Geral
O lado bom das manifestações
Rodrigo Constantino
Tenho adotado uma postura bastante cética e critica em relação a essas manifestações no país. Isso se deve a vários motivos, entre eles:
1. Não aprecio o clima revolucionário de que vamos mudar o mundo rapidamente, saindo às ruas contra o “sistema”, contra “tudo isso que está aí”, pretexto muitas vezes para anarquia e depois golpe autoritário;
2. As manifestações partiram de movimentos organizados de esquerda com interesses obscuros, e por mais que agora essa turma seja minoria, a grande imprensa ainda dá espaço desproporcional a eles como interlocutores das ruas, ou seja, muitos servem como inocentes úteis para engrossar o quórum das demandas da esquerda, sempre mais tarimbada no assunto de manipulação das massas;
3. Falta foco, a revolta é geral, as demandas são difusas, e não se governa um país sem líderes e partidos organizados, apenas escutando as “vozes das ruas” que repetem slogans simplistas;
4. Justamente por isso, a reação do governo pode ser (e tem sido) oferecer como resposta a essa pressão toda mais governo, mais intervenção estatal;
5. Não compro a tese de que o “gigante” acordou, e que agora todos estão conscientes da política e não vão mais tolerar coisas como o “mensalão”, deixando de lado o velho “Pão & Circo”;
6. Receio que o tiro saia pela culatra, e que o maior prejudicado no curto prazo seja o fisiológico PMDB, que mal ou bem segura as pretensões bolivarianas do PT, abrindo espaço para um avanço ainda maior dos petiscas;
7. Temo também que o clima de insatisfação geral criado pelas passeatas seja propício para aventureiros de plantão, para um messias salvador da Pátria que prometa ignorar as falhas instituições democráticas para resolver nossos males em uma “democracia direta”;
8. Pelo mesmo motivo, desconfio de toda proposta que procura passar por cima do Congresso, apesar de este ser um balcão de negociatas, pois não acredito em saídas milagrosas fora da democracia representativa;
9. O clima de baderna gerado pelas manifestações acaba dando guarida aos vândalos que, embora em minoria, conseguem fazer um estrago no tecido social da nação, estimulando a anomia, a sensação de terra sem lei, protegidos da policia justamente porque há uma maioria pacífica nas ruas e uma forte opinião pública contra as ações da força policial;
10. Não acredito que seja possível sustentar por muito tempo essa forma de protesto, pois as pessoas precisam retornar ao trabalho, às suas vidas, com seu direito de ir e vir restabelecido, e nossos fins nobres não podem justificar meios condenáveis que prejudicam os inocentes ainda mais;
Essas são, basicamente, as razões pelas quais tenho feito ataques às manifestações, tentado trazer um pouco mais de serenidade e luz em meio a tanto calor difuso, jogado baldes de água fria em muita gente eufórica com essa situação nova no país.
Dito isso, é claro que não tenho apenas sentimentos negativos diante do quadro geral. Tenho sido o advogado do diabo, demandando mais cautela e cuidado, mostrando os enormes riscos disso tudo. Mas me parece inegável que há alguns pontos interessantes no que se passa. Para não ignorá-los e ficar parecendo que eu condeno tudo, vou listar algumas vantagens desse momento atual em que vive o Brasil:
1. De fato, a letargia até então era algo irritante, e até chocava a postura de pacato cidadão do brasileiro, que apanha o ano inteiro do governo, com sua incrível incompetência, seu descaso total, sem nada fazer, e agora, ao menos, demonstra sua revolta, ainda que de forma desorientada;
2. Ao obter alguma reação dos governos, essas pessoas descobrem o poder do grito, o que pode ser um perigo à frente, mas que também representa uma nova forma de evitar abusos, colocando os políticos contra a parede, temerosos até de sua integridade física daqui por diante (nunca é ruim o governante ter um pouco de medo da população);
3. O fato de tudo isso ocorrer durante a gestão petista pode, naturalmente, fortalecer a idéia de que o governo do PT não tem absolutamente nada de fantástico como seus marqueteiros dizem e algumas pesquisas “comprovam”, deixando evidente que há um grau de insatisfação generalizada no país;
4. Isso tudo, ainda muito caótico, pode servir para que alguns jovens, hoje encantados com soluções utópicas, descubram a importância de mergulhar mais a fundo nos problemas políticos e econômicos, de forma mais racional, o que os levará, sem dúvida, rumo ao liberalismo;
5. Nosso patriotismo pode sair fortalecido, a sensação de que a Pátria tem salvação e de que cabe a nós, brasileiros, moldarmos nosso destino, sem termos de aceitar de forma resignada que sempre seremos uma porcaria, um país jogado às traças, aos bandidos que usam e abusam de nossos impostos sem a menor preocupação com a reação dos “bovinos” obedientes;
Portanto, como fica claro, nem tudo é desgraça. Para mim, o ideal seria que boa parte do povo tivesse realmente acordado, se dado conta de que precisamos pressionar por mudanças, e que isso resultasse em movimentos organizados dentro da democracia representativa, cujo foco no curto prazo fosse retirar o PT do governo.
Não é esse o caso, não há esse mesmo diagnóstico, os métodos adotados me incomodam e geram apreensão, pois receio que o resultado não seja do nosso agrado. Mas também não quero passar a impressão de que o melhor seria simplesmente voltar ao que era antes, colocando o “gigante” para dormir novamente, passivo diante de tantos abusos do governo.
Será possível canalizar tanta energia despertada para algo mais construtivo, respeitando-se as vias da democracia representativa? Espero que sim. E é esse o desafio homérico dos liberais.
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