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A nota e os fatos - MÍRIAM LEITÃO
O GLOBO - 04/10
Ninguém liga para as notas das agências, exceto os investidores. E aí é que mora o perigo. Eles tiram recursos de países que são rebaixados, e o alerta de quarta-feira foi que isso pode acontecer com o Brasil. Eles encarecem o custo de crédito para as empresas e isso pode afetar a Petrobras, já endividada. E o aviso foi que se o Brasil for rebaixado a Petrobras cairá mais.
As agências sempre escalam. A Moody´s começou na quarta mudando apenas um sinal na nota do Brasil. O país ficou com o mesmo rating, mas eles admitiram que não estavam mais otimistas. Ontem, a nota da Petrobras caiu e a perspectiva de vários bancos foi alterada de positiva para estável. Uma das razões, no caso da Petrobras, é a relação siamesa da estatal com o governo. Intervenção reduz a capacidade da empresa de geração de caixa e ela terá que gastar mais para cumprir obrigações impostas pelo governo.
Não é grave a mudança de sinal na nota de uma das agências de risco, o que preocupa é tudo o que ela arrolou como razão para a pequena alteração feita. Até no caso da Petrobras, não é o fim do mundo: foi rebaixada para Baa1, mas continua grau de investimento.
Governos costumam comemorar promoções das agências e desdenhar as quedas lembrando que elas erram demais nas suas notas e previsões. Erram mesmo. Mas suas classificações são usadas pelos grandes fundos de investimento para as suas decisões sobre onde aplicar o dinheiro.
A Moody´s, no relatório que fez, apresentou, para justificar a decisão, uma lista inegável de problemas. Um deles é o aumento da dívida bruta, que ocorreu mesmo nos últimos anos até no conceito do Banco Central - o do FMI dá um número pior.
O Banco Central adotou uma nova metodologia para a dívida bruta, em 2008, com dados retroativos até dezembro de 2006. Nesse período, o endividamento bruto do governo caiu ao menor nível em dezembro de 2010, último mês do governo Lula, quando foi a 53,35% do PIB. Mas, de lá para cá, houve um aumento gradativo da dívida, que chegou a 59,78% em novembro de 2012, e em agosto deste ano, último estava em 59,14%.
A agência disse também que o Brasil cresce pouco, 2% neste e no próximo ano. Bom, o Brasil não está sozinho nesse baixo crescimento, a questão é que há poucas razões para tão fraco desempenho.
O terceiro problema apontado pela agência é a perda da qualidade dos indicadores fiscais brasileiros e a continuação do endividamento público para alavancar as concessões de crédito através dos bancos públicos.
Tudo isso é fato e as coisas estão ligadas, de certa forma: o crescimento da dívida bruta tem sido alimentado pelos repasses aos bancos públicos. E o tamanho do problema tem sido escamoteado através da maquiagem nos indicadores das contas públicas.
No caso da Petrobras, a Moody´s citou o alto nível de endividamento da empresa, o baixo fluxo de caixa e o fato de a petrolífera ser usada pelo governo para controlar a inflação, sofrendo prejuízos com a importação e venda da gasolina e do diesel. A perspectiva continuou negativa, e quanto maior a ingerência do governo sobre a companhia, maior a chance de nova queda.
A agência tem razão. Há muito artificialismo em tudo. O saldo de crédito concedido pelas instituições financeiras públicas disparou 28% nos últimos 12 meses até agosto. No mesmo período, o saldo dos bancos privados nacionais aumentou apenas 5,3% e o dos bancos estrangeiros subiu 7,3%. Há três problemas nessa diferença de ritmo. Primeiro, os bancos públicos estão sendo empurrados para emprestar mais. Segundo, eles receberam aportes diretos do Tesouro. Terceiro, a pouca transparência sobre os custos das operações de crédito com grandes empresas. Quando elas entram em dificuldades, como acontece com o Grupo X, o contribuinte não tem o conforto da informação exata sobre quanto o governo está perdendo.
A Moody´s disse que alguns fatos que justificavam a perspectiva positiva do Brasil desapareceram. A taxa de investimento de 20,2%, em 2010, caiu para 17,6%, agora. Normalmente, países que têm a mesma nota que o Brasil têm taxas de investimento de 23,8%, em média. Na dívida bruta, os países com a mesma nota têm em média 45% do PIB e o Brasil está perto de 60%.
A agência empilhou inegáveis indicadores. Goste-se delas ou não, os números estão de fato ficando mais feios. E uma mudança de nota - que pode acontecer no futuro - pioraria a situação do Brasil, da Petrobras e de outras empresas.
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