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Tempos líquidos - MIRIAM LEITÃO
O GLOBO - 29/08
O Copom elevou, de novo, em meio ponto os juros, mas diante de um cenário mais difícil, mais incerto, e com o mercado piorando todas as previsões. Desde a última reunião, o dólar subiu 3,43% - e chegou a picos mais altos - mas, principalmente, o ambiente se deteriorou com a disparada da moeda americana nas últimas semanas. Agora, uma nova incerteza, a geopolítica, com o risco de guerra na Síria.
Uma coisa é o dólar mais alto, outra é o câmbio instável porque ele aprofunda a incerteza, paralisa as decisões, assusta o investidor. Com a pressão do câmbio, a inflação sobe, com mais inflação os juros terão que subir mais, e isso apesar de o país estar crescendo menos. Esse é o quadro sobre o qual o Banco Central tomou sua decisão sobre o dilema: subir de novo os juros, correndo o risco de deprimir mais a economia; não subir juros incentivaria o repasse do custo cambial para os preços. E como se não bastasse, a crise da Síria aumentou o grau de incerteza no mundo.
Por isso, a aposta geral era mesmo que o BC iria elevar a taxa de juros para 9% ao ano. Ao final da última reunião, muita gente achava que essa seria a última elevação da Selic e que, depois, o Banco Central esperaria os efeitos do aperto da política monetária. Agora, a previsão mais comum é de nova alta na próxima reunião.
O Focus esta semana previu uma taxa de juros de 9,5% ao final do ano, uma inflação maior, de 5,80% (contra 5,74% da última semana) e IPCA de 5,84% no ano que vem. O Focus registra uma previsão em andamento. Como nem todas as cem instituições pesquisadas revisam suas previsões toda semana, o importante é olhar mais a tendência das projeções. E o que elas mostram é uma inflação que este ano será maior do que a de 2012 e a do ano seguinte também. Sempre em torno de 6%. Uma taxa alta assim é afetada por qualquer choque externo.
É bom lembrar que parte da inflação está reprimida porque o governo não tem permitido elevação de tarifas que ele controla. Isso está produzindo distorções, e a mais óbvia delas é na Petrobras. Com a piora nas contas da companhia, a relação entre dívida e geração de caixa está se deteriorando a cada dia. Com o dólar alto, o custo com a importação tem produzido prejuízo à empresa. Com a incerteza em relação à Síria, o petróleo começou a subir. Isso piora a situação.
A previsão do PIB continua em torno de 2,2%, mas o mais impressionante foi a queda vertiginosa, confirmada no dado do BC divulgado esta semana, da previsão de crescimento do PIB para o ano que vem. Na pesquisa da segunda-feira, estava em 2,4%. Em 31 de maio, em 3,4%. Em três meses, caiu um ponto percentual a previsão para o crescimento da economia em 2014.
Mas o Banco Central enfrenta outras dificuldades na sua atuação. Continua a falta de confiança na política fiscal e o expansionismo parafiscal do governo. A inflação reprimida dos preços administrados pode continuar sendo empurrada com a barriga, mas se a moeda americana continuar subindo, fica difícil adiar muito o reajuste da gasolina. Se preços mais realistas são desejáveis, por outro lado, a taxa mais alta exigirá mais elevação de juros.
O Banco Central, por outro lado, será ajudado pelo mais indesejável dos aliados: o baixo crescimento. Com a demanda fraca e o governo sem margem de manobra para novos incentivos ao consumo, os empresários não poderão repassar todo o impacto do dólar que gostariam. O repasse do câmbio aos preços de varejo será mais lento e mais fraco.
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