eleitoral é ainda agravada pelas coligações partidárias. Partidos miúdos, tantos deles formados como vias para o enriquecimento fácil, fazem deputados ao aproveitarem a votação nos partidos maiores a que se coligam.

Ao arrastão devem-se, além da ilegitimidade da representação parlamentar, outros três efeitos devastadores. Um, o baixíssimo nível mental (nem se pode dizer nível intelectual ou cultural) preponderante na Câmara.

Outro, a falta de sentido de uma Câmara tão grande, com seus 513 integrantes a um custo imoralmente gigantesco. E ainda o altíssimo nível da corrupção no ambiente, desde a corrupção implícita no "é dando que se recebe" com o governo à corrupção pelos negócios com projetos e votos.

Acabar com os suplentes de senador, como convém fazer, e manter a posse de não eleitos é contraditório. Mas o arrastão não está sozinho nas responsabilidades negativas.

FIM DAS DOAÇÕES EMPRESARIAIS - Uma das grandes fontes de corrupção, seja política ou administrativa, é o sistema de doações em nome de empresas para as campanhas eleitorais. Sua finalidade mais comum é a compra mesmo. Na melhor hipótese, como um seguro contra más eventualidades. Como regra, para ter um intermediário, um agente nos governos, no Legislativo e, nada raro, também no Judiciário.

A doação empresarial é usada para encobrir identidades e, com isso, dificultar possíveis comprometimentos e responsabilizações legais de doadores-compradores. O financiamento das campanhas, no entanto, precisa ser claro e objeto de fiscalização rigorosa em mão dupla: da Justiça Eleitoral, na contabilidade do candidato ou partido, e da Receita Federal na parte doadora.

Toda obscuridade eleitoral deslegitima o processo democrático e amplia a corrupção.

FIM DO FUNDO PARTIDÁRIO e alguns outros - Na democracia, os partidos têm de viver por seus próprios meios --mensalidades, eventos, edições, doações até um total determinado. Dinheiro público na sustentação dos partidos é uma forma de autoritarismo: impõe a contribuição dos cidadãos, ainda que indireta, para a propagação de ideias e propósitos que não são os seus. Ou até contrários aos seus.

As coligações para absorção de um tempinho a mais na propaganda eleitoral dita gratuita, em TV e rádio, resultam em corrupção maior a cada eleição. Tornaram-se comuns as coligações para que dirigentes de partidos pequenos vendam o tempo de propaganda que caberia à sua sigla.

Junte-se esse negócio ao dinheiro do fundo partidário, e aí está a razão de ser de muitos dos partidos miúdos, como também da pretendida formação de outros (mais 30, a somar-se ao outro tanto já existente). Dinheiro fácil, tomado aos contribuintes em geral, para os bolsos de grupelhos profissionais em degeneração eleitoral.

Reforma política que não contribui para a moralização e a representação legítima não é reforma. Com sorte, não é apenas embuste.






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