Por Gabriel Medina, na revista Teoria e Debate:
Os rolezinhos são a bola da vez. Uma parcela da sociedade se assusta com a forma de manifestação da juventude das periferias nos shopping centers. A fórmula da resposta já é conhecida: criminalização e proibição. Afinal, por que esses jovens agora teriam o direito de se divertir, cantar e beijar?
Esse fenômeno é reflexo de onze anos de melhoria social, com aumento do poder de consumo das classes populares. A ascensão social de 40 milhões de brasileiros gerou uma demanda por mais direitos, reconhecimento e também mais e mais produtos.
A juventude de periferia, em sua maioria negra, historicamente não teve acesso a direitos que marcam esse período da vida. Foi jogada ao mercado de trabalho informal, ao trabalho doméstico e cuidado com a reprodução social (quando mulheres), falta de acesso à educação e a criminalização constante de seu encontro nas ruas, praças e parques. Tinha responsabilidade e deveres de adulto, mas nunca gozou de respeito e reconhecimento social. Não lhe foi permitido o direito ao tempo livre, a espaços de cultura, lazer e esporte que pudessem fomentar um convívio social e ao exercício de sua sexualidade.
Os rolezinhos podem, sim, ser considerados protesto de vozes que foram caladas e de jovens que tiveram seus direitos cerceados, como o direito à circulação na cidade (lembrem das revoltas de junho), ao espaço urbano que foi dominado pela especulação imobiliária e por ações voltadas a garantir a segurança e convivência das elites.
A cultura do medo e a privatização da cidade causaram esvaziamento e degradação dos espaços públicos e afirmaram os shoppings como o principal espaço de convívio. Esses jovens expressam a ânsia pelo convívio social e o rompimento do individualismo exacerbado que produz doenças e sofrimento mental, muito presente nas classes altas da sociedade.
A escolha do shopping como espaço para manifestação não deve causar estranhamento. O capitalismo soube muito bem constituir um modelo de felicidade, fundamentado na liberdade, marcada por desejos insaciáveis. A mercadoria e o apelo sexual caminham lado a lado na publicidade. Nessa lógica, consumir é sinônimo de liberdade e de prazer, e o shopping é lugar privilegiado para esse exercício.
A absurda liminar que proíbe os rolezinhos, somada à ação violenta da Polícia Militar, expõe mais uma vez a dificuldade dos poderes estabelecidos de dialogar com a juventude, sua expressão cultural, seu comportamento e estilo de vida. Uma afronta evidente aos direitos humanos e constitucionais, como o direito de ir e vir. É inaceitável a criação de duas portas de entrada, com oficiais de Justiça e policiais cadastrando jovens potencialmente perigosos, prática também vista nas jornadas de junho, típicas de regimes ditatoriais.
Não se deve criminalizar o funk, assim como já foi feito, em outros tempos, com a capoeira, o samba e o hip-hop. O incômodo com os rolezinhos reflete a dificuldade de setores mais abastados da sociedade de conviver com a diferença e, principalmente, de aceitar a ascensão social e o consumo dos mais pobres, que não apenas desfrutam da possibilidade de compra, mas também querem ter direito ao lazer, ao tempo livre e à felicidade.
O caminho escolhido pelo prefeito Haddad vai no rumo certo: o estabelecimento de um diálogo sincero entre a juventude, o funk e a cidade para a construção de alternativas criativas que ampliem o direito aos bens sociais e culturais da mais rica cidade do país.
* Gabriel Medina é coordenador de Juventude da Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania da Prefeitura de São Paulo.
GAZETA DO POVO - PR - 07/02 Demonizar os shoppings e aqueles que não concordam com os rolezinhos é mero oportunismo ideológico que serve apenas para criar mais tensão Depois do susto inicial causado pela onda de rolezinhos por todo o país, as coisas...
FOLHA DE SP - 17/01 O pobrismo racialista é a mais vistosa manifestação de vigarice intelectual do jornalismo e da academia Setores da imprensa e alguns subintelectuais, com ignorância alastrante, tentaram ver o "rolezinho" como manifestação da...
FOLHA DE SP - 02/01 O objetivo seria "tumultuar, pegar geral, se divertir, sem roubos". Assim é definido, por seus próprios participantes, o "rolezinho", que chegou a reunir 6.000 jovens da periferia numa única ocasião. No dia 7 de dezembro, foi esse...
Do blog de José Dirceu: A maneira de reagir a manifestações e fenômenos de comportamento revela muito sobre setores da sociedade. Com o rolezinho não está sendo diferente. A resposta dada ao movimento de jovens que se reúnem para dar um “rolê”...
Por Glauber Piva Em dezembro do ano passado escrevi sobre a relação entre a classe média brasileira e a política. Naquele momento, como o principal debate se dava em torno da proposta de Fernando Haddad de alteração na base de cálculo do IPTU em...