T-o-l-e-r-â-n-c-i-a
Geral

T-o-l-e-r-â-n-c-i-a


Uma das minhas obrigações perante o Estado francês para permanecer no pais estah em assistir dois dias de palestra sobre a cultura francesa, como os direitos trabalhistas, o sistema de saude, o funcionamento escolar, os direitos e deveres do imigrante etc. Para esse evento, realizado hoje e amanhã, foi contratato um tradutor português especialmente para minha pessoa. O nome dele é M. e eu o conheci no dia em que fui assinar o Contrato de Integração e Acolhimento. Ele foi meu intérprete na ocasião. Agora, meses depois, nos encontramos de novo. Ele é pernambucano e, de cara, nos demos muito bem porque... Bom, ele é pernambucano.

Apesar de M. ser legal e da gente se dar bem e de conversar bastante sobre qualquer assunto e de até nem ficarmos constrangidos no silêncio, desconfio gravemente que não seriamos assim, chegados, se tivessemos nos encontrado em outra situação que não a do estrangeiro. Seguinte: a sala da palestra era composta de arabes, arabes e arabes. E eu (das 25 pessoas na sala, eu era a unica não-arabe). Aos dois minutos do primeiro tempo, M., quando foi se referir aos arabes, soletrou a palavra: "os a-r-a-b-e-s..." e eu fiquei sem entender o porquê de tanto segredo. Na segunda, na terceira e na quarta vez, ele usou "esse povo" pra se referir aos, err... a-r-a-b-e-s. (Shhhi!) Comecei a achar que ele tinha problemas com os arabes quando a expressão foi mudando de cor e de tom, quando "esse povo" se transformou em "ESSE POVO!" com direito a entortada de nariz. E, obviamente, eram sempre frases negativas e, as vezes, desconexas. Eu:

- Tu acha que todo mundo aqui (olhando pros arabes) é casado com francês? Ou eles assinam o Contrato porque trabalham na França?
- Menina, esse povo não é casado com francês não! Err, teu marido é francês-francês? Hum! Então, esse povo casa com francês e traz a cultura deles pra cah e depois enchem a boca pra dizer que são casados com franceses!
- (Eh o que, homi?)
- Eles casam com um francês que passou a vida toda lah. Eles passam a vida toda lah e depois vem pra cah com a cultura deles e não se adaptam! Entendeu?

Não.

Depois de uma certa confiança, M. foi rebaixando os arabes e dizendo que era dificil competir com eles porque essa gente soh da emprego pro povo deles. E era um tal de essa gente! pra cah e esse povo! pra lah e eu comecei a achar que os arabes pro M. eram assim, gente de outro mundo, de outro universo, quem sabe nem eram gente.

Eh incrivel como francês e arabe aqui não se mistura. E a resistência, a meu ver, vem de ambos os lados. Outro dia, quase tive um ataque cardiaco ao acompanhar um topico 100% brasileiro no Orkut sobre a presença arabe na França. A questão era sobre adaptação e, à certa altura, uma fulana comentou que ela fazia o maior esforço pra se adaptar à cultura francesa e achava que, se os arabes não conseguiam se adaptar aqui, eles deviam voltar pra terra deles!

Sabe, por exemplo, essa terra?

A fulana falou que ela teve que se adaptar às formas de redigir um trabalho no computador (por exemplo, ao escrever em francês, a gente deixa um espaço entre a ultima palavra e o ponto de interrogação. O mesmo serve para o sinal de dois pontos). Ela também teve que se acostumar com a agua daqui, que é diferente. Ela teve que se acostumar a um bocado de coisa, minha gente. Eu fiquei com pena dela, quase não consegui dormir naquela noite pensando o quanto deve ser duro pra ela apertar a barra de espaço toda vez que precisa colocar o ponto de interrogação. Deve ser horrivel.

COMO eu posso comparar minha adaptação na França com a adaptação de um arabe aqui? Pra mim, a coisa mais dificil de assimilar até agora na França é o fato de que minhas chances de ser estuprada ou assaltada aqui são quase inexistentes. Foi o maior choque cultural. Eu não precisei deixar minha religião fora do meu lugar de trabalho, de estudo, eu não precisei aprender outros codigos linguisticos, outros codigos juridicos, outros codigos... sociais. Não, não defendo a isolação do arabe na França. Até porque deu uma peninha tão grande quando aquela mulher de 50 anos me parou no Leader Price pra saber qual o produto era mais barato, se aquele de 85 centavos ou o de 92!

Tah dificil. Se um imigrante não pode compreender a situação de outro imigrante, o que porra eu posso esperar dos franceses?




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