Estou contrariando um pouco minha regra de saber o mínimo possível antes de ver um filme, mas é que Milk vai demorar tanto pra chegar que até lá a gente já esqueceu tudo. A estréia nos EUA tá marcada pro final de novembro (desde já uma produção que vai receber a atenção do Oscar), e no Brasil só Deus sabe. Como a gente só verá este drama do Gus Van Sant (Elephant, Gênio Indomável) provavelmente daqui a um ano, tomei a liberdade de aprender mais sobre o assunto. A propósito, o protagonista será encarnado pelo sempre ótimo Sean Penn, e também estarão no elenco Emile Hirsh (Na Natureza Selvagem), James Franco (Homem
Aranha), e Josh Brolin (Onde os Fracos Não Têm Vez).
Semana passada vi o documentário The Times of Harvey Milk, de 1984. Eu também nunca tinha ouvido falar no cara, mas a história real é a seguinte: em meados da década de 70, esse comerciante abertamente homossexual conseguiu ser eleito supervisor do bairro mais gay de São Francisco, o Castro. Havia um prefeito geral e uns cinco supervisores, cada um pra um distrito. Hoje deve ser banal, mas Milk foi o primeiro supervisor gay, e aparentemente o primeiro homem assumidamente gay a ser eleito pra qualquer cargo público no mundo. Um supervisor de outro distrito era um tal de Dan White, um ex-bombeiro, ex-policial, e jovem homem de família, católico devoto, que
achava que São Francisco estava se deteriorando. White havia renunciado ao seu posto devido ao baixo salário, mas queria voltar, o que o prefeito recusou. Um dia, White entrou pela janela da prefeitura, discutiu com o prefeito (também hetero), e o matou com cinco tiros. Foi à sala de Milk e o matou com o mesmo número de tiros. Em seguida se entregou à polícia.
Embora a Califórnia adote a pena de morte, White não foi executado. Um júri todo branco e hetero, a maior parte do mesmo distrito de White, acatou a defesa que ele estava deprimido e estressado, inclusive por ingestão exagerada de açúcar (o que ficou conhecido como Twinkie Defense – Twinkie é uma barrinha de chocolate). Além disso, apesar de White ter entrado pela janela da prefeitura pra evitar o detetor de metais e de estar carregando balas extras pro revólver (ninguém fala do fato d'ele andar armado, porque é a América - todo mu
ndo faz isso), o júri não viu premeditação no crime. White foi condenado a menos de oito anos de prisão. A comunidade gay, que havia feito uma vigília pacífica pra marcar a morte de Milk, revoltou-se e entrou em confronto com a polícia. White deixou a cadeia após cinco anos de pena. Suicidou-se pouco depois, em 85.
Acredita-se que, se White tivesse matado apenas o prefeito de São Francisco, ele teria recebido uma sentença mais dura, talvez até a pena capital. O assassinato de Milk serviu como atenuante! A gente quer crer que uma loucura dessas não aconteceria agora, três décadas depois. Mas é bom que Hollywood faça um filme pra nos informar sobre essas atrocidades.