Por Eduardo Guimarães, no Blog da Cidadania:Na última quarta-feira, a Folha de São Paulo publicou manchete incomum em sua primeira página – ou não é incomum a imprensa paulista fazer “denúncia” contra um tucano? E, no caso, a denúncia foi contra o senador mineiro e presidente do PSDB, Aécio Neves.
A história foi requentada. A reportagem anuncia o que todo mundo está careca de saber: que Aécio Neves, presidente do PSDB, líder da oposição, senador por Minas Gerais, usa dinheiro público para alimentar sua obsessão por aviões, que, além de uso de aeronaves oficiais, inclui até construção de aeroportos para uso particular, obviamente construídos com dinheiro público.
Aliás, a matéria da Folha saiu incompleta. Alude ao uso abusivo de aeronaves oficiais enquanto Aécio era governador de Minas, mas, para ser completa, deveria ter lembrado ao público que a farra aérea do tucano continuou após ele deixar o governo mineiro.
Reportagem do jornal O Estado de São Paulo de março de 2013 revelou que “O senador Aécio Neves (PSDB) fez para o Rio de Janeiro 63% das viagens bancadas pela verba de transporte aéreo (VTA) do Senado”.
Aécio é senador por Minas Gerais. Por que o Erário tem que bancar suas viagens de turismo ao Rio?
A matéria de 2013 do Estadão também informou que o então pré-candidato a presidente da República “Pagou com dinheiro público 83 voos, dos quais 52 começaram ou terminaram na capital fluminense (…) rumo ao Aeroporto Santos Dumont, o mais próximo da zona sul da cidade, onde [Aécio] passou parte da juventude, cursou a faculdade, mantém parentes e costuma ser visto em eventos sociais”
Explica-se aquela inédita diligência do Estadão com dinheiro público mesmo não sendo o PT o alvo da acusação: havia uma disputa entre o PSDB de São Paulo e o de Minas para saber qual dos dois Estados teria a candidatura pela PSDB a presidente no ano seguinte.
Em 2009, o Estadão também atacou Aécio para que não ousasse enfrentar José Serra na disputa pela candidatura do PSDB a presidente. O falecido articulista e editorialista Mauro Chaves publicou o artigo “Pó pará, governador”, que insinuava que o então governador de Minas Gerais seria usuário de cocaína”.
Vale a pena rever aquela matéria para entender a eterna guerra através da imprensa que travam o PSDB de São Paulo e o de Minas.
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Pó pará, governador?
28 de fevereiro de 2009 | 0h 00
Mauro Chaves – O Estado de S.Paulo
Em conversa com o presidente Lula no dia 6 de fevereiro, uma sexta-feira, o governador Aécio Neves expôs-lhe a estratégia que iria adotar com o PSDB, com vista a obter a indicação de sua candidatura a presidente da República. Essa estratégia consistia num ultimato para que a cúpula tucana definisse a realização de prévias eleitorais presidenciais impreterivelmente até o dia 30 de março – “nem um dia a mais”. Era muito estranho, primeiro, que um candidato a candidato comunicasse sua estratégia eleitoral ao adversário político antes de fazê-lo a seus correligionários. Mais estranho ainda era o fato de uma proposta de procedimento jamais adotada por um partido desde sua fundação, há 20 anos — o que exigiria, no mínimo, uma ampla discussão partidária interna -, fosse introduzida por meio de um ultimato, uma “exigência” a ser cumprida em um mês e meio, sob pena de… De quê, mesmo?
O que Aécio fará se o PSDB não adotar as prévias presidenciais até 30 de março? Não foi dito pelo governador mineiro (certamente para não assinar oficialmente um termo de chantagem política), mas foi barulhentamente insinuado: em caso da não-aprovação das prévias, Aécio voaria para ser presidenciável do PMDB. É claro que para o presidente Lula e sua ungida presidenciável, a neomeiga mãe do PAC, não haveria melhor oportunidade de cindir as forças oposicionistas, deixando cada uma em um dos dois maiores colégios eleitorais do País. E é claro que para o PMDB, com tantos milhões de votos no País, mas sem ter quem os receba, como candidato a presidente da República, a adoção de Aécio como correligionário/candidato poderia significar um upgrade fisiológico capaz de lhe propiciar um não programado salto na conquista do poder maior — já que os menores acabou de conquistar.
