OS DEZ MELHORES FILMES DA DÉCADA
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OS DEZ MELHORES FILMES DA DÉCADA


Depois de divulgar minha lista dos piores filmes da década de 00, recebi um email de um leitor reclamando que eu deveria ter sido impedida de publicar algo assim (como, meu deus, falar mal de sucessos de público?! Se um montão de gente viu e gostou, então o filme é ótimo e ponto final) e que não entendia como alguém com um mau gosto tão evidente podia ter doutorado. Mas isso não foi nada, perto do que ouvi de um troll português que invadiu o blog pra protestar contra minha inclusão de Senhor dos Anéis. Eu ri muito de suas pérolas, como “Devias a matar-te, pois logo vê-se que és uma suína com pouco ou nenhum talento literário”, e “São oito pessoas que estão na missão de destruir o anel, e não oito. Sabes contar, ao menos?”. Bom, espero que minha lista dos melhores da década provoque menos controvérsias.
A lista está em ordem cronológica. Não consigo escolher o melhor filme da década, porque há produções de vários gêneros diferentes, e é impossível compará-las. Tenho a impressão, pelas longas listas de menções honrosas que fiz, que esta década foi melhor pro cinema que a de 90. Ou eu que estou ficando doce como um cordeirinho? Vamos. Amnésia (Memento, 00), de Christopher Nolan. Sei que na realidade filmes do ano 2000 teriam que entrar na lista de 90, mas, como só vi esse drama depois, tenho que inclui-lo aqui. Amnésia é altamente original, contado de trás pra frente. Mas já vi a história em ordem linear também e, apesar de perder um tiquinho da graça, ela continua sendo excelente. Dá pra escrever tratados sobre Amnésia e suas relações com o pós-modernismo, sobre a importância de fazer memórias, e sobre a vontade de esquecer versus a necessidade de ter um objetivo pra viver. Minha cena preferida é quando Guy Pearce descobre o que há por trás da personagem de Carrie-Anne Moss, e precisa escrever aquilo em algum lugar ou não se lembrará daqui a poucos minutos. E ela esconde a caneta. Sempre andem com uma caneta por perto, gente. Também tem uma sátira perfeita dos filmes de ação: Guy “acorda” e está correndo, mas demora pra se dar conta se está perseguindo um sujeito ou sendo perseguido por ele. O que dizer de um filme em que o protagonista narra, em off, as frases “A memória pode mudar o formato de um quarto e a cor de um carro. Memórias podem ser distorcidas. Elas são apenas uma interpretação, não um registro, e são irrelevantes se você tem os fatos”. E aí ele passa o resto do filme criando esses fatos, só pra moldar sua memória. Da qual ele nem vai se lembrar mesmo.Cidade de Deus (02), de Fernando Meirelles. Este filme frenético causou sensação quando foi lançado, e sua reputação só aumentou. Hoje em dia ele tá incluso em praticamente todas as listas de melhores da década (se bobear, deve ser o único entre os dez que eu pus aqui que é unanimidade). Os vinte anos de uma favela são contados de forma visceral, com edição e fotografia consagradas, e personagens marcantes. Tenho duas amigas que reclamam da presença do narrador/fotógrafo (querem que o filme inteiro permaneça na favela), mas eu o considero importante pra captar o público de classe média que vai ao cinema. De certo modo, é uma concessão, mas não parece forçada e tem seu próprio sabor. E “Meu nome é Zé Pequeno” entrou pro folclore popular. Ah, e já falei que a co-diretora do filme, Kátia Lund, que fez todo o treinamento (fantástico) de atores, estudou na mesma escola que eu? A gente jogava handball juntas. Fale com Ela (02), de Pedro Almodovar. Acho que prefiro Tudo Sobre Minha Mãe (99) como meu top do diretor espanhol, mas Fale com Ela tá logo ali. O drama tem algumas narrativas que não me agradam (touradas, por exemplo, se bem que há uma cena magnífica de uma toureira sendo vestida; um estupro cometido por uma pessoa de quem gostamos). O próprio título já é dúbio, porque, apesar de conter “ela”, este é um filme sobre homens e suas conversas com mulheres ― infelizmente, mulheres em coma que não podem ouvi-los. Então as mulheres do filme são definitivamente passivas. Mas esse é um pretexto para que os homens explorem a sua sensibilidade. E onde mais a gente vai encontrar uma vagina gigante que não seja algo ameaçador, dentado, mas acolhedor? O filme dentro do filme, em que um homem encolhe até entrar na vagina da amada e ficar lá pra sempre, é puro surrealismo. E, como em tudo em Fale, é de uma delicadeza ímpar. Kill Bill – Volumes 1 e 2 (03-04), de Quentin Tarantino. Vou colocar os dois filmes juntos porque no fundo eles são um só. Era pra ser apenas um, mas Taranta criou tanto material que os produtores perguntaram, “Quer lançar dois filmes?”