A guinada silenciosa - CLAUDIA SAFATLE
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A guinada silenciosa - CLAUDIA SAFATLE


VALOR ECONÔMICO - 08/01

Riscos para a inflação só pioraram de dezembro para cá



A ordem no governo é estabilizar o crescimento. Fazê-lo parar de cair para, em um segundo momento, conseguir que a atividade econômica volte a crescer. Simultaneamente a essa tarefa, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, precisa se livrar da marca de "pai da nova matriz econômica" e conquistar credibilidade junto ao mercado. O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, nessa nova etapa do governo Dilma Rousseff, também não pode perder a margem de credibilidade que conquistou nos últimos tempos.

É assim, trilhando caminhos pantanosos que ambos, Barbosa e Tombini, vão buscar tirar a economia brasileira do fundo do poço em que se encontra.

A troca de Joaquim Levy por Nelson Barbosa significa mudança, mas esta deverá ser uma "guinada silenciosa", na visão de um atento observador da política econômica. Silenciosa porque nada será feito de forma escancarada nem o governo vai se aventurar em medidas tresloucadas.

A engenharia montada para o pagamento das "pedaladas", que levou o Tesouro Nacional a irrigar com R$ 55,8 bilhões o BNDES, o Banco do Brasil, a Caixa e o FGTS é um modelo que pode inspirar novas decisões. Algo que não seja nem tanto ao mar nem tanto à terra.

A operação de "despedalada" aparentemente não tem impacto fiscal futuro. Mas se os recursos forem usados para reforçar a carteira de empréstimos dos bancos públicos, como indica o governo, significará uma conta de subsídios à frente. O BNDES, por exemplo, emprestará com base na TJLP, taxa de juros de longo prazo de 7,5% ao ano.

Levy não queria pagar os R$ 22 bilhões ao FGTS de uma só vez, como fez Barbosa. E queria que o BNDES devolvesse os R$ 30 bilhões de aporte do Tesouro que não foram emprestados. Na operação feita, porém, o BNDES só pagou R$ 15 bilhões à União. O que o FGTS fará com os recursos recebidos não precisa ser decidido de imediato, porque o fundo tem orçamento para a primeira metade do ano.

O Comitê de Política Monetária, no entanto, pode ser um entrave na estratégia de estabilizar o crescimento. O Banco Central sentiu, nos últimos dias, a pressão que vem do PT e de ministros do partido com gabinete no Palácio do Planalto para parar de elevar a taxa básica de juros e, de preferência, começar a cortar a Selic, hoje em 14,25% ao ano.

A próxima reunião do Copom, nos dias 19 e 20, será a primeira após a troca de comando da Fazenda. No dia do anúncio da substituição de Levy por Barbosa, o BC divulgou nota adiantando que a mudança "não representa qualquer mudança na política monetária em curso". Desde a ata da reunião do comitê de novembro o BC vinha afirmando que faria o necessário para levar a inflação para o intervalo da meta em 2016 e para a meta de 4,5% em 2017. O mercado entendeu que a retomada do ciclo de aperto monetário ocorreria na reunião deste mês.

Nos últimos dias, porém, restabeleceu-se a dúvida sobre se o Copom vai aumentar a Selic. Diante das notícias de que o Palácio do Planalto não gostaria de ver os juros em alta e de temores relativos à nova posição de Barbosa no governo, a presidente Dilma Rousseff foi perguntada e respondeu a jornalistas ontem, durante café da manhã, que "ninguém no governo, a não ser o presidente do BC, está autorizado a falar sobre juros". Resposta semelhante foi dada no dia anterior pelo ministro da Fazenda.

No BC, a informação é de que sobre esse assunto vale o que está escrito na última página da apresentação do relatório de inflação, dia 23 de dezembro: "Independentemente do contorno das demais políticas, o Banco Central adotará as medidas necessárias de forma a assegurar o cumprimento dos objetivos do regime de metas, ou seja, circunscrever a inflação aos limites estabelecidos pelo CMN, em 2016, e fazer convergir a inflação para a meta de 4,5%, em 2017".

Do dia 23 para cá a taxa de câmbio teve mais uma rodada de desvalorização, indo para a casa dos R$ 4, os preços dos alimentos estão em alta e os transportes urbanos de dez capitais tiveram aumento, decisão que o BC não esperava para um ano de eleições municipais. Pioraram, assim, as fontes de pressão sobre uma inflação que deve ter encerrado o ano de 2015 em 10,8%. Hoje o IBGE divulga o IPCA do ano passado e, a partir daí, a qualquer momento o Copom divulgará carta aberta ao ministro da Fazenda para explicar as razões do não cumprimento da meta (cujo teto é de 6,5%) em 2015. Descreverá, também, a estratégia para forçar a convergência da inflação para o intervalo da meta em 2016 e para a meta de 4,5% em 2017. A carta será publicada antes da reunião do comitê.

Se a decisão for de não subir os juros este mês, a comunicação do Copom terá que ser bem construída para não alimentar a ideia de que a mudança do comando da Fazenda representou, também, a flexibilização da política monetária. Uma interpretação que não melhoraria a credibilidade de Barbosa e minaria a de Tombini.

Nos prognósticos de grandes bancos, a variação do IPCA será de 0,95% em janeiro e de 0,80% em fevereiro. A taxa de 12 meses deve ficar acima de 9% até abril para então começar a cair.

Economistas do setor privado se dividem, hoje, em relação ao juros. Não será necessariamente um erro o Copom não elevar a Selic mesmo com pressões adicionais sobre a inflação, dado o tamanho da recessão e da crise política que se arrasta desde o ano passado. O erro maior, na visão desses profissionais, é estar com uma política fiscal flexível e a monetária restritiva, enquanto a situação do país requer exatamente o contrário.

A hora da verdade para Barbosa será em meados de fevereiro, quando ele terá que apresentar o decreto de contingenciamento do orçamento tendo como objetivo o superávit primário de 0,5% do PIB. Essa decisão vai preceder o desfecho do processo de impeachment, cuja votação no plenário da Câmara é prevista para abril. Isso obrigará o governo a assumir compromissos sem saber com que forças políticas poderá contar. Se o primeiro sinal da política fiscal, em fevereiro, for crível, com a demonstração de receitas compatíveis com as despesas, o ministro terá vencido bem a primeira etapa.

Toda a estratégia está sendo traçada sem que se considere novas turbulências vindas de fora. O agravamento da situação da China, com o desaquecimento da economia sendo mais forte do que imaginado, não é parte do cenário. Mas, se ocorrer, muda tudo, a começar da taxa de câmbio.





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