Pela pesquisa nacional do Instituto Datafolha, os presidenciáveis tucanos têm os seguintes índices: José Serra, 41% (disparado na frente), e Aécio Neves, 17% (atrás de Ciro Gomes, com 25%, e de Heloisa Helena, com 19%). Por que, então, o governador de Minas se julga capaz de reverter espetacularmente esses índices, fazendo sua candidatura presidencial subir feito um foguete e a de seu colega e correligionário paulista despencar feito um viaduto? Que informações essenciais haveria, para se transmitirem aos cerca de 1 milhão e pouco de militantes tucanos — supondo-se que estes fossem os eleitores das “exigidas” prévias, que ninguém tem ideia de como devam ser –, para que pudesse ocorrer uma formidável inversão de avaliação eleitoral, que desse vitória a Aécio sobre Serra (supondo que o governador mineiro pretenda, de fato, vencê-las)?
Vejamos o modus faciendi de preparação das prévias, sugerido (ou “exigido”?) pelo governador mineiro: ele e Serra sairiam pelo Brasil afora apresentando suas “propostas” de governo, suas soluções para a crise econômica, as críticas cabíveis ao governo federal e coisas do tipo. Seriam diferentes ou semelhantes tais propostas, soluções e críticas? Se semelhantes, apresentadas em conjunto nos mesmos palanques “prévios”, para obter o voto do eleitor “prévio” cada um dos concorrentes tucanos teria de tentar mostrar alguma vantagem diferencial. Talvez Aécio apostasse em sua condição de mais moço, com bastante cabelo e imagem de “boa pinta”, só restando a Serra falar de sua maior experiência política, administrativa e seu preparo geral, em termos de conhecimento, cultura e traquejo internacional. Mas se falassem a mesma coisa, harmonizados e só com vozes diferentes, os dois correriam o risco de em algum lugar ermo do interior ser confundidos com dupla sertaneja — quem sabe Zé Serra e Ah é, sô.
Agora, se os discursos forem diferentes, em palanques “prévios” diferentes, haverá uma disputa de acirramento imprevisível. E no Brasil não temos a prática norte-americana das primárias — que uniu Obama e Hillary depois de se terem escalpelado. Por mais que disfarcem e até simulem alianças, aqui os concorrentes, após as eleições, sempre se tornam cordiais inimigos figadais. E aí as semelhanças políticas estão na razão direta das diferenças pessoais. Mas não há dúvida de que sob o ponto de vista político-administrativo Serra e Aécio são semelhantes, porque comandam administrações competentes.
Ressalvem-se apenas as profundas diferenças de cobrança de opinião pública entre Minas e São Paulo. Quem já leu os jornais mineiros fica impressionado com a absoluta falta de crítica em relação a tudo o que se relacione, direta ou indiretamente, ao governo ou ao governador.
O caso do “mensalão tucano” só foi publicado pelos jornais de Minas depois que a imprensa do País inteiro já tinha dele tratado — e que o governador se pronunciou a respeito. É que em Minas imprensa e governo são irmãos xifópagos. Em São Paulo, ao contrário, não só Serra como todos os governos e governadores anteriores sempre foram cobrados com força, cabresto curto, especialmente pelos dois jornais mais importantes. Neste aspecto a democracia em São Paulo é mais direta que a mineira (assim como a de Montoro era mais direta que a de Tancredo). Fora isso, os governadores dos dois Estados são, com justiça, bem avaliados por suas respectivas populações.
O problema tucano, na sucessão presidencial, é que na política cabocla as ambições pessoais têm razões que a razão da fidelidade política desconhece. Agora, quando a isso se junta o sebastianismo — a volta do rei que nunca foi –, haja pressa em restaurar o trono de São João Del Rey… Só que Aécio devia refletir sobre o que disse seu grande conterrâneo João Guimarães Rosa: “Deus é paciência. O diabo é o contrário.”
E hoje talvez ele advertisse: Pó pará, governador?
Mauro Chaves é jornalista, advogado, escritor,administrador de empresas e pintor.*****
O leitor poderá notar que no texto acima figura link para a matéria original do Estadão. Porém, se tentar acessá-la irá deparar com a seguinte mensagem
Como se vê, o Estadão, por razões óbvias, sumiu com a matéria após ela ter cumprido seu objetivo – há cerca de seis anos. Porém, um leitor desta página descobriu como recuperá-la e fez até um vídeo explicando como é possível comprovar a veracidade do artigo do Estadão que acusou Aécio de ser usuário de cocaína.