. E ele já anunciou o terceiro para 2014, ueba. Kill Bill é uma simples história de vingança, mas lotada de referências, com ritmo alucinante, e um total empoderamento das mulheres como raras vezes se viu no cinema. É, o título e o controle estão com um homem, Bill, mas a trama pertence inteirinha à Noiva (Uma Thurman), que se vinga de todo mundo e finalmente cumpre seu objetivo maior. Ah sim, não sei se você notou, mas tanto Kill Bill quanto Fale com Ela nos ensinam algo que eu sequer desconfiava: que há homens inescrupulosos que podem se aproveitar de vítimas em coma. Argh. Um leitor meu disse na época que Pulp Fiction é Pelé, e Kill Bill é Garrincha. E isso que ele só tinha visto o volume 1. Match Point (Ponto Final, 05), de Woody Allen. Logo o filme mais incomum do Woody, tão sem nada a ver com ele, é o seu suprasumo da década, e um dos melhores de sua longa carreira. Não tem muito humor, passa-se em Londres, não Nova York, é meio um film noir, e o mais incrível, trata de conflito de classes. Woody é conhecido por praticamente só retratar a elite. E aqui vemos um jovem (Jonathan Rhys-Meyer) fazendo de tudo pra subir na vida. O suspense tem um ar de Um Lugar ao Sol (o protagonista pobre que mata a amante grávida para poder ficar com a mulher rica), mas é muito mais imprevisível. Com um roteiro enxuto e muitíssimo bem amarrado, o diretor consegue manter um clima de ansiedade que não nos abandona nunca. Filhos da Esperança (Children of Men, 06), de Alfonso Cuarón. Como eu disse na lista das menções honrosas, estava na dúvida se colocava Minority Report nesta relação. Mas Filhos é uma ficção científica superior por ter um final mais satisfatório. E por ser toda uma fábula da falta de cuidados com o planeta. O filme já começa com seu protagonista, Clive Owen, quase sendo atingido por uma explosão num café. Estamos no ano 2027, daqui a pouquinho, e a pessoa mais jovem do mundo, um argentino de 18 anos, acabou de morrer. Se somos irresponsáveis com o mundo mesmo quando temos herdeiros pra deixar o legado da nossa miséria, imagina se soubermos que daqui a algumas décadas não haverá mais humanos? Caos absoluto nas ruas. O interessante é que o filme nos apresenta vários personagens de que gostamos, e vai tirando-os do caminho um a um, sem dó. Apesar do final mais ou menos feliz, pra mim não parece ser uma trama de esperança nem a pau (tanto que o título original é Filhos de Homens). Mas é um grande filme, melancólico, distópico.O Grande Truque (The Prestige, 06), de Christopher Nolan. Dois mágicos rivais (Hugh Jackman e Christian Bale) ficam cada vez mais competitivos e violentos no final do século 19, em Londres. Quer dizer, a história é bem mais complexa que isso, e envolve temas como duplos (doubles), clones, obsessão, vingança, e identidade. É uma delícia de acompanhar. Quando vi o filme pela primeira vez eu adorei, mas jamais pensei que ele acabaria na lista dos melhores da década. Mas a cada vez que o revejo, mais eu gosto. É, foi muito difícil decidir se gosto mais deste ou de Batman, Cavaleiro das Trevas. Sweeney Todd (07), de Tim Burton. O grande musical da década e, para muitos críticos, o melhor desde Cabaret, de 72. Estranho, porque não tem números de dança, e o casal de atores, Johnny Depp e Helena Bonham-Carter, não são bons cantores. E ainda por cima foi deprimente ver o diretor dizendo, numa entrevista do dvd, que acha que musical é coisa de gays. Como que um cara que detesta musicais foi logo fazer ums dos melhores? Além de todos os números musicais funcionarem aqui, tem tanta crueldade no ar, tanta perversidade, que fica até claustrofóbico. Definitivamente não é um feel-good movie.Bastardos Inglórios (09), de Tarantino. A maior homenagem ao cinema na década, e, talvez, à fonética também. Taranta pegou um tema pra lá de batido (o nazismo), e fez um filme vigoroso sem a menor preocupação histórica. E quantos filmes sobre a Segunda Guerra (e sobre guerras em geral) trazem mulheres ativas, participantes, lutadoras? Não sei se deu pra notar que o Taranta não se envergonha de retratar heroínas.
A Origem (10), de Christopher Nolan. Aquele tipo de filme em que todo detalhe conta. Um primor de edição e direção de arte. Um roteiro complicado, típico do Nolan, que mostra um sonho dentro de um sonho dentro de outro sonho, e confunde a realidade e a ficção. E, de lambuja, coloca um monte de discussões filosóficas e existenciais de um jeito pop. E tem um final aberto, permitindo uma série de interpretações. Um fenômeno.




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