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Saúde e doença política nos EUA - VINICIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SP - 02/10
Fundamentalistas de direita americanos parecem não ter objetivo prático a não ser barbarizar
UM BRASILEIRO sente-se meio esquisito de dizer que a política parlamentar americana tornou-se selvagem desde a eleição de Barack Obama. Nem se pode dizer que tenhamos telhado de vidro, fácil de quebrar a menor das críticas, que seriam tantas. Nós nem ao menos temos um telhado.
Mas trata-se de selvageria a guerra sem limites nem fundamentos que o Partido Republicano move contra Obama. O presidente é, com boa vontade, um político de centro. Ou melhor, seria de centro, segundo critérios válidos pelo menos até o surgimento de uma direita extremista de peso, o Tea Party, que esticou o espectro político de tal modo que chama Obama de socialista.
Os economistas de Obama, grosso modo, são da mesma escola da turma que assessorou Bill Clinton, o presidente "terceira via", amiga da finança desembestada, "de direita" para o padrão que vigia no Partido Democrata até o início dos 1970.
Obama decerto propôs esse seu plano de subsidiar seguro-saúde para uns 30 milhões de pobres desassistidos. Mas trata-se de pequeno reparo no vexame de o país mais rico do planeta ter o pior sistema de saúde do mundo civilizado, apesar de ser o mais gastador na área (tanto na despesa privada quando na do governo). O setor público americano gasta, em termos de PIB, quase o mesmo que a "socialista" França em saúde.
Obama deu um tempo nas guerras do Oriente Médio-Ásia em parte porque o governo federal está sem dinheiro. Deu cabo de algumas violações piores que armas e agentes americanos cometiam contra o direito internacional, mas nem tanto assim. Seu governo, enfim, não tem marca afora esse plano de saúde.
O gasto público e os deficit fiscais explodiram sob seu governo (aliás, no fim do governo de George W. Bush) porque o Estado teve de limpar a lambança promovida pelos financistas. Não promoveu um avanço do Estado sobre cofres e direitos individuais. A política fiscal de republicanos como Ronald Reagan e George Bush foi muito mais folgada, para não dizer francamente irresponsável. Reagan promoveu a maior gastança e os maiores deficit depois da Segunda Guerra.
A direita republicana não pode racionalmente bater em Obama devido a ideologia macroeconômica.
Obama é ligeiramente pró-minorias (gays, não brancos etc.), mas mais no gogó do que na prática. É ligeiramente ambientalista, mas não barrou os avanços da exploração do petróleo. Muito difícil dizer que Obama cria problemas para o "big business". Ao contrário.
Com qual objetivo um partido chantageia o governo com chicanas baixas, prejudica diretamente sua economia e cidadãos e litiga de péssima fé a céu aberto? Apenas para derrubar uma lei aprovada pelo Congresso, referendada pela Suprema Corte e, politicamente, pela reeleição de Obama? Ainda que Obama fosse o novo Roosevelt (rir, rir, rir), não faria sentido pragmático, ao menos.
Obama decerto é negro, estudou em grandes universidades, é da elite ilustrada. É por isso? Algo teratológico aconteceu em parte da cultura americana, no Sul mais pobre, celeiro do fundamentalismo político e sociocultural, que está arruinando a governabilidade dos Estados Unidos (alguém aí acha que menos partidos resolvem alguma coisa?).
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