BC conta com um impulso fiscal neutro - CLAUDIA SAFATLE
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BC conta com um impulso fiscal neutro - CLAUDIA SAFATLE


VALOR ECONÔMICO - 06/09


A ata do Comitê de Política Monetária (Copom), apesar de poucas mudanças em relação ao texto anterior, traz informações importantes pelo que está escrito, pelo que não está escrito e pelas surpresas inflacionárias dos últimos meses, cujo IPCA tem vindo menor do que as expectativas do mercado.

O que mais intrigou os mercados foi a indicação sobre uma possível neutralidade da política fiscal.

"Para o Comitê, criam-se condições para que, no horizonte relevante para a política monetária, o balanço do setor público em posição expansionista se desloque para a zona de neutralidade", diz a ata divulgada ontem.

Uma leitura possível desse parágrafo é que o superávit primário já caiu o que o governo acha que podia cair. Portanto, a tendência é de que em 2014 ele seja praticamente igual ao de 2013, Sem variação, o efeito da política fiscal sobre a demanda e, consequentemente, sobre a taxa de inflação, deixaria de ser expansionista e passaria a ser neutro no horizonte relevante, que é 2014.

Outro razão seria a revisão, para baixo, da trajetória do PIB. O Banco Central usa, nas suas projeções, o superávit estrutural (descontado de receitas e despesas não recorrentes e vinculadas ao ciclo econômico). Se caem as projeções para o produto, mesmo que o superávit seja um pouco menor o resultado estrutural das contas públicas pode se manter constante sem, necessariamente, significar uma política expansionista.

É sabido que o mercado não acredita no cumprimento da meta de primário de 2,3% do PIB este ano nem em 2,1% do PIB no ano que vem. Os prognósticos estão mais para algo entre 1,8% a 1,9% do PIB para ambos os períodos. O Ministério da Fazenda, porém, tem se esforçado para arrancar novas receitas. O novo triplo Refis (refinanciamento de dívidas tributárias) pode render entre R$ 15 bilhões e R$ 20 bilhões, além dos cerca de R$ 15 bilhões do campo de Libra. São receitas que ajudariam a compor a política fiscal deste e do próximo ano.

De qualquer forma, para efeito do impulso fiscal isso não é relevante e sim a variação do superávit. Se a expectativa no governo é que ele fique estável entre este e o próximo ano, o impulso tende a convergir para a neutralidade.

Tomando como base os dados do segundo semestre de 2012 para cá, até julho, o superávit primário caiu praticamente à metade, de quase 3% do PIB para cerca de 1,5% do PIB (saldo estrutural). Estável nesse patamar, não haverá impulso fiscal (dado pelo superávit ajustado ao hiato do produto) sobre o crescimento da economia.

Outro aspecto curioso refere-se ao repasse da depreciação da taxa de câmbio sobre os preços. A taxa usada para o cenário de referência era de R$ 2,25 na ata de julho e agora é R$ 2,40. Mesmo diante dessa desvalorização, a projeção para a inflação de 2013 manteve-se estável e acima da meta em relação ao valor considerado na reunião do Copom de julho. O mesmo ocorreu no cenário de mercado. Para 2014, a estabilidade também se repete e o comitê avançou suas projeções até o segundo trimestre de 2015, quando "a inflação se posiciona acima da meta nos dois cenários".

Não está dito na ata, mas a forte desaceleração da atividade econômica esperada para o terceiro trimestre e a eventual modesta recuperação aguardada para o quarto trimestre do ano não avalizaria um repasse forte da depreciação do real para o IPCA.

A desaceleração está se confirmando. Os dados divulgados ontem pela Anfavea são de que a produção cresceu 2,3% em agosto, mas as vendas caíram 21,6% sobre igual mês do ano passado. Os estoques da indústria automobilística aumentaram para 36 dias, acima dos 30 dias considerados razoáveis.

O aumento dos estoques não passa despercebido pelo Copom que mencionava, na ata de julho, que os estoques estavam ajustados e, agora, retirou essa expressão.

Os economistas do setor privado, depois de se surpreenderem com o bom desempenho da economia no segundo trimestre, estão revendo suas projeções para o terceiro e é difícil encontrar algum que ainda trabalhe com uma performance de expansão do PIB para esse período. Os prognósticos convergem para uma ligeira retração. O Copom não fala do tamanho da desaceleração da atividade.

Corrobora a visão de um cenário aparentemente "dovish" do Banco Central o fato de a inflação efetiva estar, desde junho, bem abaixo das expectativas do mercado. O IPCA teve variação de 0,26% em junho, enquanto o Focus indicava 0,33%. Em julho, para uma taxa esperada de 0,24% o IBGE apurou 0,03% e para agosto, o mesmo deve se repetir (o IPCA será divulgado hoje). As primeiras coletas de preços do IBGE de setembro também estão surpreendendo. Nos quatro dias úteis até ontem, a inflação apontava para a casa dos 0,12%.

A despeito dos senões - condições financeiras mais severas, baixa confiança de consumidores e empresas, elevação dos estoques e surpresa positiva da inflação nos últimos meses - a ata indica que o BC está de olho na inflação de 12 meses. "A elevada variação dos índices de preços ao consumidor nos últimos 12 meses contribui para que a inflação mostre resistência." E assegura que o ciclo de aperto monetário vai continuar, com ampla chance de ser um ciclo curto.




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