Ao mestre com carinho
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Ao mestre com carinho


Professor piscante: bom sinal

Como eu disse aqui, hoje eu deveria apresentar um seminario sobre o Abbé Pierre. Na verdade, nao era bem sobre o cara, mas isso nao importa. O que também nao importa é que, como a sala é numerosa e nem todas as pessoas podem apresentar os seminarios, a professora divide os temas entre dois ou três alunos e, no dia da apresentaçao, ela faz um sorteio pra escolher quem deve apresentar. Aqueles que nao foram escolhidos pra fazer a apresentaçao devem entregar um trabalho escrito sobre o tema. Dessa forma, todo mundo se prepara pra o seminario. 

A professora dessa disciplina tem a fama de ser muito exigente. Exigente = grossa. Entao, eu que ja sou medrosa sem motivo, cheguei hoje na aula rezando forte pra nao ser a escolhida. A reza deu resultado. No meu lugar, uma coitada foi à frente da turma falar sobre Abbé Pierre e cia. No final da apresentaçao, a professora respirou fundo e começou:

"Vocês precisam deixar de lado essa mania de falar no futuro. Vocês sao historiadores, nao jornalistas. Como assim 'Abbé Pierre farah isso, farah aquilo'? Ele 'fez' isso, ele 'fez' aquilo. (...) Você fala demais 'personne'. E sua problematica? Nao tem nada a ver com uma problematica! (...)  Sua introduçao esta completamente confusa, você se perdeu entre dados e numeros. E sua conclusao nao corresponde ao que você disse durante o seminario"

Ela criticou ainda a menina por ela nao ter visto um filme que fala sobre o Abbé Pierre, disse que ela nao tinha se "doado pro trabalho". E ainda reclamou pelo fato da menina ter esquecido certas datas. Minha gente, vinte minutos seguidos de critica. Quando olhei pra menina, ela tava com cara de choro. Eu quase levantei da cadeira pra ir dar um abraço nela. Soh digo uma: me livrei de ter pago um micao chorando na frente de todo mundo. Foi duro. Inclusive, ela havia comentado comigo que mandou um email pra professora pedindo algumas dicas de livros pra fazer o trabalho e a resposta da professora foi simplesmente: "você nao tem capacidade de fazer uma pesquisa bibliografica?"

Meda.

Pra minha paz, essa nao é a unica professora que da coice. Mas da outra professora eu nao reclamo, porque a disciplina dela é feminismo puro, do começo ao fim, é lindo! Mas eu nao ouso abrir minha boca. Ela vive cortando os alunos, mas de uma forma grosseira mesmo. 

Outro dia, um desavisado foi inventar de dizer o que ele pensava sobre determinado assunto que estava sendo discutido. Infelizmente, a opiniao dele nao correspondia à opiniao da professora. Entao, ela olhou pra cara dele e disse:

- E o que você sabe sobre isso?!
- Eu nao sei, eu soh acho que...
- "Acha"? Acha o que? O que você sabe sobre isso?!
- O_o
- Você por acaso leu sobre isso?
- Nao... eu...
- Entao! 

Cri cri cri. 

O mesmo aluno, antes disso, tava comendo um sanduiche dentro da sala e ela disse "quando você vai terminar seu pic nic?". 

Uma aluna tava guardando o material dela quando a professora parou a aula e disse "mademoiselle, a aula ainda nao acabou, tenha respeito". E eu, louca, quando ainda nao havia testemunhado nada disso, fui perguntar a ela se eu poderia entregar um trabalho escrito no lugar de apresenta-lo como seminario.

- ...porque eu sou estrangeira, mimimi.
- E dai? Você pode fazê-lo mesmo assim! 
- Mimimi?
- Ok.

Eu devo ter feito cocô na calcinha depois que dei as costas a ela. Tenso! A de hoje foi ela escrachando os estrangeiros que entregam trabalhos com erro de ortografia. "Vocês tem o corretor! Coloquem no corretor!" Ela te corta se você fala, se você nao fala, se você come, se você respira, se você. 

Entao, é com muito orgulho que eu anuncio que eu ganhei uma piscadinha dela! Hihi Ela tinha falado de um mestrado lindo que eu queria muito fazer ano passado sobre trabalho e gênero, mas por haver a necessidade de um intercâmbio, eu desisti da idéia (desisti da idéia = nao passei :D). Mas o mestrado vai abrir na Lyon II e nao serao somente cinco vagas. Entao, achando que eu tinha alguma chance, fui falar com ela durante o intervalo da aula. Falamos durante uns dez minutos. Ela explicou o que eu precisava fazer. 

Quando voltamos à aula, uma menina começou a apresentaçao de um seminario sobre a Barbie (pois é...) e comentou que algumas até falavam. "Tem uma Barbie que diz que blablabli e isso deixou algumas feministas furiosas". Como eu nao entendi a frase, me virei pra Lucie e perguntei baixinho o que ela havia dito. A professora percebeu, levantou da cadeira e foi ao quadro escrever pra mim o que ela tinha dito: "a matematica é muito dificil". Quando eu li o que ela escreveu, olhei pra ela e ela deu um sorriso e uma piscadinha pra mim. Um SORRISO e uma PISCADINHA. Foi muita emoçao, meu povo. Pensando agora, acho que ela ta afim de mim. No final, os professores so querem que a gente mostre esforço e interesse pelo curso - e que a gente nao coma, nao fale e nao respire. 






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