Argentina, de volta para o passado - VINICIUS TORRES FREIRE
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Argentina, de volta para o passado - VINICIUS TORRES FREIRE


FOLHA DE SP - 26/01

Desvalorização forte do peso é o primeiro sinal de não há mais como remendar modelo econômico do país


EM BUENOS AIRES, diz-se que o verão de 2014 está com cara de anos 1980, "ochentoso", com apagões, preços tabelados, saques, inflação. Faltavam apenas uma desvalorização do peso e um tarifaço (alta de preços de serviços públicos).

A desvalorização não falta mais.

A inflação argentina foi de 28% no ano passado. Antes da desvalorização deste mês, estimava-se que seria de uns 35% neste 2014.

Os argentinos, como de costume, querem se livrar de seus pesos, que valem cada vez menos. Para quem tem algum dinheiro, isso significa comprar bens, até carros, e dólares. Não podem aplicar a juros? A inflação é maior que a taxa de juros. Poupar quer dizer perder dinheiro. A taxa real de juros é negativa.

Desde outubro de 2011, o governo vinha impondo cada vez mais restrições à compra e à saída de dólares. Restrições recentes, como impedir compras pela internet além de um valor ridiculamente baixo, ajudaram a detonar o pânico da semana passada. Apenas ajudaram.

É evidente a escassez de dólares. As reservas internacionais do país caem rapidamente. Reservas são um estoque de dinheiro em moeda forte ("dólares" e equivalentes financeiros), um colchão de segurança para pagar contas no exterior caso a entrada de dólares seque (ou que as saídas sejam bem maiores do que as entradas), grosso modo.

Governo e empresas argentinos pagam suas dívidas externas, os argentinos gastam mais em turismo e o comércio exterior rende menos desde a crise de 2008. Crescem menos os preços e as quantidades exportadas pelos argentinos, que importam mais, mas não só devido à crise. Faltam dólares.

A Argentina não pode "pegar dinheiro lá fora", financiar suas dívidas no mercado internacional, que não pode frequentar desde o calote da dívida, em 2001-2002.

O país ficou caro por causa da inflação alta. Parte da produção exportável foi desorganizada por intervenções desastrosas do governo na economia.

A inflação é alta e crescente em particular porque o governo passou a ter deficit depois de 2008, conta financiada loucamente pelo banco central. De modo simplificado, mas vá lá, para ser breve, o BC deles imprime dinheiro para bancar o governo.

Entre os motivos da alta do gasto público estão aumentos salari- ais, despesas sociais e o fato de o governo bancar, subsidiar, parte dos preços de energia e transporte público. Os subsídios passaram de quase zero em 2005 para mais de 4% do PIB em 2013.

Perda de reservas, procura excessiva de dólares, suscita medos de desvalorização da moeda e desvalorização, o que realimenta a inflação, o que cria expectativa de mais desvalorização. Etc.

Até 2007, segurar o preço do dólar era um modo de tentar segurar a inflação. Mas isso arrebenta a competitividade argentina (dólar barato, produto argentino caro).

Com menos dólares, de qualquer modo, a estratégia foi para o brejo. Desvalorizar é um início de mudança, mas, se vier mais inflação, de nada adianta. A Argentina terá de enfrentar alguma recessão (juro mais alto, menos gasto público, contenção de salários, alta de tarifas).

Mesmo depois do verão quente e "ochentoso", a coisa vai continuar quente e "ochentosa".




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