a, é o diretor Henrique Goldman. Como diretor não posso julgá-lo, porque nunca vi nada dele. Mas ele é também colunista da Trip, e escreveu aquele texto revoltante sobre a empregada que ele e um amigo estupraram, quer dizer, “convenceram” (apesar do “você não queria, Luisa”), quando eram jovens (e ainda tinha aquele adendo da Trip dizendo como hoje Henrique “é mais jeitosinho com as mulheres”. A cereja no bolo). A repercussão foi grande, revista e colunista vieram com uma desculpa esfarrapada que aquilo era ficção, não realidade, e imagino que todas as mulheres (em sua maioria) que reclamaram foram taxadas de histéricas com tempo demais de sobra. Uma das coisas que me mais me indignaram no texto, além do autor fazer pouco do estupro de Luisa, foi um ódio contra o Brasil. A culpa por dois adolescentes estuprarem a empregada foi deste país desigual! O
lha, eu posso dizer isso, Luisa pode dizer isso, considerando como esse tipo de comportamento “casa grande e senzala” é comum no Brasil, mas é revoltante um carinha que cometeu tal ato culpar o sistema, pra não ter que culpar a si mesmo. O filhinho de papai, nascido em berço de ouro, reclamando do que ele fez a Luisa, é muita hipocrisia pro meu gosto.
so de Jean Charles), assassinado pela polícia. Mas se a gente for ver só por esse ângulo, nenhum cineasta brasileiro (aliás, de lugar algum) pode filmar histórias de gente miserável. Porque quem faz cinema (que é a arte mais cara que existe, disparado) é classe média pra cima. É o poder dominante, o que também explica como a vasta maioria dos diretores no Brasil e no mundo é composta por homens brancos. Se fosse por aí, Walter Salles (herdeiro do Unibanco) não poderia ter feito Central do Brasil, e Fernando Meirelles (publicitário bem-sucedido), não teria realizado Cidade de Deus, entre tantos outros.
va no trailer de unir os dois mundos, de dizer que brasileiro no exterior é tudo igual. E essa tentativa de aproximação é importante porque, assim como quem faz cinema é classe média pra cima, quem vai ao cinema também é. Não é todo mundo que pode desembolsar entre 10 e 25 reais por duas horinhas. Eu fiquei um pouco desconfortável com o trailer porque esse público, do qual faço parte, tem uma tendência a considerar brega o que os pobres fazem. Tipo gostar do Sidney Magal, sabe? Não sei se o longa levará esse passatempo de “rir dos pobre
s” adiante, mas eu vi brotar uma sementinha dessa possibilidade no trailer. Uma pessoa de classe média vai achar graça de um pobre encher a boca pra falar de um utensílio doméstico.
egui. Era aquilo: o que uma celebridade precisa fazer de ruim pra eu boicotar sua obra? O Sean Penn foi um notório espancador de mulheres, e hoje eu e um monte de gente gostamos dele pela sua postura pró-minorias (ele até foi a Nova Orleans socorrer as vítimas do Katrina). O Polanski, se não estuprou uma menina de 13 anos, deu álcool a ela e se aproveitou da fama pra transar com, pô, uma menina de 13 anos. Mas eu ainda assim considero o Polanski um dos grandes diretores da história d
o cinema. E o Michael Jackson? Tremendo de um esquisitão, provável molestador de meninos... Mas o cara dança e canta bem pacas. Quanto tempo demora pra gente perdoar uma celebridade que fez algo muito errado? No caso do Henrique, que nem é exatamente uma celebridade, mas escreve pra uma revista e é cineasta, o problema não foi tanto ter estuprado a empregada quando ele tinha 14 anos. Foi fazer pouco do episódio três décadas depois, provando que ele era e continua sendo um boçal. Trinta anos de vida não foram suficientes para que ela amadurecesse. Mas boicotar um filme porque eu não gosto do direto
r? Tudo bem, eu não chego perto de um livro se não gosto do escritor. Mas cinema é um meio muito mais coletivo. Eu estaria “punindo” também o Selton Mello e o resto do elenco, o editor, o diretor de fotografia, e uma trama (sobre o imigrante morto pela polícia no metrô de Londres) que me interessa. Não, acho que não vou fazer isso.