Se alguém tinha dúvida da existência dessa guerra entre tucanos mineiros e paulistas, não deveria ter mais após tudo que acaba de ler e assistir. Porém, tem mais.
Na última quinta-feira, este blogueiro recebe ligação em seu celular de um “número privado”, ou seja, que o identificador de chamadas do aparelho não conseguiu identificar. Reproduzo de memória, abaixo, o teor da ligação.
— Eduardo Guimarães?
— Ele mesmo, pois não…
— Eduardo, liguei pra falar procê da matéria da Folha de ontem que acusa Aécio Neves de usar avião oficial pra ir pro Rio…
— Quem está falando, por favor?
— Foi o Alckmin que encomendou a matéria.
— Preciso saber com quem estou falando…
— Lembra das matérias do Estadão pó pará, governador – um ano antes da eleição de 2010 – e da de 2013 – um ano antes da eleição de 2014 – sobre uso de avião oficial no senado? Agora Alckmin usa a Folha pra atacar Aécio pelo lugar da Dilma
— Quem fala? Alô, alô…
A ligação foi cortada. Porém, concordo com o anônimo. Até porque, o Blog obteve informações de que o mundo caiu na cabeça da Folha ontem. Foram tantas as ligações de tucanos aecistas que, em sua edição seguinte (24/9), o jornal sai com um artigo igualmente incomum – mas, agora, contra Alckmin.
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FOLHA DE SÃO PAULO
24 de setembro de 2015
ROGÉRIO GENTILE
Só pode ser piada
SÃO PAULO – Em meio a tanto problema, com presidente no limbo e dólar nas alturas, a Câmara, ao menos, tem-se esforçado para fazer humor. Sarcástico e debochado, mas humor. Decidiu conceder ao governador Alckmin (PSDB) um prêmio por sua atuação na crise hídrica.
O Prêmio Lúcio Costa foi criado com o objetivo de reconhecer iniciativas que buscam a melhora da qualidade de vida das pessoas. Segundo o Datafolha, 71% dos paulistanos já sofreram cortes no fornecimento de água. Será que ser obrigado a sair de casa sem tomar banho ou ter de manter um balde entre as pernas para captar água com sabão no chuveiro significa vida melhor?
Embora, de fato, São Paulo esteja passando pela maior estiagem em 85 anos, não há como elogiar a atuação do governador. Alckmin demorou conscientemente para agir. Retardou uma série de medidas contra a seca simplesmente porque temia seu impacto na eleição.
Em abril de 2014, anunciou que começaria a sobretaxar em 30% as pessoas que gastassem água em demasia. Desaconselhado por assessores políticos, recuou e só implantou a medida em janeiro de 2015. A redução da pressão nas torneiras, principal providência contra a crise, também foi ampliada após a eleição.
Reportagem da Folha mostrou que as represas poderiam ter 51% mais de água se valessem desde o início de 2014, quando a crise já era evidente, as medidas hoje em vigor.
Relatório do Tribunal de Contas do Estado diz que a crise hídrica “é resultado da falta de planejamento das ações do governo” e que alertas foram dados desde 2004.
O próprio Jerson Kelman, presidente da Sabesp, reconhece que a atuação não foi boa. Pouco antes de assumir o cargo, no fim de 2014, afirmou que, por conta da eleição, “desperdiçou-se água e os reservatórios estão mais vazios do que deveriam”.
Alckmin, porém, como disse ontem, considera que “o prêmio foi merecido”. Só pode mesmo ser piada.*****
Foi uma espécie de “prova” que o jornal tentou dar aos aecistas de que não fez a denúncia contra Aécio a serviço de Alckmin. Mas, como ninguém é de ferro, a denúncia contra o governador paulista saiu sem destaque, escrita por um antipetista fanático que jamais dissera um A contra o PSDB antes.
Por que o PSDB paulista está atacando Aécio de novo? Novamente, o ataque ocorre porque Aécio quer derrubar Dilma e Temer já para que haja novas eleições já, pois, devido ao recall das eleições do ano passado, sua vitória, ao menos na visão dele, seria “certa”.
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