Editorial do sítio Vermelho:
Na sequência das manifestações de massas que mobilizaram multidões nas ruas e praças de todo o País durante o mês de junho, o Brasil está agora imerso em importante embate político e social pela realização de reformas estruturais.
A primeira delas tem caráter institucional e atinge o sistema político e eleitoral do País. Em boa hora, numa demonstração de compreensão do sentido mais profundo das manifestações – o clamor da população por mais democracia e pelo efetivo combate aos vícios das classes dominantes no exercício de mandatos eletivos e administrativos – a presidenta Dilma propôs a realização da reforma política e eleitoral.
Como método, a presidenta apresentou propostas que, por princípio e essência, buscam a legitimidade na consulta organizada à população, o que também significa um grau superior de participação popular na condução dos destinos do País. A ideia original do Palácio do Planalto combinava a convocação de um plebiscito e de uma Assembleia Constituinte específica para a elaboração e decisão da reforma política.
A estridência com que a mídia privada e monopolista, alguns setores do Judiciário e partidos políticos – não só os oposicionistas, mas também algumas importantes siglas da base de sustentação do governo – bombardearam a proposta da Constituinte específica, fizeram a mandatária voltar atrás neste aspecto.
A diretriz de fazer o plebiscito, contudo, está de pé, alcança maior aceitação e apenas duas ou três siglas oposicionistas não a apoiam. Nos últimos dias, o governo conseguiu unificar os partidos de sua ampla, diversificada e heterogênea base em torno da proposta e as medidas nas áreas do Executivo e do Judiciário para fazê-lo em tempo hábil a que a reforma política tenha validade já nas próximas eleições de 2014 estão a pleno vapor.
Destaque-se a formação de uma frente de partidos de esquerda da base de sustentação do governo, que anunciou a disposição de atuar unida em torno do tema.
Tem o país uma importante oportunidade de, ao acionar um mecanismo de democracia direta, dar o ponto de partida para realizar uma reforma política realmente democrática e que seja capaz de soerguer outro sistema político eleitoral, em face da evidência de que o atual está inteiramente superado.
Resolvida a questão do método, já se desenvolve uma frontal luta política em torno do mérito da reforma institucional-eleitoral, luta que doravante será ainda mais intensa. O Brasil pode estar no limiar de uma nova fase de seu desenvolvimento político, de aprofundamento e ampliação da democracia, de elevação dos níveis de participação popular na vida política e na governação do país, mas pode também sofrer grave retrocesso se a reforma política for pautada pelo pensamento conservador e antidemocrático.
Por meio da mídia privada, os conservadores semeiam confusão política e ideológica e criam um ambiente para a rejeição “à política” e “aos políticos” de uma maneira geral, como se a má gestão, a corrupção, a locupletação, a prevaricação e a traição à vontade popular fossem características indistintas da ação política. Com base nisso, pregam a redução pela força do número de partidos, por meio da adoção de normas eleitorais restritivas, como a cláusula de barreira, o voto majoritário (aqui chamado de distrital) para a eleição de representantes do povo nas casas legislativas e a proibição das coligações em eleições proporcionais. Deblateram contra as práticas espúrias e relações promíscuas entre agentes dos interesses privados e titulares de mandatos eletivos, mas nada dizem nem fazem contra o financiamento privado das campanhas eleitorais. Ao contrário, estigmatizam o financiamento público como se este fosse desviar recursos de outras áreas.
O busílis da questão se o sistema político e eleitoral será democrático ou não está no grau de participação popular e na representação do conjunto da sociedade. No quadro do Estado burguês, esta possibilidade será sempre relativa e restrita, mas não cabem dúvidas de que, em termos da “democracia” burguesa, não há sistema eleitoral mais democrático do que o que assegura o voto universal, direto, secreto e proporcional, com ampla liberdade de organização partidária, total autonomia destes na gestão de seus assuntos internos e sem cláusulas de barreira.
O sistema eleitoral proporcional é o que assegura a representação de todos os setores políticos, inclusive os minoritários, porque se baseia na distribuição das cadeiras de vereadores, deputados estaduais e deputados federais em proporção aos votos obtidos pelos partidos ou coligações partidárias.
O defeito do sistema proporcional brasileiro, que a reforma política e eleitoral pode corrigir, é que as vagas nas casas legislativas são atualmente preenchidas pelos candidatos mais votados da lista do partido ou coligação, até o limite das vagas obtidas, segundo o cálculo do quociente partidário e distribuição das sobras. É o sistema de listas abertas, pelo qual nas campanhas eleitorais prevalecem as individualidades e não as siglas partidárias.
Como não há democracia sem partidos sólidos e representativos, a reforma política e eleitoral deveria substituir a lista aberta por um sistema de distribuição das vagas a partir das listas pré-ordenadas pelos próprios partidos, em convenções democráticas ou primárias internas.
Ao contrário do que se propala, o sistema de votação proporcional não exclui, mas até pressupõe, as coligações partidárias. A união de partidos afins em frentes partidárias para efeitos de elevar o grau de intervenção política, potenciar a capacidade de obter maiores votações e eleger numerosas bancadas é direito democrático legítimo que a reforma política não deveria tolher.
Por fim, a reforma política deveria ter como uma das suas principais medidas a instituição do financiamento exclusivamente público das campanhas eleitorais, mediante critérios estritos e sob supervisão dos órgãos de fiscalização e controle da República ou outros que podem ser criados no âmbito da Justiça Eleitoral. Urge uma campanha de esclarecimento da opinião pública de que o financiamento privado das campanhas eleitorais é um dos principais instrumentos de corrupção e de submissão da vida política do País à vontade da plutocracia.
Com dez anos de vigência de governos democráticos e progressistas, o Brasil vive um paradoxo. Os poderes de fato ainda são exercidos pelas classes dominantes retrógradas. Uma reforma política democrática pode abrir caminho para outras e pôr nas mãos das forças progressistas novos meios de acumulação de forças na luta estratégica pela libertação social e nacional do povo brasileiro.
O GLOBO - 09/02O financiamento de campanhas eleitorais por empresas privadas está sendo fortemente contestado no Supremo tribunal Federal (STF) por uma Ação direta de inconstitucionalidade (ADI) da OAB que tem como...
GAZETA DO POVO - PR - 03/07 É preciso ouvir a voz das ruas, mas todos já sabem o que o Brasil deseja. Cabe aos parlamentares tomar para si a tarefa de fazer a reforma política, sem a necessidade de consulta popular O governo federal entregou ontem...
Por Antônio Augusto de Queiroz, na revista Teoria e Debate: O debate da reforma política ganhou impulso de novo no Congresso, com a Câmara e o Senado discutindo mudanças nos sistemas eleitoral e partidário, porém numa perspectiva de despolitização....
Editorial do site Vermelho: Um consenso entre aqueles que preocupam-se, sinceramente e não só em palavras, com o aprofundamento da democracia e da justiça social no Brasil, é a necessidade de elevar o nível de consciência política das massas. Para...
Mariana Serafini, no site da UJS: Recentemente a Coalizão pela Reforma Política Democrática e Eleições Limpas e a Campanha Nacional pelo Plebiscito Popular da Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político decidiram realizar uma ação conjunta...