SOU PARTE DO MEU PAÍS
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Emoção! E estamos apenas no começo...

Fiz muitas amigas queridas quando morava em Floripa e cursava mestrado e doutorado, e sinto falta delas, mas não é disso que quero falar. É que, de praticamente todas as amigas que fiz, nenhuma votava. Elas não transferiam o título pra onde moravam. A maior parte era politizada e de esquerda, e mesmo assim, não votava. Tudo bem, Floripa era um lugar meio de transição, onde se ficava apenas dois ou quatro ou seis anos, enquanto cursávamos a pós-graduação. Mas dois anos é ano pra caramba, não? Dá pra votar pelo menos uma vezinha em dois anos.
Creio que votar é algo tão valioso pra mim porque voto faz pouco tempo. Como toda a minha família, eu nasci na Argentina. Viemos pra cá em 1971, e só eu me naturalizei. Fiz isso principalmente porque me sentia uma cidadã de segunda classe por não poder votar. Não importa ter carteira de residente permanente e me considerar brasileira. Em 98, quando finalmente me naturalizei (custa caro, dá um trabalhão, é uma burocracia imensa), pude ir às urnas. E foi uma alegria só.
O pessoal mais jovem encara a democracia como algo que está e vai ficar aí, não como algo que teve que ser conquistado. Não podemos esquecer que o Brasil (assim como tantos países pobres) ficou 28 anos sem ter eleições presidenciais. A última vez antes do golpe militar foi em 1961. Daí, apesar de um montão de gente lutar pelas Diretas Já, em 83-4 (e eu e minha família estávamos lá, na Praça da Sé, com muito orgulho, vestindo a camisa amarela e insistindo “Eu quero votar pra presidente”), esse direito nos foi negado. Foi um colégio eleitoral que escolheu Tancredo Neves, não o povo. Tancredo morreu antes de assumir, veio o vice, Sarney, e só tivemos eleições de fato em 1989. E então ganhou o candidato da elite, criado e impulsionado pela grande mídia, o Collor. Mas foi por uma pequena margem de votos, se é que isso serve de consolo.
Desde aquela época Lula foi candidato a presidente. E, em todas as eleições que ele participou (89, 94, 98, 2002, 2006), eu sempre ouvi o mesmo discurso: “Se Lula ganhar, o exército não deixará que ele assuma / governe”. Sempre. Aquele comercial da Regina Duarte dizendo “Eu tenho medo” foi apenas a materialização desse medo (ou torcida?). Imagina se em democracias consolidadas alguém diria que tem medo de golpe se um candidato for eleito. Em inglês não existe nem palavra pra golpe de estado (eles usam o francês, coup d'état, se bem que americano pode não ter experiência com golpes no próprio território, mas é expert em patrocinar golpes em territórios alheios).
O que os falantes da língua inglesa tem, e nós não, é uma expressão que faz falta: o “take for granted”. Os jovens brasileiros take for granted (não dão a devida importância) que votar é algo fundamental. É o voto que garante a democracia. Não vou nem entrar no mérito do voto ser obrigatório, pois não tenho opinião formada sobre se seria bom que o voto fosse facultativo. Mas pense: quem deixaria de votar se o voto não fosse obrigatório? Pessoas que não se sentem cidadãs, que acham que um voto só não faz diferença, que acreditam que político é tudo igual e nenhum presta. Mas políticos não são alienígenas. Eles são gente como a gente, apenas com uma conta bancária muito maior, dependendo do partido. Se há tantos políticos corruptos, é porque nós do povo também somos corruptos. Ainda somos o país do jeitinho, do “importante é levar vantagem em tudo, cerrrto?”. De quem joga lixo na rua, de quem não respeita faixa de pedestre, de quem bebe e dirige, de quem suborna o guarda ao ser pego cometendo alguma infração. E a gente se espanta que tantos políticos se comportem mal?!
E somos também o povo que vota “por obrigação” e, no mês seguinte, mal se lembra em quem votou pra vereador e deputado. Não fiscalizamos. Não ligamos. Votamos em indivíduos, não em partidos, mesmo que esses indivíduos venham de uma plataforma específica e quase sempre legislem de acordo com os interesses do partido. Bah, nem sabemos os nomes dos partidos! Votamos em números: 13, 45, 15, 11, 25...
Claro que nem eu nem minhas amigas somos assim. Somos cidadãs, respeitamos a lei, amamos o nosso país. Mas elas não votavam. Não se davam ao trabalho de ir até um cartório eleitoral e transferir seu título para Floripa. Preferiam ter que se dar ao trabalho de justificar sua ausência a cada eleição.
Eu segui votando porque nos fins de semana eu sempre estava em Joinville. Em 2008, infelizmente, não pude votar, porque bem naquele dia estava voltando de um congresso na Argentina. Passei o dia inteiro em aeroportos e rodoviárias. Mas no segundo turno eu tava lá, na escola perto da minha casa, com um sorriso no rosto, escolhendo o meu prefeito. Uma decisão histórica, aliás: foi a primeira vez que o PT ganhou a prefeitura em Joinville, a maior cidade do Estado.
Antes de vir pra Fortaleza, comuniquei ao maridão que, tão essencial quanto comprar nossa casa, seria transferir nosso título. Não quero perder a eleição deste ano de jeito nenhum. Será a primeira vez em que votarei numa mulher pra presidente. Pô, será a primeira vez em que votarei em alguém que não seja o Lula! Vai ser emocionante. E tudo que temos que fazer é ir a um cartório eleitoral com nossa carteira de identidade, nosso título de eleitor e ― o mais difícil ― nosso comprovante de endereço. Só agora conseguimos algo em nossos nomes (uma conta de água pra mim, uma conta de telefone pro maridão). Comprovante residencial pode ser duro de conseguir pra quem vive de aluguel, eu sei (caso das minhas amigas em Floripa). Lembro quando tive que comprovar residência pra ter desconto em passe de ônibus. Levei uma conta e a carteira de identidade da proprietária da casinha que eu alugava, além de uma declaração assinada por ela dizendo que sim, eu morava lá. Não é fácil não. Mas definitivamente vale o esforço.
Se você não transferiu seu título, faça isso até 5 de maio (depois de amanhã!). Se você tem 16 anos e ainda não pegou seu título, o que você tá esperando? Somos nós que decidimos uma eleição. Antes de “take for granted” o direito a voto, vale lembrar que a gente, que é mulher, só conquistou o direito de votar na década de 1920. Não tem nem cem anos!




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