Não era sobre isso que eu ia falar. Queria indicar um texto em inglês analisando os uniformes dos homens e das mulheres na Olimpíada. Uniformes do mesmo esporte e do mesmo país diferem enormemente. Os dos homens são mais frouxos e com mais pano, enquanto os das mulheres são muito mais justos e tentam mostrar o máximo possível de pele. É só ver o vôlei de praia. No blog que indico há mais fotos lado a lado, pra que não fique nenhuma dúvida que a competência das mulheres nos esportes é secundária. O que importa é que elas sejam atraentes (repare nessa foto da bunda. É isso que sai na mídia internacional, ainda por cima associada à mulher brasileira).
Nos EUA pipocam textos escritos por homens concentrando-se na beleza das atletas. Um jornalista reclamou que os maiôs da natação, que são dos poucos uniformes parecidos para homens e mulheres, fazem com que as moças tenham pouco peito. Imagina que legal: você é uma atleta que vem treinando oito horas por dia nos últimos cinco anos. Você ainda será avaliada primeiramente pelo poder de atração que exerce sobre os homens. Nada é por acaso. Os americanos deram grande cobertura à nadadora Dara Torres, que ontem foi medalha de prata. Ninguém se cansa de repetir a surpresa por ela ter 41 anos, porque, com essa idade, uma mulher já está decrépita e não tem mais utilidade pública. Chegaram a falar que ela pode inaugurar um novo padrão de beleza pras mulheres mais velhas. Todas nós podemos ter o corpo dela, gente: é só viver exclusivamente pra isso, ter grande patrocínio, vir de família rica, e gastar mais de cem mil dólares por ano com uma equipe de nove pessoas, entre elas três técnicos e dois massagistas.
Aqui no Brasil essa ênfase à beleza das atletas não é diferente, tenho certeza, se bem que não estou acompanhando muito. Mas é sempre assim. Durante a cobertura de qualquer esporte feminino (que recebe a mesma falta de atenção aqui como nos EUA – pense bem: a gente praticamente só vê mulheres competindo nas Olimpíadas), as fotos e as matérias sempre falam da beleza da atleta. Ou você já leu algum artigo sobre a tenista Sharapova sem que viesse acompanhado, antes do nome dela, a palavra bela? O planeta é feito por homens pros homens, não tem jeito.
Nós mulheres também avaliamos o corpo dos atletas (e das atletas), como a Sarah do Shoe Me fez tão bem semana passada com o Phelps. Mas é totalmente diferente. Mulher avaliar corpo masculino é quase um ato de rebeldia. Homem avaliar corpo feminino é padrão, feito há milênios, e encorajado por todos na sociedade. Sabe, é como achar que é igual um negro usar uma camisa escrito “100% Negro” e um branco vestir a camisa “100% Branco”. Num caso é orgulho, noutro é racismo. Só acha que é igual quem ignora que existam contextos e grupos privilegiados. Sei lá, é como se, no mundo animal, uma vez na vida os leões, acostumados a caçar gazelas, fossem caçados por elas. É bonitinho, mas não é a mesma coisa, porque os leões vão continuar sempre caçando gazelas. Nós somos as gazelas. E eu adoro leões, mas gostaria que as gazelas fossem vistas como mais que papinha de felino.