A tabela mostra a contabilidade semanal do PCC na região de Sorocaba. O cadastro controla os integrantesHá cerca de três anos, apontam as investigações, o sistema de comunicação preferido pelo PCC era o BlackBerry. Sediado no Canadá, o sistema possuía uma criptografia que impedia a interceptação de comunicações e durante muito tempo foi usado para se livrar dos grampos. Apenas a polícia americana possuía os códigos de acesso repassados posteriormente às autoridades brasileiras. Como a criptografia foi quebrada, a nova moda é o WhatsApp. O Sistema Guardião da Polícia Civil paulista não consegue interceptar as ligações e os bandidos sabem.
Apenas em casos excepcionais programas como o Skype e o WhatsApp são grampeados e a nova luta dos investigadores tem sido obter tecnologias adaptadas à nova era. Enquanto a investigação paulista patina com vídeos de festas em delegacias e presídios, o crime organizado se aperfeiçoa. É o que mostram os relatórios das investigações federais e do Ministério Público.
A estrutura organizacional do PCC chama a atenção pelo seu estatuto, a contabilidade e a capilaridade nos demais estados e até no exterior. Para entender como a quadrilha funciona, a investigação fez um mapeamento detalhado da facção. A clareza de propósitos da quadrilha começa pela última atualização de seu código de conduta. O documento com 18 artigos mostra que seus integrantes vivem especificamente da prática de crimes, especialmente o tráfico de drogas (apelidado de progresso), ignoram as leis brasileiras e o Judiciário, tratam as polícias como inimigas e suas ações servem como referência para o mundo do crime.
O organograma do PCC lembra aquele de uma empresa. Em formato piramidal, as principais lideranças ocupam os postos conhecidos como “sintonias”. A cabeça da organização é chefiada pela Sintonia Fina Geral, composta de sentenciados considerados fundadores da organização criminosa, e pelo líder máximo, Marcos Willian Herbas Camacho, o Marcola.
As penas somadas dos líderes passam dos 500 anos de cadeia. Entre as “sintonias” mais importantes destacam-se a do “financeiro”. Nesse setor são colocados apenas integrantes com alto grau de confiança da cúpula. A forma de financiamento da organização é diversificada e detalhada. A arrecadação principal vem especialmente do tráfico nas ruas, mas também do comercializado nas cadeias. É o chamado Progresso 100%. Nas penitenciárias, uma parte deve ser encaminhada à organização.
Quem está fora do sistema prisional, também precisa colaborar com a facção. A Cebola (caixinha mensal) é responsável por arrecadar 650 reais de cada integrante solto, uma contribuição compulsória que, quando não paga, pode levar a alguma punição do integrante.
Há também as rifas. A cada dois meses são sorteados apartamentos, casas, veículos (carros e motos). O membro da quadrilha tem o dever de comprar 20 rifas, ao custo de 30 reais cada, bimestralmente. Com as contribuições, o integrante passa a ter direitos. O Sintonia da Ajuda é o setor responsável por prestar apoio financeiro a quem estiver preso ou em dificuldades. Familiares de integrantes da organização que tenham morrido em missões dadas pela cúpula também recebem auxílio. Ônibus são colocados à disposição na capital paulista para transportar visitas aos presídios no interior.
Há uma denominação especial na contabilidade da facção chamada de Mineral. Uma Mineral significa o montante de 1 milhão de reais a ser escondido por alguém de confiança da cúpula da organização. Esse valor geralmente é enterrado e somente quem o guardou sabe a exata localização.
Para fazer parte, é necessária uma cerimônia de iniciação. Acredita-se que a ritualística tenha paralelo com aquela dos maçons. O novo integrante é “batizado” por outros três e passa a ser conhecido como irmão e a esposa ou companheira é tratada como cunhada. O iniciado ganha um número de identificação, o mesmo usado pela Secretaria de Administração Penitenciária para o registro do detento no sistema carcerário. Caso nunca tenha sido preso, terá em seu registro a expressão: “Nunca foi privado”.
Todas as informações são catalogadas em um programa de computador que fica nas mãos de integrantes próximos à cúpula da organização. Nesse cadastro há um alto nível de detalhamento da vida pregressa do bandido. A ficha contém informações básicas como número de telefone, apelido, onde está localizado, data em que passou a fazer parte do PCC, o nome dos três padrinhos de batismo na quadrilha e a última unidade prisional pela qual passou, até se ele já foi punido pela organização em algum momento.
O PCC, estima-se, movimenta por ano 120 milhões de reais e mexe com muitos interesses. Não foi à toa que a última grande crise com o Estado, em 2006, provocou 564 mortes. Segundo o depoimento de um delegado, um acordo foi feito entre Marcola e o governo estadual para cessar os ataques. Os tucanos, que governam São Paulo há duas décadas, sempre negaram o acordo.