ATRÁS DO TRIO ELÉTRICO SÓ NÃO VAI QUEM É FEIA
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ATRÁS DO TRIO ELÉTRICO SÓ NÃO VAI QUEM É FEIA


A alegria contagiante das musas do Harém.

Uma leitora pediu para que eu comentasse uma notícia saída na Folha sobre um bloco carnavalesco em Salvador que dá o abadá (camisetas-ingressos) de graça para mulheres bonitas, mas mulheres feias, e homens de qualquer grau de boniteza, devem pagar R$ 450 cada um. No passado, as convidadas recebiam uma pulseirinha pra participar de graça do bloco. Porém, de acordo com o empresário dono do bloco, “mulher é esperta, cortava e dava de presente pra amiga feia”. Portanto, agora elas ganham uma tatuagem provisória (O Globo diz que os abadás são grátis para todas as mulheres).
Nem sei direito o que comentar. Acho triste que uma festa popular, como carnaval de rua, custe tão caro e seja para apenas uns poucos. Parece que, nesses blocos, “seguranças esticam cordas para que o grupo fique protegido dos sem-abadá”. Soa como algo meio apartheid mesmo. De um lado, o povão, que em Salvador é 80% negro. No meio, os seguranças, que devem ser negros também. E, no lado certo, o lado in, o lado A, um bando de turistas brancos que podem pagar uma pequena fortuna por noite. Bem o retrato do nosso capitalismo.
A ideia de usar muita mulher, de preferência bonita, pra atrair homens com dinheiro não é nenhuma novidade. É o que rege as promoções do tipo “mulher que entrar numa boate/bar até sei lá que hora não paga”. Na porta de boates mais badaladas, é comum os seguranças ou a hostess proibir a entrada de homens mal-vestidos e mulheres feias e/ou velhas. Ano passado, na Inglaterra, uma boate resolveu barrar as gordas. Foi boicotada e teve que voltar atrás, embora muitos carinhas tenham aprovado a iniciativa. Se praia não fosse pública, mulheres fora do padrão seriam impedidas de entrar. Pra elas, ainda vale a pressão popular do “Ugh! Você não tem corpo pra usar biquíni!”.
O que não entendo muito bem é como mulheres, lindas ou horrendas (e digamos que essa avaliação pode variar bastante), queiram participar de um bloco chamado Harém. É tão divertido assim o conceito de um sultão usufruindo de várias escravas sexuais? Pro sultão, talvez, ok, mas pras escravas? Vá lá, de repente até compreendo que moças bonitas se sintam lisonjeadas por serem descobertas por “olheiros” e convidadas para dançar num bloco de elite. Mas por que seria necessária a taguagem, pulseirinha, o diabo a quatro? Se elas são lindas, a aparência não serve como o próprio abadá delas? O quê? Você tá me dizendo que os seguranças não sabem distinguir uma mulher feia de uma bonita? Ué, pensei que o padrão de beleza fosse tão único e objetivo que bastasse olhar pra gente.
Eu certamente seria barrada. Já passei da idade e do peso de ser considerada bonita. Agora, vamos supor que eu tivesse algum interesse em torrar ao sol ouvindo axé e sendo esmagada por uma multidão bêbada. Eu iria me sujeitar a ser avaliada e xingada de feia assim, na cara dura? Certo, creio que o critério de seleção não é tão machista como o texto faz crer. Duvido que seja como porta de boate - você entra, você não. Acho que as mocinhas bonitas já estão escolhidas faz um tempo, e só elas não pagam. No entanto, depois do vazamento da notícia, qualquer mulher lá sem a tatuagem identificadora vai estar no grupo das feias. Continuo achando estranho. Lembra um pouco os rebanhos marcados a brasa e as tatuagens nazistas pra identificar judeus, ciganos e gays. Mas não dá pra ver na cara de uma pessoa se ele é gay. Precisa de um triângulo rosa pra identificar. Com mulher bonita não deveria ser diferente? E, se pras moças lindas é tão incrivelmente fantástico fazer parte do Harém, por que elas davam as pulseirinhas pras amigas feias? Além disso, li num blog que a maior parte das beldades selecionadas é branca. Pra que pulserinha ou tatuagem, se é só checar a cor da pele?
Não sou a pessoa adequada pra falar de carnaval. Acho que nunca fui a um baile nem nada. É que como não bebo, não sambo, não gosto de barulho nem multidões, não vejo qual é a graça. Mas tenho amigas que desfilaram em escola de samba e vestiram abadá na Bahia e adoraram. Não quero condenar ninguém, cada um faça o que quer (mas use camisinha e se beber não dirija). Não faço parte do pessoal que considera carnaval a maior depravação, uma Gomorra a ser punida. Aliás, se a folia serve pra atenuar a vigilância sobre as mulheres (se nesses quatro dias de festa as moças que queiram namorar deixam de ser chamadas de vadias), sou até a favor. O que não gosto é desse apartheid de bloco. Ou dessa celebração de “homens abonados” e “mulheres lindas”. Porque isso me lembra que continuamos vivendo num mundo em que há muito mais homens ricos que mulheres ricas, e onde as ainda mulheres são julgadas, acima de tudo, pela aparência.
Lógico que esse sexismo que nos incentiva a dividir mulheres entre gostosas e mocréias não é exclusivo do carnaval. Acontece o ano todo, em todas as partes do mundo. A gente nem se lembra mais da chinesinha feia que foi escondida nas Olimpíadas, né? Nossa indignação foi porque fizeram isso com uma criança. Mas querer longe da nossa vista adultas feias tá liberado. Então, por que não traumatizar garotinhas? É bom mesmo que elas aprendam cedo o que lhes aguarda.




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