O parto privilegiado do Jornal Nacional
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O parto privilegiado do Jornal Nacional


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Por Luiz Carlos Azenha, no blog Viomundo:

O locutor anuncia que a Globo, ao comemorar seus 50 anos, vai mostrar “cenas de novelas proibidas pela ditadura”. Existe aí um avanço: a Globo chamou a ditadura de “ditadura”. É muito diferente dos antigos programas do repórter Amaral Neto - também conhecido como Amoral Nato -, se não me engano aos domingos de manhã.

Neles, ao longo do que agora se tornou “ditadura”, o “governo” fazia milagres - propagados para todo o Brasil pela Globo.

Não faz muito tempo as Organizações Globo admitiram que foi um erro apoiar o golpe de 64. Mais recentemente, no Jornal Nacional, admitiram que na cobertura da campanha das Diretas, nos anos 80, a emissora enfatizou o aniversário de São Paulo num dia em que milhares de pessoas se reuniram na praça da Sé para pedir eleições diretas para presidente.

Sobre o episódio, escrevi no Facebook parafraseando a atriz Kate Lyra, que popularizou a frase fazendo humor na própria Globo:

BRASILEIRO É TÃO BONZINHO…

Os telespectadores do Jornal Nacional estão se desmanchando pelo fato de que a Globo fez mea culpa sobre o episódio das Diretas, admitindo que enfatizou o aniversário de São Paulo quando se tratava de uma gigantesca manifestação por eleições. As pessoas acham lindo quando repórteres com os quais desfrutam de uma intimidade televisiva de décadas recontam a História da emissora com toques de sinceridade, como este. O fato é que por baixo da forma atraente se esconde, de novo, uma grande mentira. O problema não foi APENAS a Globo ter chamado a manifestação das Diretas em São Paulo falando do aniversário da cidade. O fato PRINCIPAL é que a Globo desconheceu completamente todos os comícios anteriores, com milhares de pessoas em várias cidades do Brasil. Isso não é um “erro”, mas um crime jornalístico pelo qual a emissora deveria pedir desculpas sinceras aos telespectadores. Mas, circunscrever os fatos históricos, para vender deles a versão mais palatável para a emissora, na Globo tornou-se uma forma de arte. Não deixa de ser outra forma de manipulação de incautos.


Pois é disso que se trata. A contrição marqueteira da Globo permite à emissora apresentar o “outro lado”, segundo o qual ela foi vítima da ditadura. Na censura às novelas, por exemplo.

Isso permite encobrir o essencial e historicamente verdadeiro: houve uma simbiose entre a Globo e a ditadura militar. Roberto Marinho foi promotor e beneficiário da ditadura. Ainda em 1984, ou seja, mais de 20 anos depois do golpe, escreveu:



Mas a Globo aposta na desinformação dos mais jovens, que não viveram sob a ditadura, nem acompanharam pessoalmente o comportamento da Globo ao longo da História.

A eles, dedico minhas lembranças dos anos 60 e 70, em Bauru, no interior de São Paulo.

Era o tempo em que a Globo ainda estava em expansão. As imagens da emissora não chegavam a todo o Brasil via satélite. Um coronel do Exército, se não me engano de nome Amazonas, era o encarregado de implantar as torres rebatedoras que transmitiam o sinal da Globo cidade a cidade.

Havia clamor público, na época, por um sinal limpo de TV, já que era irritante ver fantasmas ou as imagens tremidas que nos chegavam, quando chegavam. Era comum que prefeitos da época se propusessem a resolver o problema, em busca de votos.

Havia outras emissoras, mas o sinal da Globo era o mais desejado. A emissora tinha herdado boa parte do elenco da Excelsior, cujo dono Mário Wallace Simonsen vinha sendo escorraçado pelos militares, por não ter apoiado o golpe tanto quanto Marinho.

Era projeto do “governo” — segundo a Globo, que hoje chama de “ditadura” –, por uma questão de segurança nacional, interligar todo o Brasil numa única rede de telecomunicações. E a Globo vinha na esteira da Embratel, a empresa estatal.

Como funcionava o esquema? As prefeituras doavam terrenos, num primeiro momento à Embratel. As torres eram espetadas com dinheiro público. Mas o sinal que carregavam era privado! Foi assim o parto de um telejornal de alcance nacional, o JN!

Já então, um caso de apropriação do público pelo privado. Um caso de simbiose entre um regime e um empresário, que em troca ofereceu uma cobertura jornalística amigável à ditadura, com programas como o de Amaral Neto.

Essa é uma História que a Globo não vai contar em seu especial de 50 anos.




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